Movimentos sociais e partidos políticos ressuscitaram neste ano iniciativas remontam um plano de compensação monetária elaborado no começo dos anos 1990 por um grupo de advogados e levado ao Supremo Tribunal Federal (STF), visando a reparação financeira à população negra pelo período em que funcionou no Brasil o regime de escravidão. A proposta não foi continuada por julgar que a União não teria condições de arcar com o pagamento.
Uma das iniciativas recentes é o projeto de lei elaborado de forma conjunta por parlamentares e lideranças de organizações civis e religiosas, como o Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (Fonsanpotma) e o movimento de Povos Tradicionais de Matriz Africana do Distrito Federal (DF). Encabeçada pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF), a proposta é que o Estado crie e organize políticas públicas para garantir a sobrevivência e a dignidade da população negra no país.
Segundo a deputada nenhum plano foi pensado para inserir as pessoas até então escravizadas na sociedade desde que a escravidão deixou de existir oficialmente no em 1888. “São grupos sociais que, com muita luta e resistência, preservaram e reinventaram suas tradições no bojo de interações com o ambiente e com outros grupos sociais”, escreve.
Entre as propostas, ela propõe a inviolabilidade dos territórios tradicionais de matriz africana, como terreiros, barracões e casas de batuque, salvo mandado judicial. Além disso, obriga o Executivo a fazer campanha nacional de informação e valorização da ancestralidade africana no Brasil. Para financiar essas e outras ações estatais, a parlamentar estipula ainda criação do Fundo Nacional de Reparação do Crime contra a Humanidade, que leva no nome a referência à escravidão.
Apresentado na 5ª Vara Cível Federal de São Paulo em 13 de maio deste ano, outro projeto de reparação da escravidão foi elaborado pela Fundação Educafro, entidade que promove a inclusão da população negra e pobre em universidades públicas.
A ação, assinada pelo advogado Irapuã Santana, presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB-SP, junto das advogadas Caroline Ramos e Ana Paula Gatti, exige que o Estado brasileiro peça desculpas formais pela escravidão e seja condenado pela omissão em relação ao racismo estrutural que, argumentam os advogados, impossibilitou a inclusão da população negra no mercado de trabalho.
Segundo eles, com o fim da escravidão “enquanto os povos não africanos eram convidados a vir para o Brasil, garantindo-lhes passagem, trabalho e casa, os quase seis milhões de negros foram proibidos pelo Estado brasileiro de ter um lugar para morar e para estudar (…) Enquanto os negros procuravam por trabalho, eram preteridos diante da alta oferta de imigrantes europeus e de seus filhos em terras brasileiras.”
Os advogados pedem a criação do Fundo Especial e Permanente de Combate ao Racismo e Emancipação da População Negra, que financiaria políticas que contribuísse com uma sociedade antirracista. A ação pede que a União destine ao fundo 1% da arrecadação dos impostos sobre renda (IR) e sobre produtos industrializados (IPI) e 3% das contribuições para os programas de Integração Social (PIS) e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep). Se já estivesse valendo, o montante para o ano de 2021 chegaria a R$ 8,75 bilhões, segundo dados da Receita Federal.
Para a advogada e vice-presidente da Comissão da Verdade e Memória da Escravidão Negra da OAB-SP, Lenny Blue de Oliveira, 69, é possível que estas ações obtenham sucesso, mas é necessário efetivar no orçamento diretrizes, metas e objetivos que atendam a população negra com programas supervisionados. Já para a pesquisadora Ana Carolina de Paula Silva, ex-vice-presidente da Comissão de Monitoramento e Avaliação da Lei Municipal de Cotas em São Paulo, os movimentos em curso no Brasil não têm chances de prosperar devido ao cenário político, que é de retrocesso e desmonte de políticas públicas.
Com informações do G1.
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