Vocação pacificadora da atividade jurisdicional e análise principiológica da jurisdição

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Coautora: Samantha Mendes Longo. Sócia do Wald, Antunes, Vita, Longo e Blattner Advogados. Negotiation and Leadership Program at Harvard University. LLM. em Direito Empresarial pelo IBMEC/RJ. Membro do Grupo de Trabalho de recuperação judicial criado pelo Conselho Nacional de Justiça. Membro do Comitê Gestor de Conciliação do Conselho Nacional de Justiça. Secretária das Comissões de Recuperação Judicial e de Mediação do Conselho Federal da OAB. Diretora do IBAJUD. Professora da EMERJ, da ESAJ e da FGV (convidada).

O presente artigo almeja tratar da atividade jurisdicional a partir da análise de alguns princípios, relacionados à sua vocação pacificadora. Serão analisados os princípios do juiz natural, da inércia da jurisdição, da independência funcional do magistrado, da imparcialidade, da investidura, da territorialidade, da indelegabilidade, da inafastabilidade, da indeclinabilidade, da inevitabilidade, da perpetuatio jurisdictione, da vinculação do juiz aos fatos da causa e do conhecimento do Direito pelo juiz.

Introdução

A jurisdição estatal é vocacionada à superação de conflitos no âmbito social. Não obstante a existência de outros meios autocompositivos ou heterompositivos, a jurisdição é, essencialmente, a maior referência instrumental no campo da superação de controvérsias.

O exercício da atividade jurisdicional deve ser orientado por princípios próprios e por diretrizes normativas, congruentes com os parâmetros constitucionais fundamentais.

Vejamos os princípios que orientam e condicionam o exercício da jurisdição.

Princípio do Juiz Natural

O Princípio do Juiz Natural está previsto expressamente no artigo 5º, inciso XXXVII da Constituição Federal[1].

Também denominado de Princípio do Juiz Constitucional ou Princípio da Neutralidade, o Princípio do Juiz Natural garante que a jurisdição seja exercida por juízes competentes, previamente determinados, segundo critérios normativos objetivos. Nesse sentido, repudia a criação de tribunais ou juízos de exceção, criados após a ocorrência dos fatos que devem julgados, ou para julgar determinado caso específico[2].

Segundo o Princípio do Juiz Natural, cuja interpretação deve ser ampla, também é indispensável a previsão constitucional expressa de todas as competências jurisdicionais[3].

O Princípio do Juiz Natural consta ainda da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1947, cujo artigo 10, assinala que todo homem tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.

É relevante lembrar que o Princípio do Juiz Natural não é afrontado pelas previsões normativas que tratam da substituição de juízes, da prorrogação de competência e dos desaforamentos[4].

Nesse sentido, a propósito, o incidente de resolução de demanda repetitiva, contemplado no Código de Processo Civil, não viola esse Princípio, notadamente porque, em linhas gerais, corresponde à modificação de competência do juiz de primeiro grau ao Tribunal[5].

O Princípio do Juiz Natural, intimamente relacionado à Jurisdição, é um princípio central, do qual decorrem inúmeros outros: i) princípio da inércia da jurisdição; ii) princípio da independência; iii) princípio da imparcialidade; iv) princípio da investidura; v) princípio da aderência ao território; v) princípio da indelegabilidade; vi) princípio da indeclinabilidade; vii) princípio da inevitabilidade; viii) princípio da perpetuação da jurisdição (perpetuatio jurisdictione); ix) princípio da vinculação do juiz aos fatos da causa; x) princípio do conhecimento do Direito pelo juiz (iuria novit cúria).

Trataremos brevemente de alguns desses princípios.

Princípio da inércia da jurisdição

A jurisdição só será exercida mediante provocação.

De acordo com o art. 2º do Código de Processo Civil, o processo começa por iniciativa da parte, e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.

Em alguns casos excepcionais a aplicação do princípio sofre limitações, a exemplo do processo de execução, que o juiz pode extinguir de ofício se verificar a ocorrência da prescrição, após a oitiva das partes, conforme previsto no §4º, do art. 937, do Código de Processo Civil.

