Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu. (Súmula n. 214/STJ) Jurisprudência em Teses – Edição nº 101
Esse entendimento se demonstra no seguinte julgado:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DO EMBARGADO. 1. O entendimento do Tribunal de origem está em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, no sentido de que, quando houver o aditamento, a transação ou qualquer modificação do contrato de locação, os fiadores devem anuir expressamente, pois a fiança é um contrato a ser interpretado restritivamente, ou seja, a responsabilidade dos fiadores se resume aos termos expressamente acordados. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1763058/MT, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 21/11/2019, DJe 27/11/2019)
Contrato é um negócio jurídico de natureza patrimonial.
No contrato as partes manifestam suas vontades para a criação de um dever jurídico principal (prestação de dar, fazer ou não fazer) e de deveres jurídicos anexos, como atenção às orientações do princípio da boa-fé objetiva.[1]
O Código Civil Italiano de 1942, no Art. 1.321, prevê que: “O contrato é acordo de duas ou mais partes para constituir, regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica patrimonial”.
No que se refere à formação o contrato é ao menos bilateral, considerando que há necessidade de comunhão de no mínimo duas vontades.
Com relação aos seus efeitos, no entanto, os contratos podem ser unilaterais, bilaterais ou plurilaterais, como veremos adiante.
Requisitos de validade dos Contratos
Os requisitos validade dos contratos podem ser gerais ou especiais.
Os requisitos gerais dos contratos, indicadas no artigo 104 do Código Civil, são os seguintes: i) partes capazes; ii) objeto lícito, possível, determinado ou determinável; iii) forma prescrita ou não defesa em lei.
Requisitos especiais de validade
A condição especial é acordo de vontades, que deve ser livre e espontâneo, sob pena de ser considerado defeituoso ou inválido.
Apesar disso, o silêncio pode ser considerado manifestação de vontade, sempre que as circunstâncias ou os usos autorizem, e não for necessária a declaração de vontade expressa, nos termos do artigo 111 do Código Civil (silêncio circunstanciado ou qualificado).
Embora não aparente, mesmo nos casos de mandado em causa própria, nos termos do artigo 685 do Código Civil, há manifestação de mais de uma vontade.
De acordo com o Art. 184 do Código Civil, respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável.
Além disso, segundo este artigo, a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal.
Para que o contrato seja considerado empresarial, ainda, é preciso que seja realizado entre empresários, em razão do exercício da empresa, em sentido amplo.[2]
Esse sentido amplo da contratação em razão do exercício da empresa compreende, inclusive, a realização de contratos como estratégias de mercado.[3]
CONTRATO DE FIANÇA
O contrato de fiança está regulado nos artigos 818 e seguintes do Código Civil.
Estes artigos disciplinam a fiança, independentemente da sua natureza.
Assim, caso o contrato de fiança seja realizado entre empresários, o negócio deve ser considerado um contrato empresarial.
Nesse caso, as regras da fiança precisam ser ajustadas à natureza empresarial do contrato, sobretudo com a aplicação dos princípios gerais dos contratos empresariais.
Logo, por exemplo, caso a fiança seja empresarial é preciso presumir a existência de simetria entre os contratantes.
Características gerais do contrato de fiança
Conforme previsto no Art. 818 do Código Civil, no contrato de fiança, o fiador garante satisfazer uma obrigação assumida pelo afiançado, caso este não o faça.
A validade e a eficácia do contrato de fiança independentemente do consentimento do devedor.
O contrato de fiança, que não admite interpretação extensiva, deve ser realizado por instrumento escrito.
Objeto da fiança
É possível que o contrato de fiança diga respeito a dívidas futuras.
No silêncio do contrato, a fiança compreenderá todos os acessórios da dívida principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do fiador, conforme indicado no Art. 823 do Código Civil.
Ao contrário do que se passa com o aval, por ter natureza acessória a fiança não pode ser contratada para garantir obrigações nulas.
Esta regra não se aplica no caso de a nulidade decorrer apenas da incapacidade do afiançado.
Substituição do fiador
O credor garantido pela fiança poderá requer a substituição do fiador que se tornar incapaz ou insolvente.
Benefício de ordem
O benefício de ordem, nos termos do Art. 827 do Código Civil, confere ao fiador demandado o direito de exigir, até a contestação da lide, que os bens do devedor afiançado sejam executados antes dos seus.
Ao exercer o direito correspondente ao benefício de ordem o fiador deverá, no entanto, nomear bens do devedor que sejam aptos à satisfação do crédito pretendido.
O fiador poderá renunciar ao benefício de ordem.
Fiança conjunta
Caso a fiança seja prestada por mais de um fiador, salvo ajuste noutro sentido, se deve presumir que há solidariedade entre os fiadores.
