Direitos de personalidade do grupo ou da coletividade como realidade massificada

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De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça o dano moral extrapatrimonial atinge direitos de personalidade do grupo ou da coletividade como realidade massificada, não sendo necessária a demonstração de da dor, da repulsa, da indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado.  Jurisprudência em Teses – Edição nº 138

Essa orientação consta do seguinte julgado:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ABSTENÇÃO DE TRAFEGO COM EXCESSO DE PESO EM RODOVIAS FEDERAIS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL COLETIVO. ATENDIDOS OS PEDIDOS DA INICIAL. NÃO CONHECIMENTO DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL QUE NÃO ATACA OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. CONHECIMENTO DO RECURSO. CABIMENTO DAS RESPECTIVAS INDENIZAÇÕES. PRECEDENTES. I – Na origem, trata-se de ação civil pública em que o Ministério Público Federal, em ação civil pública pretende que a empresa ora agravada se abstenha de trafegar com veículos com excesso de peso em qualquer rodovia federal, bem como a condenação ao pagamento de indenização por dano material e dano moral coletivo. […] XI – A modalidade de dano tratada na presente demanda é tipicamente “difusa”, o que não quer dizer que inexistam prejuízos individuais e coletivos capazes de cobrança judicial pelos meios próprios. Como se sabe, a Lei n. 7.347/85 traz lista “meramente enumerativa” de categorias de danos, exemplificada com a técnica de citação de “domínios materiais do universo difuso e coletivo” (meio ambiente; consumidor; patrimônio histórico-cultural; ordem econômica; honra e dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos; patrimônio público e social). […] XVII – Confirma-se a existência do “dano moral coletivo” em razão de ofensa a direitos coletivos ou difusos de caráter extrapatrimonial – consumidor, ambiental, ordem urbanística, entre outros -, podendo-se afirmar que o caso em comento é de dano moral in re ipsa, ou seja, deriva do fato por si só. XVIII – O dano moral coletivo, compreendido como o resultado de lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade, dá-se quando a conduta agride, de modo ilegal ou intolerável, os valores normativos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva (arts. 1º da Lei n. 7.347/1985, 6º, VI, do CDC e 944 do CC, bem como o Enunciado n. 456 da V Jornada de Direito Civil). XIX – Entenda-se o dano moral coletivo como o de natureza transindividual que atinge classe específica ou não de pessoas. É passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem, a sentimento e à moral coletiva dos indivíduos como síntese das individualidades envolvidas, a partir de uma mesma relação jurídica-base. “O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos” (REsp n. 1.410.698/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 30/6/2015). XX – O dano moral extrapatrimonial atinge direitos de personalidade do grupo ou coletividade como realidade massificada, que a cada dia reclama mais soluções jurídicas para sua proteção. Isso não importa exigir da coletividade “dor, repulsa, indignação tal qual fosse um indivíduo isolado, pois a avaliação que se faz é simplesmente objetiva, e não personalizada, tal qual no manuseio judicial da boa-fé objetiva. Na noção inclui-se tanto o dano moral coletivo indivisível (por ofensa a interesses difusos e coletivos de uma comunidade) como o divisível (por afronta a interesses individuais homogêneos)” (REsp n. 1.574.350/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 3/10/2017, DJe 6/3/2019). Nesse sentido também o precedente desta Segunda Turma: REsp n. 1.057.274, Segunda Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, Dje 26/2/2010. XXI – Dessa forma, volvendo ao caso concreto, caracterizado o agir ilícito (tráfego de veículos com excesso de peso) e a vinculação normal, lógica e razoável entre o tipo de comportamento e o dano imputado, deve a empresa responder pelos prejuízos causados, os quais “derivam do próprio fato ofensivo”. Segundo as regras da experiência comum, é desnecessária a comprovação pericial pela vítima. XXII – É “fato notório” (art. 374, I, do CPC) que o tráfego de veículos com excesso de peso provoca sérios “danos materiais” às vias públicas, ocasionando definhamento da durabilidade e da vida útil da camada que reveste e dá estrutura ao pavimento e ao acostamento, o que resulta em buracos, fissuras, lombadas e depressões, imperfeições no escoamento da água, tudo a ampliar custos de manutenção e de recuperação, consumindo preciosos e escassos recursos públicos. Ademais, acelera a depreciação dos veículos que utilizam a malha viária, impactando, em particular, nas condições e desempenho do sistema de frenagem da frota do embarcador/expedidor. Mais inquietante, afeta as condições gerais de segurança das vias e estradas, o que aumenta o número de acidentes, inclusive fatais. Em consequência, provoca “dano moral coletivo” consistente no agravamento dos riscos à saúde e à segurança de todos, prejuízo esse atrelado igualmente à redução dos níveis de fluidez do tráfego e de conforto dos usuários. […] (AgInt no AREsp 1517245/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 19/12/2019)