A busca da verdade dos fatos pode justificar a atuação de ofício do juiz, sobretudo para determinação de produção de provas que sejam necessárias ao julgamento do mérito. Nesse sentido, aliás, o art. 377 do Código de Processo Civil preconiza que ao juiz caberá, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. ”

O exercício do poder geral de cautela do juiz, a necessidade de assunção de medidas de interesse público, as efetivações das tutelas de urgência, entre outras, também podem justificar a relativização do princípio da inércia.

Sempre que for permitida a relativização do Princípio da Inércia, contudo, segundo o art. 10 do Código de Processo Civil, antes de agir de ofício, exceto em casos excepcionais, o juiz deve ouvir previamente os interessados. O referido artigo prevê que em qualquer grau de jurisdição, o órgão jurisdicional não pode decidir com base em fundamento a respeito do qual não se tenha oportunizado manifestação das partes, ainda que se trate de matéria apreciável de ofício.

Princípio da independência funcional do Magistrado

Os magistrados dever ser independentes para exercer a jurisdição, para interpretar e aplicar normas jurídicas aos casos concretos, livres de pressões de qualquer natureza, políticas, sociais, econômicas etc.

A independência funcional dos magistrados representa uma segurança para os próprios jurisdicionados, certos de que seus conflitos serão julgados por um juiz que não está vulnerável a pressões e influências ilegítimas[6].

A independência funcional é uma garantia que deve ser utilizada para a prestação eficiente da atividade jurisdicional. Logo, deve estar ajustada a todos os parâmetros impostos pelo Estado Democrático de Direito. Assim, para evitar abusos, reputa-se legítimo o controle[7] disciplinar e administrativo, feito pelo próprio Poder Judiciário, através dos órgãos correcionais e do Conselho Nacional de Justiça, sem interferência nos méritos da atividade Jurisdicional em sentido estrito.

O princípio da independência deve ser ajustado aos princípios da segurança jurídica, da isonomia e da celeridade[8] processuais, considerando que o jurisdicionado tem direito de saber previamente das regras adotáveis no processo e de receber tratamento processual isonômico, respostas idênticas para casos idênticos, dentro de um prazo de tempo razoável.

O art. 7º do Código de Processo Civil assegura às partes paridade de tratamento no curso do processo, competindo ao juiz velar pelo efetivo contraditório.

Da mesma forma, o art. 139, inciso I, do CPC prevê que o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe assegurar às partes igualdade de tratamento.

Princípio da Imparcialidade

A imparcialidade garante que o juiz não terá interesse na causa, que julgará objetivamente a causa, sem conceder vantagens ou desvantagens indevidas às partes.

A imparcialidade convive harmoniosamente com a atividade jurisdicional participativa do juiz.

Princípio da Investidura

A jurisdição só poderá ser desempenhada por quem tenha sido regularmente investido nas funções de magistrado, para atuar em nome do Estado.

A investidura na magistratura pode ocorrer por concurso público, segundo o art. 93, inciso I, da Constituição Federal, ou mediante indicação do Poder Executivo, como no caso do quinto constitucional, de acordo com o art. 94, da Constituição Federal.

Sem prejuízo da necessidade da sua investidura, o magistrado poderá contar com auxílio de colaboradores, como conciliadores e mediadores[9].

O artigo 139 do Código de Processo Civil assinala que o juiz deve promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente, com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais.

Mesmo que não investidos de poder jurisdicional[10], os conciliadores e mediadores exercem um destacado papel na resolução das controvérsias submetidas à apreciação do Poder Judiciário.

Princípio da Territorialidade ou da Aderência ao Território

O Princípio da Territorialidade, ou Princípio da Aderência ao Território, também chamado de Princípio da Improrrogabilidade da Jurisdição, tem como efeito a limitação do alcance do Poder Jurisdicional a determinado espaço territorial[11].

Apesar da unidade do poder, a Jurisdição, por seus órgãos, é exercida em determinados fragmentos territoriais.

A Jurisdição deve ser exercida dentro dos limites territoriais indicados nas normas de competência territorial.

A prática de atos processuais fora de tais limites territoriais da competência do juízo dependerá da colaboração de outros juízos, mediante expedição de cartas, rogatórias ou precatórias.

O Código de Processo Civil admite a relativização do Princípio da Territorialidade em alguns casos.

