A Recomendação nº 74 /2020[1] do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) prescreve medidas para a implementação da Política de Dados Abertos no âmbito do Poder Judiciário, tendo em vista a garantia constitucional da publicidade dos atos processuais, o princípio da transparência e o direito fundamental à proteção de dados pessoais.[2]
Sem desprezar a necessidade da preservação do direito fundamental à proteção dos dados pessoais de todos os cidadãos, as orientações do Conselho Nacional de Justiça atentaram-se para importância da garantia da publicidade e da transparência dos atos judiciais, notoriamente reconhecidos como instrumentos indispensáveis ao controle democrático das atividades do Poder Judiciário.
Entre os motivos indicados pelo Conselho Nacional de Justiça para a criação da medida, destacou-se a importância da proteção dos direitos da personalidade e a indispensabilidade do respeito à autodeterminação informativa do indivíduo, sobretudo diante dos riscos advindos do acesso massificado a informações contidas em processos judiciais.
De outro lado, tendo em vista o aumento da utilização da rede mundial de computadores e a crescente utilização de modelos computacionais estruturados, a importância da segurança no emprego de tecnologias para aumento da produtividade judiciária eleva-se ainda mais.
No plano constitucional o tema é abordado, inicialmente, no art. 5º, inciso LX, da Constituição Federal, segundo o qual só poderá haver restrição legal da publicidade dos atos processuais quando for indispensável à defesa da intimidade ou por interesse social.
Do mesmo modo, o inciso IX, do art. 93, da Constituição Federal, com redação modificada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, estabelece que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.”
Na legislação infraconstitucional a disciplina da questão encontra-se principalmente na Lei nº 13.709/2018, que dispõe sobre a proteção de dados pessoais e altera a Lei nº 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet.[3]
Além de recomendar, em linhas gerais, a implementação de procedimentos relativos à governança do acesso e do uso massificado de dados, o Conselho Nacional de Justiça sugeriu que os órgãos do Poder Judiciário disponibilizem ao público APIs (Application Programming Interfaces), para que os dados existentes em seus sistemas de tramitação processual pudessem ser acessados em formato legível por máquina.
Com relação aos custos gerado pelo acesso massificado de dados, ficou estabelecido que a cobrança de valores para custeio das despesas de implantação e manutenção do sistema poderá ser, facultativamente, realizada pelos Tribunais, consideradas as particularidades de cada um. De todo modo, assentou-se que não poderá haver cobrança para o acesso de dados realizado por órgãos públicos ou por órgãos de pesquisa, inseridos no conceito do 5º, inciso XVIII, da Lei nº 13.709/2018[4].
Ainda para favorecer a implementação dos procedimentos, há previsão de que devem ser criadas normas acerca da uniformização dos identificadores e metadados armazenados, referentes aos correspondentes pronunciamentos judiciais.
Essas medidas de padronização auxiliam a racionalização do acesso aos dados e favorece a criação de condições para desenvolvimento de tecnologias voltadas ao aperfeiçoamento sistêmico da justiça.
Ainda é válido lembrar que a concretização dos propósitos da recomendação será auxiliada por um grupo específico de trabalho, criado pela Portaria CNJ nº 63/2019. Esse grupo será responsável pelo exame da política de acesso às bases de dados processuais dos tribunais, especialmente quanto a sua utilização para fins comerciais.
São esses os principais destaques da recomendação.
Cumpre dizer, em síntese, que as orientações estabelecidas na Recomendação CNJ nº 74/2020 demonstram a importância do papel desempenhado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na efetivação dos Direitos Fundamentais e na promoção do aprimoramento das atividades desenvolvidas pelo Poder Judiciário.
[1] Essa Recomendação tem ligações com as seguintes normas: Resolução CNJ nº 331, de 20 de agosto de 2020 e Lei nº 13.709/2018.
[2] Este é o terceiro de uma série de outros textos que tratam das orientações normativas do Conselho Nacional de Justiça.
[3] Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) (Lei nº 13.709/2018). Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. Parágrafo único. As normas gerais contidas nesta Lei são de interesse nacional e devem ser observadas pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos: I – o respeito à privacidade; II – a autodeterminação informativa; III – a liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião; IV – a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem; V – o desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação; VI – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e VII – os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais.
[4] XVIII – órgão de pesquisa: órgão ou entidade da administração pública direta ou indireta ou pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos legalmente constituída sob as leis brasileiras, com sede e foro no País, que inclua em sua missão institucional ou em seu objetivo social ou estatutário a pesquisa básica ou aplicada de caráter histórico, científico, tecnológico ou estatístico.