Sub-rogação nos direitos do credor
Conforme previsão do Art. 831 do Código Civil, o fiador que pagar integralmente a dívida do afiançado ficará fica sub-rogado nos direitos do credor.
O fiador, neste caso, poderá demandar os demais fiadores de acordo com a respectiva quota de cada um.
Enunciados das Jornadas de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal sobre contratos – CJF
Para a compreensão doutrinária mais aprofundada do tema, convém conhecer o teor dos seguintes enunciados das Jornadas de Direito Comercial do CJF:
Enunciado número 20. Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados entre empresários em que um dos contratantes tenha por objetivo suprir-se de insumos para sua atividade de produção, comércio ou prestação de serviços.
Enunciado número 21. Nos contratos empresariais, o dirigismo contratual deve ser mitigado, tendo em vista a simetria natural das relações interempresariais.
Enunciado número 22. Não se presume solidariedade passiva (Art. 265 do Código Civil) pelo simples fato de duas ou mais pessoas jurídicas integrarem o mesmo grupo econômico.
Enunciado número 23. Em contratos empresariais, é lícito às partes contratantes estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação dos requisitos de revisão e/ou resolução do pacto contratual.
Enunciado número 24. Os contratos empresariais coligados, concretamente formados por unidade de interesses econômicos, permitem a arguição da exceção de contrato não cumprido, salvo quando a obrigação inadimplida for de escassa importância.
Enunciado número 25. A revisão do contrato por onerosidade excessiva fundada no Código Civil deve levar em conta a natureza do objeto do contrato. Nas relações empresariais, deve-se presumir a sofisticação dos contratantes e observar a alocação de riscos por eles acordada.
Enunciado número 26. O contrato empresarial cumpre sua função social quando não acarreta prejuízo a direitos ou interesses, difusos ou coletivos, de titularidade de sujeitos não participantes da relação negocial.
Enunciado número 27. Não se presume violação à boa-fé objetiva se o empresário, durante as negociações do contrato empresarial, preservar segredo de empresa ou administrar a prestação de informações reservadas, confidenciais ou estratégicas, com o objetivo de não colocar em risco a competitividade de sua atividade.
Enunciado número 28. Em razão do profissionalismo com que os empresários devem exercer sua atividade, os contratos empresariais não podem ser anulados pelo vício da lesão fundada na inexperiência.
Enunciado número 29. Aplicam-se aos negócios jurídicos entre empresários a função social do contrato e a boa-fé objetiva (Arts. 421 e 422 do Código Civil), em conformidade com as especificidades dos contratos empresariais.
Enunciado número 30. Nos contratos de shopping center, a cláusula de fiscalização das contas do lojista é justificada desde que as medidas fiscalizatórias não causem embaraços à atividade do lojista.
Enunciado número 32. Nos contratos de prestação de serviços nos quais as partes contratantes são empresários e a função econômica do contrato está relacionada com a exploração de atividade empresarial, as partes podem pactuar prazo superior a quatro anos, dadas as especificidades da natureza do serviço a ser prestado, sem constituir violação do disposto no Art. 598 do Código Civil.
Enunciado número 33. Nos contratos de prestação de serviços nos quais as partes contratantes são empresários e a função econômica do contrato está relacionada com a exploração de atividade empresarial, é lícito às partes contratantes pactuarem, para a hipótese de denúncia imotivada do contrato, multas superiores àquelas previstas no Art. 603 do Código Civil.
Enunciado número 34. Com exceção da garantia contida no artigo 618 do Código Civil, os demais artigos referentes, em especial, ao contrato de empreitada (Arts. 610 a 626) aplicar-se-ão somente de forma subsidiária às condições contratuais acordadas pelas partes de contratos complexos de engenharia e construção, tais como EPC, EPC-M e Aliança.
Enunciado número 35. Não haverá revisão ou resolução dos contratos de derivativos por imprevisibilidade e onerosidade excessiva (Arts. 317 e 478 a 480 do Código Civil).
Enunciado número 36. O pagamento da comissão, no contrato de corretagem celebrado entre empresários, pode ser condicionado à celebração do negócio previsto no contrato ou à mediação útil ao cliente, conforme os entendimentos prévios entre as partes. Na ausência de ajuste ou previsão contratual, o cabimento da comissão deve ser analisado no caso concreto, à luz da boa-fé objetiva e da vedação ao enriquecimento sem causa, sendo devida se o negócio não vier a se concretizar por fato atribuível exclusivamente a uma das partes.
Enunciado número 37. Aos contratos de transporte aéreo internacional celebrados por empresários aplicam-se as disposições da Convenção de Montreal e a regra da indenização tarifada nela prevista (Art. 22 do Decreto n. 5.910/2006).
Enunciado número 38. É devida devolução simples, e não em dobro, do valor residual garantido (VRG) em caso de reintegração de posse do bem objeto de arrendamento mercantil celebrado entre empresários.