Nos casos de imóvel localizado em mais de um Estado, comarca, seção ou subseção judiciárias, de acordo com o art. 60, do CPC, por prevenção, a competência se estende sobre todo o imóvel, inclusive na parte que extrapola os limites territoriais de sua jurisdição.

O art. 255 do CPC também admite a prática de atos de comunicação processual em comarcas contíguas, de fácil comunicação ou da região metropolitana, independentemente de carta precatória.

Ainda o art. 453, §1º, do CPC, autoriza a colheita de depoimento à distância, por meio de sistema de transmissão de imagem.

Esses são, portanto, alguns dos exemplos de relativização do princípio da territorialidade, apontados pelo Código de Processo Civil.

Princípio da Indelegabilidade

Segundo o Princípio da Indelegabilidade, exceto quando for autorizado pela Constituição, o magistrado, regularmente investido, não pode delegar o exercício da atividade jurisdicional para outra pessoa.

O Poder jurisdicional pertence ao Estado e por ele é exercido através de agentes políticos regularmente investidos nessa condição.  Assim, como o poder jurisdicional não pertence pessoalmente ao magistrado, ele não poderá cedê-lo sem que exista uma prévia autorização da Constituição Federal.

A delegações para o exercício do poder jurisdicional, chamadas de competência, são expressamente previstas na Constituição Federal, vedando-se qualquer modificação de caráter infra-constitucional.

A indelegabilidade só alcança atos decisórios, ou seja, atos vinculados à jurisdição em sentido estrito e que não gerem prejuízo ou ônus às partes. Noutro sentido, os atos que não dizem respeito ao exercício estrito da jurisdição e que não causem prejuízo ou ônus às partes podem ser praticados por outros colaboradores do Poder Judiciário, sobretudo em prol da celeridade[12] da prestação jurisdicional.

O artigo 67 do CPC prevê que os órgãos do Poder Judiciário, estadual ou federal, especializado ou comum, em todas as instâncias e graus de jurisdição, inclusive os tribunais superiores, têm o dever de recíproca cooperação, por meio de seus magistrados e servidores. No mesmo sentido, o art. 68 do CPC estipula que os juízos poderão formular entre si pedido de cooperação para prática de qualquer ato processual, sem necessariamente haver uma forma específica de cooperação, podendo ela ser, por exemplo, mediante: auxílio direto; reunião ou apensamento de processos; prestação de informações; atos concertados entre os juízes cooperantes; cartas de ordem, precatória e arbitral.

Princípio da inafastabilidade

O Princípio da Inafastabilidade, previsto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, expressa a garantia de que não haverá lesão ou ameaça a direito que não possa ser levada à apreciação do Poder Judiciário.

A mencionada garantia é reafirmada no artigo 3º. do Código de Processo Civil ao assegurar que não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

O art. 217, §1º, da Constituição Federal, ao tratar da Justiça Desportiva, de certa forma, representa uma relativização ao princípio da inafastabilidade.

A jurisprudência já decidiu que ser legítima a exigência de prévio requerimento administrativo, por exemplo de concessão de benefício previdenciário[13], para demonstrar o interesse de agir. Assim, segundo a jurisprudência o interesse é possível que o processo seja extinto sem apreciação do mérito em virtude de carência de ação, por falta de interesse de agir, consistente na falta de prévio requerimento administrativo.

Também já foi reconhecida a constitucionalidade de normas genericamente limitativas da concessão de medidas de urgência pelo Poder Judiciário[14], desde que assegurada a análise da necessidade concreta da medida.

O Supremo Tribunal Federal já entendeu também que a arbitragem não representa violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, considerando que ela sempre é condicionada à livre iniciativa das partes, nos termos do art. 3º do Código de Processo Civil.

Princípio da indeclinabilidade

De acordo com o Princípio da Indeclinabilidade[15] o magistrado não pode se abster de se manifestar acerca da demanda que lhe for submetida.

O julgador deve necessariamente se manifestar sobre as pretensões dos das partes interessadas, ainda que seja para declarar sua incompetência, ou mesmo para extinguir o processo sem análise do mérito[16].

Também é chamado de princípio do non liquet (não existe), pois alude à inexistência da possibilidade de o juiz abster-se de julgar.

A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e o Código Civil, em seus artigos 4º e 126, respectivamente, prevêem que o juiz deverá julgar, ainda que não exista norma jurídica que disponha sobre o tema.

