Uma maior proteção jurídica para os Brasileiros no Exterior

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Passaporte brasileiro
Passaporte Brasileiro - Créditos: rodrigobellizzi / iStock

Com aproximadamente 3 milhões de Brasileiros no Exterior, vivendo documentados ou indocumentados no exterior, é urgente que o Brasil ratifique a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias de 18/12/1990.

Desde 2010, o Brasil aguarda uma posição do Parlamento para a ratificação como Emenda Constitucional de uma das mais importantes convenções internacionais multilaterais de direitos humanos nas Nações Unidas.

A referida convenção sobre a proteção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias ao invés de ser assinada e encaminhada para Ratificação em 2010 sofreu um processo inverso e diferente do que se faz com os tratados internacionais que o Brasil é parte.

A análise do caso sofre atraso e encontra-se parada no parlamente a mais de 11 anos. O atraso é causado principalmente pelo título da convenção e pelo entendimento que a convenção é voltada para os migrantes no Brasil.

Esta visão por parte do Parlamento e de parte da sociedade se mostra incompleta e até preconceituosa contra os migrantes que se encontram no Brasil. Atualmente no Brasil se estima que existam entre 500 mil a 800 mil migrantes documentados e indocumentados.

Importante lembrarmos que não se usa mais o termo “ilegal” para definir um migrante que tenha ingressado no Brasil de forma irregular ou sem toda a documentação necessária.

Em números proporcionais o Brasil hoje envia mais seus nacionais para o exterior do que recebe migrantes em seu território. Mas nossa política migratória atua como se o Brasil fosse um Estado que recebe milhões de migrantes anualmente como os Estados Unidos ou a Europa.

Isso implica em não dar andamento a um instrumento que aumenta a cooperação internacional entre países para evitar migrações feita por grupos criminosos para ingresso irregular de brasileiros ou mesmo situações como tráfico internacional de brasileiros para o exterior.

Com a obtenção de telegramas trocados pelas repartições consulares Brasileiras nos Estados Unidos e México podemos confirmar como a situação é grave para Brasileiros que tentam a sorte ingressando de maneira irregular nos EUA.

Antes da pandemia de Covid19 o Brasil ocupava a triste posição de 8º país que mais tinham nacionais deportados pelos EUA (1770 pessoas), e entre documentados e indocumentados, apenas nos EUA, o Departamento de comunidades brasileiras no exterior estima o número de 1.410.000 brasileiros.

No telegrama 00846 da Embaixada do Brasil no México, de lavra do Embaixador Mauricio Carvalho Lyrio datado de 27/10/2020 para o Ministério das Relações Exteriores ele relata que em 2019 houve um expressivo número de Brasileiros ingressando naquele país, 355.000, muitos para turismo, mas muitos para tentar o ingresso irregular pela fronteira de terra com os EUA, inclusive com o relato do aumento de sequestros de brasileiros por falsos coiotes e a atuação do adido da Polícia Federal junto as autoridades mexicanas para auxiliar nestes casos.

Em 2019, entraram nos Estados Unidos 851.508[1] pessoas de forma irregular, em 2020 até a decretação pela Organização Mundial da Saúde de crise mundial pandêmica em 11/03/2020, o que refletiu no crescente número de migrantes tentando entrar nos EUA, entre eles, muitos Brasileiros.

O aumento no começo de 2020 foi o reflexo da decisão da Corte de Apelação do 9º Circuito Federal que em 28/02/2020 julgou ilegal a política migratória do governo, o chamado protocolo de proteção ao migrante (sigla em inglês MPP), que criava o procedimento de retorno imediato dos migrantes sem determinação judicial e violando o princípio da não devolução (non-refoulment) e já em março de 2020 os casos de incidentes migratórios chegaram a 30.002, mas com os protocolos sanitários pós covid19 em abril o número caiu para 15.862 e seguiu caindo conforme o aumento dos casos de pessoas com Covid19 foram crescendo em todo o mundo.

