Proibição de atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos sob a administração do Poder Judiciário: Resolução CNJ nº 140 /2011

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A Resolução nº 140/2011 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu a atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos sob a administração do Poder Judiciário.[1]

Não obstante o tempo decorrido desde a publicação da Resolução CNJ n° 140/2011, as questões abordadas continuam sendo relevantes.

A iniciativa foi tomada no âmbito do exercício da competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça, a quem compete o controle da atuação administrativa do Poder Judiciário.

No âmbito constitucional a vedação da atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos se apoia no art. 37 da Constituição Federal, tanto no disposto no caput, que exalta os princípios da moralidade e da impessoalidade, quanto no §1º, que censura a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […]§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”

É importante destacar, ademais, que a moralidade administrativa é tutelada no art. 5º, inciso LXXIII da Constituição Federal, ao permitir a propositura de ação para anular ato que importe lesão ao preceito.

“Art. 5º: […] LXXIII – qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.”

No plano infraconstitucional, entre outras normas, a proibição se apoia nas disposições da Lei nº 6.454/1977.

A Lei nº 6.454/1977, que trata da denominação de logradouros, obras serviços e monumentos públicos, alterada pela Lei nº 12.781/2013, proíbe expressamente a atribuição de nome de pessoa viva a bem público. Nesse sentido, é válido conferir os seguintes artigos:

“Art.1o É proibido, em todo o território nacional, atribuir nome de pessoa viva ou que tenha se notabilizado pela defesa ou exploração de mão de obra escrava, em qualquer modalidade, a bem público, de qualquer natureza, pertencente à União ou às pessoas jurídicas da administração indireta.”               

“Art. 2º É igualmente vedada a inscrição dos nomes de autoridades ou administradores em placas indicadores de obras ou em veículo de propriedade ou a serviço da Administração Pública direta ou indireta.”

“Art. 3º As proibições constantes desta Lei são aplicáveis às entidades que, a qualquer título, recebam subvenção ou auxílio dos cofres públicos federais.”

“Art. 4º A infração ao disposto nesta Lei acarretará aos responsáveis a perda do cargo ou função pública que exercerem, e, no caso do artigo 3º, a suspensão da subvenção ou auxílio.”

Ao proibir a atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos sob a administração do Poder Judiciário o Conselho Nacional de Justiça não só evita a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos como também reafirma a necessidade de respeito aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

A medida é um exemplo a ser seguido por todos os agentes que, direta ou indiretamente, se relacionam com os interesses púbicos, notadamente por realçar a importância dos comportamento éticos e a promoção da cultura da moralidade.

Com efeito, a promoção da cultura da honestidade e da moralidade deve ser desenvolvida não somente entre os servidores, mas, principalmente, no contexto das relações que envolvem particulares e agentes públicos.

A propósito, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que o princípio da moralidade administrativa, valor constitucional revestido de caráter ético-jurídico, deve condicionar a legitimidade e a validade de todos os atos estatais.

A atividade estatal, de acordo com o Supremo Tribunal Federal, qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético-jurídicos que se refletem na consagração constitucional do princípio da moralidade administrativa. Esse postulado fundamental, segundo o entendimento da Corte, é diretriz para a atuação do poder público e expressão de uma pauta de valores éticos sobre os quais se funda a ordem positiva do Estado.[3]

O respeito à moralidade no âmbito da administração pública foi reafirmado em diversas outras decisões do Supremo Tribunal Federal. Citemos apenas dois exemplos: i) Foi decidido que a prática do nepotismo deveria ser considerada imoral e ilícita em todos setores da Administração Pública, inclusive no âmbito do Poder Judiciário. Nessa ocasião, asseverou-se que a censura ao nepotismo não exigiria sequer a edição de lei formal pois decorreria diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal[4]; ii) Para garantir o respeito ao princípio da publicidade e assegurar a transparência, o Supremo Tribunal Federal também reconheceu ser legítima a publicação a determinação de publicação, em sítio eletrônico mantido pela Administração Pública, dos nomes de servidores e dos correspondentes valores de vencimentos e vantagens pecuniárias.[5]

São essas as observações gerais acerca da Resolução Nº 140/2011 do Conselho Nacional de Justiça.

Por fim, convém dizer que a proibição da atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos submetidos à administração do Poder Judiciário é apenas um dos diversos exemplos das contribuições do Conselho Nacional de Justiça para a efetivação dos princípios constitucionais, manutenção da integridade institucional do Poder Judiciário e aprimoramento de todo o sistema de justiça.

[1] Este é o trigésimo nono texto de uma série de outros que tratam das orientações normativas do Conselho Nacional de Justiça.

[2] ADI 2.661 MC, rel. min. Celso de Mello, j. 5-6-2002, P, DJ de 23-8-2002.

[3] RE 579.951, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 20-8-2008, P, DJE de 24-10-2008, Tema 66; ADI 3.745, rel. min. Dias Toffoli, j. 15-5-2013, P, DJE de 1º-8-2013.

[4] ARE 652.777, rel. min. Teori Zavascki, j. 23-4-2015, P, DJE de 1º-7-2015, Tema 483.

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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