O Código de Processo Civil, no artigo 4º, assinala que as partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

Já no artigo 140 o Código de Processo Civil indica que o juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico.

Princípio da Inevitabilidade

O Princípio da Inevitabilidade indica que os jurisdicionados estão sujeitos aos efeitos da jurisdição. Os sujeitos processuais, inevitavelmente, segundo o princípio, devem se submeter aos efeitos das decisões judiciais, independentemente das suas vontades[17].

O princípio em apreço decorre da condição pública e cogente da Jurisdição.

Já houve discussão sobre a suposta relativização do princípio pela nomeação à autoria, sobretudo nas hipóteses em que o nomeado não aceitasse a nomeação.

O atual Código de Processo Civil não reproduziu o instituto da nomeação à autoria, previsto nos artigos 62 a 69 do Código de Processo Civil de 1973.

A nomeação à autoria deixou de ser considerada modalidade de intervenção de terceiros. De acordo com os artigos 338 e 339 do atual Código de Processo Civil, alegada a ilegitimidade passiva pelo réu, caso o autor concorde, o terceiro indicado deverá ser citado, e não apenas convidado, para integrar a relação processual.

Princípio da Perpetuação da Jurisdição (Perpetuatio Jurisdictione)

Fixada a competência[18] relativa, o Princípio da Perpetuatio Jurisdictione estabelece que ela não poderá ser modificada, ainda que haja uma alteração objetiva ou subjetiva do processo.

Esse princípio garante a efetividade e a celeridade da prestação da jurisdição, evitando que a demanda se submeta a vários órgãos jurisdicionais, de diferentes competências, sempre que se verificar a ocorrência de meras modificações do suporte fático.

Não houvesse essa regra, por exemplo, qualquer alteração voluntária dos endereços das partes implicaria modificação da competência. A instabilidade, nesses casos, seria evidente e o processo certamente se arrastaria por muito mais tempo.

Princípio da Vinculação do Juiz aos Fatos da Causa

O Princípio da Vinculação do Juiz aos Fatos da Causa limita o exercício da cognição ao impedir que o juiz conheça de dados que não foram trazidos ao processo pelas partes. Representa um instrumento de efetiva garantia de limitação à ingerência do Estado nos interesses privados[19].

O artigo 141 do Código de Processo Civil assinala que o juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Em algumas hipóteses o alcance do mencionado princípio é limitado pela lei.

Por exemplo, no art. 504, do Código de Processo Civil, há previsão expressa de que, se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito puder influir no julgamento do mérito, caberá ao órgão jurisdicional tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.  Em todo caso, o órgão jurisdicional ouvirá as partes sobre o fato novo, antes de decidir.

Além disso, o art. 323 do Código de Processo Civil estipula que o  pedido da pare deve ser certo[20], mas sua interpretação considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé.

Princípio do Conhecimento do Direito pelo Juiz

O Princípio do Conhecimento do Direito pelo Juiz decorre da máxima iuria novit cúria, de que o juiz já conhece o Direito e é dispensável explicá-lo em juízo.

Assim, a parte não estará obrigada a trazer em sua pretensão o direito que a ela se aplica, pois, o juiz o conhece e o aplicará, independentemente de arguição.

O Princípio refere-se ao conhecimento do Direito tridimensionalmente considerado. Assim, a cognição pelo juiz, independentemente de esclarecimento das partes, não se limita à lei, mas a todo o direito, inclusive aos fatos e valores que habitam a norma.

Para ilustrar essa orientação vale lembrar que o legislador processual previu que o juiz pode aplicar regras da experiência técnica, ainda que não suscitadas pelas partes.  Nesse sentido, o artigo 375, do Código de Processo Civil estipula que o juiz aplicará as regras de experiência comum, subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

Nos casos de norma estrangeira, municipal ou estadual, contudo, o juiz poderá determinar que a parte interessada prove seu teor e vigência. O art. 376, do Código de Processo Civil, nesse ponto, prevê que parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário deve provar o seu teor e a sua vigência, se assim o juiz determinar.

Conclusão

Considerando que a atividade jurisdicional deve ser desenvolvida conforme alguns parâmetros principiológicos próprios, foram apresentadas as linhas gerais dos mais importantes princípios que orientam jurisdição.