Tradicionalmente a personalidade jurídica é considerada uma aptidão genérica para que o sujeito possa ser titular de direitos e contrair obrigações na ordem jurídica.

Num primeiro sentido, de acordo com teoria clássica, a personalidade se aproxima da capacidade de direito, correspondente a um atributo jurídico que decorre da condição de ser pessoa.

Em sentido diverso, a personalidade assume condição de valor ético, originado do princípio da dignidade da pessoa humana. Nesse contexto, é possível que haja tutela jurídica dos direitos de personalidade do grupo ou da coletividade como realidade massificada, dispensando-se, inclusive, a demonstração de sentimentos comumente atribuídos a sujeitos isolados, como a dor e a indignação.[1]

No campo jurídico, a dignidade da pessoa humana aproxima-se dos direitos individuais, referentes à vida, liberdade, igualdade, segurança, propriedade e privacidade – os direitos fundamentais representam o gênero do qual decorrem os direitos individuais, coletivos, sociais, de nacionalidade, e direitos políticos.

São destinatários dos direitos e garantias fundamentais todas as pessoas humanas que estiverem no território nacional, os estrangeiros, e até mesmo um grupo ou uma coletividade.[2]

Sobre esse ponto, para DALLARI […] “Outro dado paralelo, também de especial relevância, é o fato de que a Constituição de 1988 não só proclamou e consagrou os direitos individuais e os direitos econômicos, sociais e culturais como direitos fundamentais de todos os seres humanos, sem exclusões e discriminações, mas também fixou expressamente os meios de proteção e reivindicação dos direitos fundamentais, em caso de ofensa ou da denegação de tais direitos em decorrência de omissões dos responsáveis por sua efetivação. E tanto as autoridades públicas legalmente competentes – que não só podem, mas devem agir em defesa dos direitos fundamentais dos brasileiros – mas também a cidadania, por iniciativa individual ou de grupos sociais, pode acionar os poderes públicos responsáveis, para a efetivação dos direitos fundamentais constitucionalmente proclamados e garantidos. ” [3]

Repare que o artigo 5º, da Constituição Federal prevê que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.[4]

Concordamos com Kildare Gonçalves Carvalho quando ressalta que a dignidade da pessoa humana é o fundamento de todo o sistema dos Direitos fundamentais, “[…] no sentido de que estes constituem exigências, concretizações e desdobramentos da dignidade da pessoa e que com base nesta é que aqueles devem ser interpretados[5].

No mesmo sentido, reconhecemos a relevância das advertências de Sidney Guerra[6] ao mencionar que os Direitos Humanos vivem situação contraditória nesta fase de pós-modernidade.

Para MIRANDA os principais direitos da personalidade são os seguintes: i) direito à vida; ii) direito à integridade física; iii) direito à integridade psíquica; iv) direito à liberdade; v) direito à verdade; vi) direito à igualdade formal, ou isonomia[7]; vii) direito à igualdade material, prevista na Constituição; viii) direito de ter nome (inato) e direito ao nome (nato); ix) direito à honra; x) direito autoral de personalidade.[8]

Em todo o caso, MIRANDA ensina que o direito só existe para servir ao homem, como um elemento estabilizador da economia e da política; daí a sua função de assegurar permanências. Segundo MIRANDA, O direito protege sempre o interesse dos homens e de outros entes despersonificados. Ademais, esclarece que não há proteção jurídica de poderes nem de vontades – isso se nota inclusive pelo fato de que mesmo os que perderam suas vontades possuem interesses protegidos pelo direito.

