Malversação de recursos administrados pela Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM): configuração do tipo penal indicado no art. 2º, inciso IV, da Lei nº 8.137/90.

Data:

Superior Tribunal de Justiça posicionou-se no sentido de que a malversação dos recursos administrados pela Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) ajusta-se ao tipo penal assinalado no art. 2º, IV, da Lei n.º 8.137/90[1] e não ao crime de estelionato com pena aumentada, nos termos do art. 171, § 3º[2], do Código Penal.[3]

Confira a seguinte ementa:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDO DE INVESTIMENTO DA AMAZÔNIA. FINANCIAMENTO. LIBERAÇÃO DE PARCELAS. FRAUDE. ESTELIONATO. NÃO OCORRÊNCIA. CRIME PREVISTO NO ART. 2º, IV, DA LEI Nº 8.137/90. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS. ABSORÇÃO. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83 DO STJ. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE O CRIME CONSUNTO POSSUIR MAIOR GRAVIDADE. TESE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282/STF E 356/STF. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

  1. A jurisprudência desta corte é no sentido de que “a malversação dos recursos oriundos do FINAM e administrados pela SUDAM se amoldam ao tipo penal previsto no art. 2.º, IV, da Lei n.º 8.137/90 e não ao do art.171, § 3º, do Código Penal” (AgRg no AREsp 739.630/TO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJe 29/06/2016).
  2. Em relação a conduta de falsificação de documentos, visando à liberação das parcelas do financiamento de projetos de desenvolvimento da Amazônia, esta Corte também firmou entendimento de que ficam absorvidos os crimes de falsificação, ainda que estes possuam penas mais graves, desde que realizados unicamente como meio para a realização do delito do art. 2º, IV, da Lei 8.137/1990. Precedentes.
  3. Estando o acórdão recorrido em sintonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, incide o enunciado 83 da Súmula desta Corte, o qual é aplicável tanto aos recursos interpostos com base na alínea “c” quanto aos com base na alínea “a” do permissivo constitucional.
  4. É condição sine qua non ao conhecimento do especial que tenham sido ventiladas, no contexto do acórdão objurgado, as teses jurídicas indicadas na formulação recursal, emitindo-se, sobre elas, juízo de valor. Inteligência dos enunciados 282 e 356/STF.
  5. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 897.927/TO, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/08/2016, DJe 29/08/2016)

Informações Complementares à Ementa      “[…] as decisões proferidas em habeas corpus não se prestam à configuração do ‘dissídio jurisprudencial’ de que trata a alínea ‘c’ do  art.  105  da CF. Essa vedação tem como fundamento o fato de que ‘os remédios constitucionais não guardam o mesmo objeto/natureza e a mesma extensão material almejados no recurso especial'[…].      Entretanto,  o  referido entendimento não limita a aplicação do enunciado  83 da Súmula do STJ. Isso porque, para demonstrar a linha de   entendimento   adotada   pela  jurisprudência  deste  Sodalício Superior,  é possível utilizar qualquer modalidade de processo, como recursos  especiais,  agravos,  ou  mesmo ‘habeas corpus’, desde que seja possível inferir a ‘quaestio iuris’ posta em debate, assim como ocorreu ‘in casu'”.

[1] Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:  […] IV – deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento.

[2] Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: […] § 3º – A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

[3] Aprofunde a pesquisa em: BITENCOURT, Cezar Roberto. Crimes Contra a Ordem Tributária. Saraiva Educação SA, 2017.REBOUÇAS, Sérgio Bruno Araújo et al. Supressão fraudulenta de tributo ou inadimplemento da obrigação tributária? Sobre a real diferença entre os crimes contra a ordem tributária do artigo 1º e os do artigo 2º da Lei nº 8.137/1990. Revista de Estudos Criminais, v. 19, n. 76, p. 79-98, 2020.

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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