Assim, assinalou-se as principais notas distintivas dos princípios do juiz natural, da inércia da jurisdição, da independência funcional do magistrado, da imparcialidade, da investidura, da territorialidade, da indelegabilidade, da inafastabilidade, da indeclinabilidade, da inevitabilidade, da perpetuatio jurisdictione, da vinculação do juiz aos fatos da causa e do conhecimento do Direito pelo magistrado.

Bibliografia

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DALLARI, Sueli Gandolfiu. O Sistema Único de Saúde. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

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LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. Tradução José Lamego. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997.

MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1976.

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RUIZ, Ivan Aparecido. Princípio do acesso justiça. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

 

 

[1] Por ocasião de comentários sobre o tema, José Frederico Marques ponderou que a jurisdição pode ser exercida apenas por órgão previsto na Constituição da República: é o princípio do juiz natural ou juiz constitucional. Considera-se investido de funções jurisdicionais, tão-só, o juiz ou tribunal que se enquadrar em órgão judiciário previsto de modo expresso ou implícito, em norma jurídico-constitucional. Há previsão expressa quando a Constituição exaure a enumeração genérica dos órgãos a que está afeta determinada atividade jurisdicional. Há previsão implícita, ou condicionada, quando a Constituição deixa à lei ordinária a criação e estrutura de determinados órgãos. MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1976.

[2] Ada Pellegrini Grinover assinalou que, mais do que direito subjetivo da parte e para além do conteúdo individualista dos direitos processuais, o princípio do juiz natural é garantia da própria jurisdição, seu elemento essencial, sua qualificação substancial. Sem o juiz natural, não há função jurisdicional possível. O princípio do juiz natural e sua dupla garantia. Revista de Processo, v. 29, jan. /Mar-1983

[3] Sobre o princípio do juiz natural, Ada Pellegrini Grinover, argumenta que a garantia reúne também a proibição de “subtrair o juiz constitucionalmente competente e desse modo, desdobra-se em três conceitos: a) só são órgãos jurisdicionais os instituídos pela Constituição; b) ninguém pode ser julgado por órgão constituído após a ocorrência do fato; c) entre os juízes pré-constituídos vigora uma ordem taxativa de competências que exclui qualquer alternativa deferida à discricionariedade de quem quer que seja.” GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

[4] Ada Pellegrini Grinnover adverte que não viola o juiz natural ‘meras modificações da competência entre os diversos órgãos da justiça comum’. Contudo, seria afrontoso ao princípio modificar a competência de casos pendentes iniciados na justiça comum em favor da justiça especializada criada pela Constituição. Nessa hipótese, o novo órgão judiciário só atenderia casos futuros. Com apoio em doutrina estrangeira, justifica a posição entendendo que o princípio do juiz natural limita a esfera do cânone (tempus regit actum) segundo o qual a lei do processo consiste nas normas vigentes no momento em que se procede. ”  GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

[5] Dispõe o art. 988, do Novo CPC: “Art. 988. É admissível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando, estando presente o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, houver efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito. § 1º O incidente pode ser suscitado perante tribunal de justiça ou tribunal regional federal. § 2º O incidente somente pode ser suscitado na pendência de qualquer causa de competência do tribunal. § 3º O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente do tribunal: I – pelo relator ou órgão colegiado, por ofício; II – pelas partes, pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela pessoa jurídica de direito público ou por associação civil, por petição. § 4º O ofício ou a petição a que se refere o § 3º será instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente.  § 5º A desistência ou abandono da causa não impedem o exame do mérito do incidente. § 6º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e poderá assumir sua titularidade em caso de desistência ou abandono.  § 7º A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade. Não impede que, uma vez presente o pressuposto antes considerado inexistente, seja o incidente novamente suscitado. § 8º É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva. § 9º O incidente pode ser instaurado quando houver decisões conflitantes sobre mesma questão de fato”.