No que diz respeito ao nascituro, MIRANDA esclarece que no suporte fático da regra jurídica Nasciturus pro iam nato habetur, inexiste inversão de elementos tendo em vista que é a eficácia que se antecipa – antes do suporte fático da pessoa se completar, se atribuem efeitos ao que é suporte fático no momento, incompleto para a eficácia da personalização.[9]

Nos termos do art. 20 do Código Civil, salvo se houver autorização, necessidade da administração da justiça ou da manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a requerimento do interessado. Isso sem prejuízo da eventual indenização, caso atinjam a honra, a boa fama, a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais.[10]

O art. 21 do Código Civil também indica que a vida privada da pessoa natural é inviolável. Nesse caso, sempre que necessário, o interessado poderá requerer ao Poder Judiciário a adoção de providências para impedir ou fazer cessar violações a esse preceito.

O enunciado número 279 das Jornadas de Direito Civil do CJF prevê que: “A proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações”.

Os mencionados artigos 20 e 21 do Código Civil foram objetos da Adin 4815. O Supremo Tribunal Federal julgou procedente o pedido da Adin para dar interpretação conforme à Constituição aos artigos 20 e 21 do Código Civil, sem redução de texto, e “em consonância com os direitos fundamentais à liberdade de  pensamento  e  de  sua expressão, de criação artística, produção  científica,  declarar  inexigível  o consentimento de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, sendo por igual desnecessária autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou  de  seus  familiares,  em  caso  de  pessoas  falecidas).

Sobre a questão da liberdade de imprensa, Eros Grau assinalou que “(…) algumas vezes o Magistrado está sob forte pressão da imprensa, que patrocina linchamentos no tribunal de exceção erigido sobre a premissa de que todos são culpados até prova em contrário. A imprensa, entre nós, atua como um quarto poder, à margem de qualquer controle, de molde a influenciar de modo determinante a formação da opinião pública. Somos uma sociedade à qual deve ser esclarecido que a garantia de imunidade à censura se destina a tolher não apenas o controle da informação pelo Estado, mas em especial a distorção da informação promovida pelo proprietário do veículo de informação, pelo redator-chefe, pelo editorialista, pelo repórter; uma sociedade à qual se deve ensinar que o titular da liberdade de imprensa não é o jornal, a emissora de rádio ou televisão, mas o povo. A imparcialidade, por fim, é expressão da atitude do Juiz em face de influências provenientes das partes nos processos judiciais a ele submetidos. Significa julgar com ausência absoluta de prevenção a favor ou contra alguma das partes. Aqui nos colocamos sob a abrangência do princípio da impessoalidade, que a impõe. ” [11]

Vale lembrar, ainda, que o direito à privacidade[12], intimamente relacionado à dignidade da pessoa humana, diz respeito à vida particular das pessoas naturais.[13]

Já o direito à intimidade, decorrente do direito à privacidade, se refere ao direito de estar só, de não ser violado no seu recesso privado. O direito à intimidade é mais profundo que o direito à privacidade.[14]

O enunciado número 405 das Jornadas de Direito Civil do CJF indica que: “As informações genéticas são parte da vida privada e não podem ser utilizadas para fins diversos daqueles que motivaram seu armazenamento, registro ou uso, salvo com autorização do titular”.

A despeito da semelhança, imagem retrato e imagem atributo são conceitos distintos. A imagem retrato corresponde à reprodução dos traços característicos, da forma plástica de uma determinada pessoa, como numa fotografia. Já a imagem atributo, equivalente à honra objetiva, corresponde à impressão que as demais pessoas da sociedade têm de uma pessoa determinada.

Referências

DALLARI, Dalmo de Abreu. Estado democrático e social de direito. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

DOTTI, René Ariel. Proteção da vida privada e liberdade de informação. RT, São Paulo, 1980.

FRANÇA, Vladimir da Rocha. Princípio da motivação no direito administrativo. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 7ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

GUERRA, Sidney et al. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Mínimo Existencial. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VII, Nº 9 – Dezembro de 2006.