Como se percebe pelos números de pessoas, entre 2018 e 2020, mesmo num ambiente de pandemia global, os Brasileiros seguiram migrando para outros países, com documentos ou de forma irregular. Considerando que dos 3 milhões de brasileiros nos Estados Unidos, 50% se encontram na Europa e Ásia.

Atualmente o Brasil não possui acordos bilaterais ou multilaterais que garantam uma cooperação internacional no que diz respeito a uma governança migratória. Não sabemos exatamente onde estão os Brasileiros e muitos países não sabem se nossos Brasileiros estão lá e em qual condição.

Isso deixa os brasileiros mais expostos a exploração como força de trabalho irregular indocumentada em diversos países onde ingressam para arriscarem uma nova vida. Alguns desses brasileiros e brasileiras se tornam vítimas de tráfico de pessoas ou acabam transportando drogas em todo o mundo.

Mesmo com o aumento da cooperação para reprimir a prática criminosa, sem uma atuação coordenada com os principais países para onde estas situações acontecem, a prevenção se torna cada vez mais incipiente.

Apenas o apoio consular aos brasileiros no exterior não tem se mostrado eficiente para estas situações, a falta de conhecimento por parte dos nacionais brasileiros de que independente da condição migratória, a representação consular é um porto seguro para qualquer deles buscar um apoio, aconselhamento ou para pedir ajuda.

Em qualquer uma dessas situações, se o Brasil já tivesse ratificado a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias, o Estado Brasileiro poderia participar da rede internacional de cooperação em matéria de migrações, trocando informações, diminuindo a migração irregular, e garantindo uma maior proteção internacional a seus nacionais.

Enquanto não tivermos em mente que a referida convenção protege essencialmente os Brasileiros, e, as pessoas que atacam o texto com a falsa premissa que o tratado internacional serviria para a proteção apenas de migrantes aqui no Brasil, e estrangeiros estariam aqui para tirar empregos, usar serviços públicos indevidamente e toda a cartilha de xenofobia já conhecida pela maioria de nós, tão importante ratificação não será aprovada tão cedo.

Quanto maior o conhecimento dos brasileiros de seus direitos e deveres quando saem do Brasil para tentar a vida noutro país, menores serão os problemas enfrentados, e como ressaltei, a existência de uma rede de cooperação entre países que normalmente enviam migrantes e países que recebem estas pessoas, os grupos criminosos que atuam nesta área seriam diretamente afetados e reprimidos.

E internamente, o Brasil ao receber migrantes com o apoio da cooperação de países participantes, teria muito mais eficiência para identificar situações de abuso, exploração e crime. Não obstante, permitiria ainda trabalhar a vinda organizada de migrantes para suprir certas demandas que nosso país possui.

O Canadá desde a década de 70 atua em conjunto Governo, iniciativa privada e sindicatos, e anualmente permitem vagas voltadas a migrantes para suprir a necessidade do país, sendo hoje um dos países que mais se desenvolve utilizando a migração como ferramenta de empreendedorismo e crescimento regional e nacional.

O Brasil utilizou estas ferramentas no Reinado de Pedro II e ela seguiu sendo utilizada fortemente até o começo da era Vargas. Isso levou o desenvolvimento da agricultura, comércio e crescimento nacional e permitiu que o Brasil se tornasse naquela época um dos países mais promissores das Américas.

A criação de uma política nacional de governança migratória bem utilizada permitirá ao Brasil crescer internamente e ainda proteger seus nacionais no exterior.

Nota de fim

[1] Relatório da autoridade migratória estadunidense relatando o número de incidentes com migrantes e número de deportações. https://www.ice.gov/sites/default/files/documents/Docu ment/2019/eroReportFY2019.pdf (acesso em 01/02/2021 12:20).

Luiz Philipe Ferreira de Oliveira
Luiz Philipe Ferreira de Oliveira
Advogado, Professor Universitário, Mestre e Doutor pela FADUSP.

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