 

[6] Com efeito, o órgão judicante deve estar isento, incólume, inviolável a essas pressões, pois a sua independência pressupõe assento na justiça, na razão e nos valores maiores que compõem a sociedade. Entretanto, é importante advertir que o julgador, seja ele órgão singular ou colegiado, é formado por homens, que por viverem em sociedade adquiriram e somatizaram valores e concepções sobre o justo. Esses julgadores, enquanto submetidos à condição humana, por vezes são auxiliares das suas emoções, carregadas de humanismo. Portanto, se não estiverem muito atentos para o escopo da função que por eles é exercida podem acabar conduzidos às sendas do erro. De qualquer forma, seria sofismático falar em hermetismo absoluto do julgador, pois os valores que habitam o juiz não deixam de sombrear a independência do exercício jurisdicional. A despeito disso, fosse a independência estendida a esse ponto, far-se-ia do julgador um frio aplicador dor da lei, tergiversador da realidade.

[7] “O diálogo platônico volta a ser interessante, contudo, quando se perscruta a virtude política, buscando compreender se ela pode ser ou não ensinada ou aprendida. Aí nem Sócrates nem Protágoras são convincentes. E talvez a melhor opção seja mesmo a de Habermas: a combinação e mediação recíproca entre a soberania do povo juridicamente institucionalizada e a não-institucionalizada. Assim, o controle democrático da atuação dos órgãos técnicos resultaria da participação de pessoas exteriores à Administração buscando adequar os meios aos fins escolhidos e, também, do exercício regular do Poder Judiciário. Sem assumir a necessária mediação do povo, a racionalidade jurídica será ineficaz como mecanismo de controle de órgãos técnicos.”DALLARI, Sueli Gandolfiu. O Sistema Único de Saúde. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/172/edicao-1/o-sistema-unico-de-saude

[8] “O processo civil brasileiro não coaduna mais com a vetusta ideia de que um processo deve ser demorado, de cognição plena e exauriente, para que seja justo, mesmo que isso custe a própria sorte dos direitos pleiteados. Muitas vezes, a satisfação, quando chegava, não era mais acompanhada pela mesma necessidade que motivara o autor a ir até o Judiciário. Já há algum tempo, em vista de compromissos assumidos pelo Brasil no plano internacional, a Constituição e a legislação processual reclamavam a necessidade de previsões específicas para tratar da tutela judicial em tempo razoável, da mesma forma que se reclamava dos Poderes a necessidade de incremento de alternativas e soluções para que o Judiciário pudesse atender tais tutelas enquanto ainda fossem pungentes as violações a direitos.” OLIVEIRA, Emerson Ademir Borges de. Princípio da celeridade processual. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/188/edicao-1/principio-da-celeridade-processual

 

[9] Sobre a questão o artigo 149, do novo CPC prevê que são auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam determinadas pelas normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria, o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o mediador, o conciliador judicial, o partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador de avarias.

[10] Pelo princípio em questão, a investidura do conciliador e do mediador se dará por nomeação ou por concurso público, na forma prevista na lei de organização judiciária de cada Tribunal.

[11] A Jurisdição, na condição de expressão da soberania do Estado, assim como essa, limita-se ao seu espaço territorial.

[12] […] a criação de procedimentos específicos para a solução de direitos que pudessem ser alcunhados de menos complexos, bem como o maior estímulo à conciliação, redundaram, para atender ao mandamento constitucional (art. 98, I, CF), na Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/1995), bem como em sua larga implementação, na esfera federal e estadual. […] Mas especialmente com a Reforma do Judiciário, propugnada em parte pela Emenda Constitucional 45, de 2004, o inciso XXXV do art. 5º da Constituição, que trata da inafastabilidade da jurisdição, viu-se complementado pela necessidade, agora esculpida no inciso LXXVIII do mesmo artigo, de que os processos, judiciais e administrativos, devam chegar à satisfação em tempo razoável, com garantia de celeridade em sua tramitação. Foi essa mesma lógica que, recentemente, veio a inspirar o novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), mormente em seus arts. 1º, 3º, § 3º, 4º e 6º, que, além de buscar o amparo constitucional do processo, insistem na necessidade de garantias para a solução satisfativa em tempo célere. É sobre esse tema que iremos discorrer.”OLIVEIRA, Emerson Ademir Borges de. Princípio da celeridade processual. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/188/edicao-1/principio-da-celeridade-processual

 

[13] Confira o julgamento em Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal: RE nº 631.240.

 

[14] Confira o julgamento da Adin nº 223 do DF, pelo Supremo Tribunal Federal.