HIRATA, Alessandro. Direito à privacidade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

LAFER, Celso. Ensaios Sobre a Liberdade. São Paulo: Perspectiva, 1980.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Igualdade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial. Tomo VII: Direito de personalidade. Direito de família: direito matrimonial (existência e validade do casamento). São Paulo: RT, 2012.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Geral. Tomo I: Introdução. Pessoas Físicas e Jurídicas. São Paulo: RT, 2012.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

SOUZA, Motauri Ciocchetti. Ação civil pública. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

[1] De acordo com FRANÇA, “Os atos administrativos ampliativos que não atinjam direitos individuais de terceiro, direitos difusos ou direitos coletivos não necessitam de fundamentação. Mas a Administração pode perfeitamente instada a apresentar o motivo pertinente, quando há o exercício do direito ao acesso à informação de interesse público ou individual, ou o emprego do direito de petição. Outro conjunto importante de exceções reside naquelas informações mantidas pelo Estado, mas que cujo acesso deve ser restrito em virtude de segurança da sociedade ou do Estado, ou mesmo quando são pertinentes à privacidade do administrado. Aqui, o dever de motivação do ato administrativo pode sofrer as restrições que se fizerem necessárias para que essas limitações constitucionais sejam observadas, mas não a ponto de eliminá-lo por completo. ”  FRANÇA, Vladimir da Rocha. Princípio da motivação no direito administrativo. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/124/edicao-1/principio-da-motivacao-no-direito-administrativo

[2] SOUZA esclarece que “Nos termos do art. 1º da Lei 7.347/1985, a ação civil pública tem por finalidade a reparação dos danos morais e patrimoniais a interesses difusos e coletivos. Mencionado dispositivo traz a dimensão, o alcance da ação civil pública. Dois aspectos merecem comentários nesta oportunidade. De início, ao falar em danos morais e patrimoniais (que podem ser cumulados), a lei quis deixar patente que a reparação de lesões causadas a interesses difusos e coletivos deve ser a mais ampla e abrangente possível. Interessante, em mencionado aspecto, que a Lei da Ação Civil Pública – na esteira do que ocorre com o art. 6º, VI, do CDC – tratou de danos morais a interesses difusos e coletivos – ou, em outras palavras, danos morais sociais. O sentido egoístico e individualista anteriormente conferido ao dano moral, portanto, já não se justifica. Como exemplo típico de danos morais à sociedade podemos citar a demolição do Museu do Ipiranga. ” SOUZA, Motauri Ciocchetti. Ação civil pública. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/9/edicao-1/acao-civil-publica

[3] DALLARI, Dalmo de Abreu. Estado democrático e social de direito. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/70/edicao-1/estado-democratico-e-social-de-direito

[4] Há, contudo, exceções expressamente previstas na CF, por exemplo, no caso da ação popular, que só pode ser proposta por cidadão

[5] CARVALHO, Kildare Gonçalves Carvalho. Direito Constitucional. 13ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 549.

[6] O Autor faz referência às formulações garantisticas e prestacionais do mínimo existencial.  Segundo ele, apesar de se apresentar como uma vertente garantística e prestacional, a proposta de estabelecer um rol de Direitos que comporia o mínimo vital tem por objetivo evitar a total ineficácia jurídica de vários dispositivos sobre Direitos sociais. Contudo, Guerra adverte que a materialidade do princípio da dignidade da pessoa humana não pode ser confundida com o mínimo existencial, nem reduzida ao Direito de subsistir. Apesar das dificuldades, não se justificaria partir para versões minimalistas abandonando de vez uma visão mais global. Tampouco seria correto definir quais seriam os limites internos de cada Direito social, selecionado como inerente ao mínimo vital sugerido, visto que igualmente as graduações cairiam no mesmo problema da subjetividade de quem as estipulam. GUERRA, Sidney et al. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Mínimo Existencial. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VII, n. 9, 2006, dez. p. 394-395.

[7] De acordo com MELLO “Ao cabo do quanto se disse, é possível afirmar, sem receio, que o princípio da igualdade consiste em assegurar regramento uniforme às pessoas que não sejam entre si diferenciáveis por razões lógica e substancialmente (isto é, à face da Constituição), afinadas com eventual disparidade de tratamento. Não há nele, pois, garantia alguma de que pessoas diferenciadas de outras façam jus a tratamento normativo idêntico ao que a estas foi dispensado quando tal diferenciação se haja estribado em razões que não sendo incompatíveis com valores sociais residentes na Constituição — possuam fomento lógico na correlação entre o fator de discrímen e a diversidade de tratamento que lhes foi consequente. ” MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Igualdade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/4/edicao-1/igualdade

[8] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Especial. Tomo VII: Direito de personalidade. Direito de família: direito matrimonial (existência e validade do casamento). São Paulo: RT, 2012, p. 62.

