Demonstração da inobservância dos padrões de produtos e serviços como fundamento para impedimento de utilização da marca licenciada

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Demonstração da inobservância dos padrões de produtos e serviços como fundamento para impedimento de utilização da marca licenciada

O Superior Tribunal de Justiça considera que a não observância dos padrões dos produtos e serviços da marca licenciada demonstra o seu uso indevido e autoriza a tutela inibitória para impedir a utilização. Jurisprudência em Teses – Edição nº 24.

Este posicionamento consta dos seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. LICENÇA DE USO. PROTEÇÃO LEGAL. ALTERAÇÃO CONCEITUAL DA MARCA. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DO LICENCIADO AOS NOVOS PADRÕES.

  1. Não há julgamento extra petita quando a decisão judicial permanece adstrita ao pedido e causa de pedir manifestados pelo autor na inicial.
  2. O Tribunal a quo não é obrigado a enfrentar questão que lhe foi submetida apenas nos embargos de declaração, situação em que a parte não objetiva corrigir imperfeições do julgado, mas levar questão nova ao exame tardio do Tribunal.
  3. A marca é mais que mera denominação: traz em si o conceito do produto ou serviço que a carrega; possui feição concorrencial, distinguindo-a dos concorrentes; facilita o reconhecimento e a captação de clientes; diminui o risco para a clientela, que conta com a padronização dos produtos, serviços, atendimento e demais atributos que a cercam.
  4. A licença de uso gera o compromisso, ex lege, de o licenciador zelar pela integridade e reputação da marca. É da essência da própria marca que o uso por terceiros deve respeitar-lhe as características, pois a inobservância dos traços distintivos desvirtua a sua existência.
  5. A não observância dos padrões dos produtos e serviços pela licenciada para o uso da marca demonstra o uso indevido e autoriza a tutela inibitória para impedir a utilização.
  6. Recurso especial conhecido em parte e desprovido.

(REsp 1387244/DF, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 10/03/2014)

Considerações gerais

A propriedade industrial, regulada basicamente pela lei nº 9.279/1996, é um dos ramos da propriedade intelectual.

A propriedade intelectual é composta pelos estudos dos direitos autorais e da propriedade industrial.

O Direito Autoral compreende, basicamente: as obras literárias, artísticas e científicas (Lei 9.610/98) e os programas de computador ou software (Lei 9.609/98).

A propriedade industrial compreende, basicamente: as patentes (de invenção e modelo de utilidade) e os registros (de marca e de desenho industrial).

Registro de marcas

O registro de marcas está disciplinado nos artigos 122 e seguintes da lei n. 9279/96 (LPI).

Espécies de marcas

a) Marca de produto ou serviço

É a marca usada para distinguir produto ou serviço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa (art. 123, I, da LPI)

b) Marca de certificação

É a marca usada para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações técnicas, notadamente quanto à qualidade, natureza, material utilizado e metodologia empregada (art. 123, II, da LPI)

c) Marca coletiva

É a marca usada para identificar produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade (art. 123, III, da LPI).

d) Marca de alto renome

Marca de alto renome é a marca registrada no Brasil com proteção especial, em todos os ramos de atividade (art. 125 da LPI)

Representa uma exceção ao princípio da especialidade.

e) Marca notoriamente conhecida

A marca notoriamente conhecida é a aquela que goza de proteção especial, independentemente de estar previamente depositada ou registrada no Brasil (art. 126 da LPI).

Representa uma exceção ao princípio da territorialidade.

Signos não registráveis como marca

O art. 124 da LPI aponta inúmeras hipóteses de signos não registráveis como marca.

Entre outros, não são registráveis como marca:

a) brasão, armas, medalha, bandeira, emblema, distintivo e monumento oficiais, públicos, nacionais, estrangeiros ou internacionais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação;

b) letra, algarismo e data, isoladamente, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva;

c) expressão, figura, desenho ou qualquer outro sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou idéia e sentimento dignos de respeito e veneração;

d) designação ou sigla de entidade ou órgão público, quando não requerido o registro pela própria entidade ou órgão público;

e) reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos.

Prazo de vigência do registro de marca

O registro da marca vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos, contados da data da concessão do registro, prorrogável por períodos iguais e sucessivos.

O pedido de prorrogação deverá ser formulado durante o último ano de vigência do registro, instruído com o comprovante do pagamento da respectiva retribuição.

Caso o pedido de prorrogação não tenha sido efetuado até o termo final da vigência do registro, o titular poderá fazê-lo nos 6 (seis) meses subsequentes, mediante o pagamento de retribuição adicional.

Perda dos direitos

Nos termos do art. 142 da LPI, o registro de marca extingue-se:

a) pela expiração do prazo de vigência;

b) pela renúncia, que poderá ser total ou parcial em relação aos produtos ou serviços assinalados pela marca;

c) pela caducidade.

Também haverá extinção se não houver observância do art. 217 da LPI.