[15] “O novo Código de Processo Civil tem como um de seus objetivos a promoção da Justiça pela autocomposição. Desta forma, a nova lei prestigia a conciliação como modo de resolução dos conflitos e impõe ao magistrado o dever de buscar a todo tempo a mediação como forma de solução amigável da lide. […] Por outro lado, do juiz é exigido que dê adequada solução à lide, quando vencida a tentativa de resolução pela via conciliatória deva decidir o caso submetido a seu julgamento. Por isso é que, não se exime de julgar mesmo que a hipótese não encontre solução legal, cabendo-lhe aplicar as regras de complementação correspondentes à analogia, costumes e princípios gerais do Direito, decidindo por equidade apenas quando autorizado expressamente pela lei, como é caso do art. 6º da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. É o princípio da indeclinabilidade da jurisdição, previsto no art. 140 do CPC. “ SOARES, Ronnie Herbert Barros. Magistratura. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/185/edicao-1/magistratura

[16] Em síntese, juiz é dotado de um poder-dever de julgar, não sendo permitido que se abstenha dele.

[17] Pondere-se que imposição da vontade da jurisdição, por outra face, encontra certo limite no que tange aos direitos materiais disponíveis discutidos no litígio.  Assim, se o objeto da demanda se referir a direito material, de interesse exclusivamente privado, as partes podem compor o litígio, seja transacionando, renunciando ou se submetendo à pretensão, caso em que o juiz, não poderá a isso se opor. De qualquer forma, a atividade jurisdicional será exercida, seja ao homologar o ato dispositivo da parte, seja ao extinguir o processo sem julgamento do mérito. Por outra banda, tratando-se de relação processual em que se discutam direitos que dizem para com o interesse público, o juiz não poderá deixar de impor a aplicação do direito, fazendo valer de forma inafastável o exercício jurisdicional, caso em que o princípio será aplicado na sua plenitude.

[18] Simplificadamente, competência é a medida de Jurisdição conferida a um órgão do Poder Judiciário. Essa limitação do exercício da jurisdição se divide em duas classes, competência absoluta ou relativa. Será absoluta a competência fixada em razão da matéria ou da função. Será relativa quando for fixada em razão do lugar ou do valor, salvo o chamado foro rei sitae, que impõe uma competência absoluta.  Três aspectos envolvem o tema, os critérios de determinação de competência, a imutabilidade da competência, e a sua possibilidade de modificação ou prorrogação.

[19] Nelson Nery Jr., comentando o artigo 128 do CPC dispõe: “as questões de ordem pública devem ser conhecidas ‘ex officio’ (v.g., CPC 267, parágrafo 3º, 301, parágrafo 4º), independentemente de pedido da parte ou interessado. As questões de direito indisponível, como, por exemplo, as de família, de direitos difusos (meio ambiente, consumidor etc.), podem ser investigadas no processo de ofício. O juiz, por exemplo, pode declarar nula determinada cláusula contratual, mesmo sem a requisição da parte, e até contra a sua vontade, porque o vício da nulidade é proclamável de oficio. As questões de ordem pública podem ser consideradas, do ponto de vista prático, incluídas implicitamente no pedido. Só a nulidade do casamento não pode ser declarada de ofício, ‘incidenter tantum’ no processo, porque para tanto a lei exige expressamente a propositura da ação (RT 494/176). Exemplos de questões de ordem pública, declaráveis de ofício, a cujo respeito não incide a regra da congruência entre os pedidos e sentenças, não se colocando o problema da decisão extra, infra ou ultra petita: a) cláusulas abusivas nas relações de consumo (CDC 1º. E 51 caputs); b) _ cláusulas gerais (CC 2035 par. ún.) da função social do contrato (CC421), boa-fé objetiva (CC422), função social da propriedade (CF 5º. XXIII e 170 III; CC 1228, parágrafo 1º), função social da empresa ( CF 170; CC 421 e 981; LSZ 116 par. ún.  e 154 caput). Em suma, as matérias de ordem pública não se submetem ao princípio da congruência, de modo que o juiz deve decidi-las, ainda que não constem do pedido, decisão essa que não terá sido proferida nem ultra nem extra petita. ” NERY JR, Nelson.  Código de Processo Civil Comentado, pág. 337. 9ª ed. São Paulo: RT, 2006.

[20] Compreendem-se, entretanto, no principal, os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os respectivos honorários advocatícios.

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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