[9] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Parte Geral. Tomo I: Introdução. Pessoas Físicas e Jurídicas. São Paulo: RT, 2012, p. 266/267.

[10] Nesta perspectiva, Dotti ressaltou que “[…]  a evolução dos mecanismos técnicos que tornaram possível o aproveitamento da informática criou no homem uma necessidade de reação contra algo de extraordinário que há bem pouco tempo não passaria de ficção, mas que hoje ameaça gravemente o desenvolvimento natural da personalidade. Não se trata apenas da existência de meios capazes de levar à destruição material da humanidade, mas também, e fundamentalmente, da colocação à disponibilidade de certos órgãos, instrumentos tecnológicos aptos, por si sós, a reduzir o homem à qualidade de simples peça de uma máquina de produção burocrática.” DOTTI, René Ariel. Proteção da vida privada e liberdade de informação. RT, São Paulo, 1980, p. 251.

[11] GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 7ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 298.

[12] De acordo com HIRATA, “A origem do termo privacidade no campo jurídico remete ao “right to privacy”. A privacidade (privacy) pode ser definida como o direito de estar só ou, talvez mais preciso, o direito de ser deixado só (“right to be let alone”). Assim, entende-se que a privacidade pode sofrer ataques, podendo gerar desgastes e dores muito maiores que uma injúria corporal. Ainda que bastante vaga, essa primeira concepção de privacidade deve ser interpretada como sendo o “direito de ser deixado só”, que remete à não interferência pelo Estado na vida do indivíduo. Todavia, deve-se entender a privacidade não apenas como a não interferência do Estado na vida do indivíduo, mas também como o poder de se reivindicar ao Estado a tutela dessa privacidade, protegendo o indivíduo de terceiros.   Na sociedade contemporânea, porém, a noção de privacidade extravasa os conceitos de isolamento ou tranquilidade. O “right to be let alone” revela-se insuficiente em uma sociedade em que os meios de violação da privacidade caminham paralelamente aos diversos e importantes avanços tecnológicos. ” HIRATA, Alessandro. Direito à privacidade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/71/edicao-1/direito-a-privacidade

[13] A propósito, de acordo com Ingo Wolfgang Sarlet, “dignidade humana é qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.” SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 60.

[14] HIRATA explica que “Outra forma de tratamento desses conceitos é dada pela chamada teoria das esferas (Sphärentheorie do direito alemão).  Assim, entende-se que a necessidade de limitação da liberdade individual no plano social inter-relacional gera a sua tutela jurídica. Assim, a intensidade dessa tutela jurídica deve variar de forma inversamente proporcional à sociabilidade do comportamento analisado. Ou seja, quanto mais interno dentro das esferas estiver o comportamento, mais intensa deverá ser a proteção jurídica. A teoria das esferas divide, desse modo, a noção de privacidade em três esferas concêntricas chamadas de PrivatsphäreIntimsphäre Geheimsphäre (esfera privada, íntima e secreta). Na primeira, a esfera privada, estão contidas as outras duas esferas. Nela se encontram aspectos da vida da pessoa excluídos do conhecimento de terceiros. Aproxima-se, de certa forma, da noção de privacidade ou privacy. A esfera íntima é a segunda, intermediaria às outras duas, contendo os valores do âmbito da intimidade, com acesso restrito a determinados indivíduos com os quais a pessoa se relaciona de forma mais intensa. Por fim, a menor e mais interna esfera, a do segredo, referindo-se ao sigilo. Desse modo, quanto mais interna for a esfera, mais intensiva deve ser a proteção jurídica da mesma. Contudo, a teoria das esferas enfrenta também críticas, apesar de sua aplicação pelos tribunais alemães. Aponta-se a impossibilidade de se determinar cientificamente as fronteiras que dividem as fatispécies nas três esferas, PrivatsphäreIntimsphäre Geheimsphäre. Ainda, pode-se falar na falta de relevância prática na divisão em esferas, não resultando em proteção jurídica diversa. ”  HIRATA, Alessandro. Direito à privacidade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/71/edicao-1/direito-a-privacidade

 

 

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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