Enunciado número 67. Na locação built to suit (construído para servir, ou de construção ajustada), é válida a estipulação contratual que estabeleça cláusula penal compensatória equivalente à totalidade dos alugueres a vencer, sem prejuízo da aplicação do Art. 416, parágrafo único, do Código Civil[4].
Enunciado número 68. No contrato de comissão com cláusula del credere, responderá solidariamente com o terceiro contratante o comissário que tiver cedido seus direitos ao comitente, nos termos da parte final do Art. 694 do Código Civil[5].
Referências
Para aprofundamento dos estudos dos contratos de fiança confira as seguintes referências
CHALHUB, Melhim Namem. Garantias nos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 8: Títulos de Crédito, Direito Bancário, Agronegócio e Processo Empresarial. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
COELHO, Fabio Ulhoa. As obrigações empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
COVAS, Silvanio. Contratos eletrônicos. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
FORGIONI, Paula A. A interpretação dos negócios jurídicos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
MIRAGEM, Bruno. Contratos bancários. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 8: Títulos de Crédito, Direito Bancário, Agronegócio e Processo Empresarial. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Contratos empresariais. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Comercial. Fábio Ulhoa Coelho, Marcus Elidius Michelli de Almeida (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.
RIBEIRO, Maria Carla Pereira. Teoria geral dos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
SADII, Jairo. Regimes especiais de liquidação e intervenção extrajudicial nas instituições financeiras. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 8: Títulos de Crédito, Direito Bancário, Agronegócio e Processo Empresarial. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
SILVA, Leonardo Toledo da. Contratos de infraestrutura. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 6: Estabelecimento Empresarial, Propriedade Industrial e Direito da Concorrência. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
TIMM, Luciano Benetti. Análise econômica do direito das obrigações e contratos comerciais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
TURCZYN, Sidnei. Conceito e características gerais dos contratos bancários. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 8: Títulos de Crédito, Direito Bancário, Agronegócio e Processo Empresarial. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
TZIRULNIK, Ernesto. O contrato de seguro. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
WANDERER, Bertrand. Lesão e onerosidade excessiva nos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
WARDE JR. Walfrido Jorge. A boa-fé nos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
[1] “A boa-fé germânica, que remete à expressão Treu und Glauben, marca uma conquista recente da Ciência Histórica do Direito, que se destaca da bona fides romanística, apenas a partir dos anos 1940, sob os estudos linguísticos de Pretzel e de Neumann, de 1949, com a tese de Nesemann e, por fim, em 1947, dom o estudo de Strätz.” WARDE JR. Walfrido Jorge. A boa-fé nos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 131.
[2] “Para que uma obrigação se caracteriza como empresária, são necessários pressupostos de ordem objetiva e subjetiva. O pressuposto subjetivo diz respeito aos sujeitos da relação obrigacional. Nas obrigações empresariais, como regra geral, todas as partes são empresárias. No vínculo obrigacional, é credor e devedor uma pessoa física (empresário individual) ou jurídica (sociedade empresária) que explora atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços. Alarga-se o conceito apenas para alcançar, de um lado, as obrigações decorrentes de certos contratos específicos do direito comercial, mas cujas partes não são necessariamente empresários, como o acordo de acionistas ou o contrato de administração de empresas, e, de outro, as obrigações cambiárias. Estes vínculos obrigacionais devem se submeter ao mesmo tratamento jurídico liberado aos que aproximam exclusivamente empresários. […] Já o pressuposto objetivo diz respeito à natureza da obrigação, que deve forçosamente decorrer do exercício da atividade empresarial das duas partes.” COELHO, Fabio Ulhoa. As obrigações empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, P. 13.
[3] Por ocasião da abordagem dos contratos empresariais com estratégia, Ribeiro destacou o seguinte: “É claramente perceptível que os negócios que motivam os contratos comerciais não existem de forma isolada, mas como parte de um complexo sistema de mercado. Quando mais real a competitividade deste mercado, maior a elasticidade. […] os contratos comerciais muitas vezes são firmados não como propósito de chancela de uma ação colaborativa, mas para transmitir à outra parte uma mensagem de segurança que a conduza a levantar a guarda, potencializando a partir daí a prevalência da estratégia dominante […].” RIBEIRO, Maria Carla Pereira. Teoria geral dos contratos empresariais. Tratado de Direito Comercial. Fabio Ulhoa Coelho (coord.), volume 5: Obrigações e Contratos Empresariais. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 59.
[4] Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo. Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente.
[5] Art. 694. O comissário fica diretamente obrigado para com as pessoas com quem contratar, sem que estas tenham ação contra o comitente, nem este contra elas, salvo se o comissário ceder seus direitos a qualquer das partes