O mencionado artigo prevê que a pessoa domiciliada no exterior deverá constituir e manter procurador devidamente qualificado e domiciliado no País, com poderes para representá-la administrativa e judicialmente, inclusive para receber citações.

No que se refere à caducidade, o art. 143 da LPI, indica que caducará o registro, a requerimento de qualquer pessoa com legítimo interesse se, decorridos 5 (cinco) anos da sua concessão, na data do requerimento, o uso da marca não tiver sido iniciado no Brasil.

No mesmo sentido, haverá caducidade se o uso da marca tiver sido interrompido por mais de 5 (cinco) anos consecutivos, ou se, no mesmo prazo, a marca tiver sido usada com modificação que implique alteração de seu caráter distintivo original, tal como constante do certificado de registro.

Ação de nulidade

O registro de marca será considerado nulo se for concedido em desacordo com parâmetros indicados na LPI.

Nos termos do art. 173 da LPI, a ação de nulidade poderá ser proposta pelo INPI ou por qualquer pessoa com legítimo interesse.

Conforme indicado no art. 174 da LPI, prescreve em 5 (cinco) anos a ação para declarar a nulidade do registro, contados da data da sua concessão.

Sobre este tema, merecem destaque os seguintes enunciados das jornadas de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal:

Enunciado número 1. Decisão judicial que considera ser o nome empresarial violador do direito de marca não implica a anulação do respectivo registro no órgão próprio nem lhe retira os efeitos, preservado o direito de o empresário alterá-lo.

Enunciado número 2. A vedação de registro de marca que reproduza ou imite elemento característico ou diferenciador de nome empresarial de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação (art. 124, V, da Lei n. 9.279/1996), deve ser interpretada restritivamente e em consonância com o art. 1.166 do Código Civil.

Enunciado número 60. Os acordos e negócios de abstenção de uso de marcas entre sociedades empresárias não são oponíveis em face do Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, sem prejuízo de os litigantes obterem tutela jurisdicional de abstenção entre eles na Justiça Estadual.

Enunciado número 107 – O fato gerador do parágrafo único do art. 40 da Lei n. 9.279/96 não engloba a hipótese de mora administrativa havida em concausa ou perpetrada pelo depositante do pedido de patente, desde que demonstrada conduta abusiva deste.

Enunciado número 108 – Não cabe a condenação do INPI em sucumbência, nos termos do art. 85 do CPC, quando a matéria não for de seu conhecimento prévio e não houver resistência judicial posterior.

Enunciado número 109 – Os pedidos de abstenção de uso e indenização, quando cumulados com ação visando anular um direito de propriedade industrial, são da competência da Justiça Federal, em face do art. 55 do CPC.

Enunciado número 110 – Aplicam-se aos negócios jurídicos de propriedade intelectual o disposto sobre a função social dos contratos, probidade e boa-fé.

Enunciado número 111 – Nas ações de nulidade de indeferimento de pedido de registro de marca, o titular do registro marcário apontado como anterioridade impeditiva é litisconsorte passivo necessário, à luz do que dispõe o art. 115 do CPC.

Enunciado número 112 – O termo inicial do prazo de 30 dias previsto no parágrafo único do art. 162 da Lei n. 9.279/96 é o primeiro dia útil subsequente ao término in albis do prazo de 60 dias previsto no caput do mesmo artigo.

Enunciado número 113 – Em ações que visam anular um direito de propriedade industrial, a citação do INPI para se manifestar sobre os pedidos deve ocorrer apenas após a contestação do titular do direito de propriedade industrial.

Enunciado número 114 – A proteção jurídica ao conjunto-imagem de um produto ou serviço não se estende à funcionalidade técnica.

Enunciado número 115 – As limitações de direitos autorais estabelecidas nos arts. 46, 47 e 48 da Lei de Direitos Autorais devem ser interpretadas extensivamente, em conformidade com os direitos fundamentais e a função social da propriedade estabelecida no art. 5º, XXIII, da CF/88.

Para aprofundamento do estudo, confira os seguintes volumes:

CAMPINHO, Sérgio. O direto de empresa à luz do novo código Civil. Renovar. São Paulo, 2003.

MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro, Direito Societário: Sociedades Simples e Empresárias, v. 2. Atlas, São Paulo, 2004.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de direito empresarial: o novo regime jurídico empresarial brasileiro. 3ª Edição. Salvador: jus Podivm, 2009.

ASCARELLI, Túlio. Iniciação ao Estudo do Direito Mercantil. Sorocaba: Minelli, 2007.

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, v. 1, 27ª Ed. Saraiva, São Paulo, 2008.

37VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – volume II. 16ª ed.  São Paulo: Saraiva, 2012.

FORGIONI, Paula A. A evolução do Direito Comercial Brasileiro: Da mercancia ao mercado. São Paulo: RT: 2009.

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 4ª ed. São Paulo: Forense, 1973.

MENDONÇA, J.X. Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro v. III. São Paulo: Freitas Bastos s/a, 7ª Edição, 1963.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial. Tomo XLIX: Contrato de sociedade. Sociedade de pessoas. São Paulo: RT, 2012.

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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