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Ação rescisória não possibilita analisar violação de lei não apontada pelo autor, mesmo em caso de ordem pública

Créditos: utah778 / iStock

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso especial por entender que a ação rescisória fundada na violação a literal dispositivo de lei não permite ao seu julgador analisar matéria estranha àquela apontada na exordial, mesmo que a questão seja de ordem pública.

O colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) para julgar improcedente a ação rescisória ajuizada em desfavor da sentença favorável a um pedido de adjudicação de imóvel, objeto de contrato de compra e venda.

A empresa autora da rescisória alegou violação dos artigos 332382 e 397 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, sustentando que a negativa do pedido de produção de provas quanto a uma suposta simulação de compra e venda do imóvel justificaria a rescisão da sentença.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) julgou o pedido procedente, desconstituiu a sentença e determinou o prosseguimento da ação de adjudicação para discutir a eventual simulação de compra e venda – questão de ordem pública –, garantida a produção de provas.

Ônus do requeren​​​te

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no Superior Tribunal de Justiça, afirmou que a indicação de violação a literal dispositivo de lei é ônus do requerente, já que constitui a causa de pedir da rescisória e vincula o exercício da jurisdição pelo órgão competente para apreciá-la – no caso, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.

De acordo com a ministra, não é possível ao julgador da rescisória examinar a decisão rescindenda para saber se teriam sido violados na sua literalidade outros dispositivos de lei, além daqueles apontados pelo autor do pedido.

Desta forma, o julgador da ação rescisória fundada no artigo 485, V, do CPC/1973 fica vinculado aos dispositivos de lei apontados na petição inicial como violados, e não pode examinar outras matérias – ainda que de ordem pública –, "sob pena de transformar a ação rescisória em mero sucedâneo recursal".

Limite ultr​​​apassado

Ela lembrou que a rescisória proposta pela empresa está fundada na previsão do inciso V do artigo 485 do CPC/1973, tendo como causa de pedir as alegadas violações aos artigos 332, 382 e 397 do código.

Apesar disso,ressaltou, o juízo rescindente foi baseado no reconhecimento de que a sentença proferida na ação de adjudicação transgrediu literal disposição do artigo 303 do antigo Código de Processo Civil.

"Na hipótese dos autos, o juízo rescindente promovido pelo tribunal de origem ultrapassou os limites das causas de pedir deduzidas pelo autor na presente ação rescisória, além de não ter observado que o indeferimento da produção probatória e o julgamento antecipado da lide foram devidamente fundamentados", destacou a ministra Nancy Andrighi.

A relatora considerou que o indeferimento da produção de provas na ação de adjudicação do imóvel foi fundamentado pelo juiz e que não houve cerceamento de defesa ou violação dos dispositivos indicados.

Exaurimento de instâ​​ncia

Apesar do provimento do recurso especial, a ministra Nancy Andrighi rejeitou o argumento da recorrente em relação à necessidade de exaurimento de instância como pré-requisito da ação rescisória.

"Ainda que, na hipótese concreta, a requerente não tenha interposto apelação da sentença rescindenda, essa circunstância, por si mesma, não representa óbice ao cabimento da ação rescisória", afirmou Nancy Andrighi.

O fato de não ter sido interposto algum recurso cabível – acrescentou, citando precedentes –, ou de tal recurso não ter invocado determinado dispositivo legal, não impede o exame de mérito da rescisória, "pois o essencial para tanto é que a decisão rescindenda tenha incidido em alguma das hipóteses de rescindibilidade previstas no artigo 485 do CPC/1973 – vigente à época do trânsito em julgado".

(Com informações do Superior Tribunal de Justiça - STJ)

Ementa

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. EXCEPCIONALIDADE. HIPÓTESES. TAXATIVIDADE. EXAURIMENTO DE INSTÂNCIA. PRESCINDIBILIDADE. ART. 485, V, DO CPC/73. LITERAL VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL. INDICAÇÃO DA NORMA VIOLADA. ÔNUS DO AUTOR. CAUSA DE PEDIR. TRIBUNAL. VINCULAÇÃO. JULGAMENTO ANTECIPADO. PRODUÇÃO DE PROVA. INDEFERIMENTO MOTIVADO. REAPRECIAÇÃO. INVIABILIDADE. JUÍZO RESCINDENTE. LIMITES. EXTRAPOLAÇÃO. SUCEDÂNEO RECURSAL. CARACTERIZAÇÃO.

1.Ação rescisória, pautada no art. 485, V, do CPC/ 73, por meio da qual, por alegada violação literal dos arts. 332, 382 e 397 do CPC/73, se pretende desconstituir sentença que julgou parcialmente procedente ação adjudicatória de imóvel, objeto de contrato de compra e venda.

2.Recurso especial interposto em: 10/11/2016; conclusos ao gabinete em: 20/12/2017; aplicação do CPC/15.

3.A correção de vícios por meio da ação rescisória é medida excepcional, cabível nos limites das hipóteses taxativas de rescindibilidade previstas no art. 485 do CPC/73, em homenagem à proteção constitucional à coisa julgada e ao princípio da segurança jurídica. Precedente.

4.Como se trata de via processual própria para a desconstituição da coisa julgada, que corresponde à preclusão máxima do sistema processual, o exaurimento de instância no processo rescindendo não é um dos pressupostos para a ação rescisória, tampouco a preclusão consumativa é obstáculo ao seu processamento. Precedente.

5.Ainda que, na hipótese concreta, a requerente não tenha interposto apelação da sentença rescindenda – que, julgou antecipadamente a lide e indeferiu a produção de prova por ela requerida –, essa circunstância, por si mesma, não representa óbice ao cabimento da ação rescisória.

6.A rescisória fundada no art. 485, V, do CPC/73, pressupõe a demonstração clara e inequívoca de que a decisão de mérito impugnada contrariou a literalidade do dispositivo legal suscitado, atribuindo-lhe interpretação jurídica absurda, teratológica ou insustentável, não alcançando a reapreciação de provas ou a análise da correção da interpretação de matéria probatória.

7.A indicação do dispositivo de lei violado é ônus do requerente, haja vista constituir a causa de pedir da ação rescisória, vinculando, assim, o exercício da jurisdição pelo órgão competente para sua apreciação.

8.Não é possível ao Tribunal, a pretexto da iniciativa do autor, reexaminar toda a decisão rescindenda, para verificar se nela haveria outras violações à lei não alegadas pelo demandante, mesmo que se trate de questão de ordem pública.

9.O juiz é o destinatário final das provas, a quem cabe avaliar sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento fundamentado das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em juízo cuja revisão demanda a reapreciação do conjunto fático dos autos. Precedentes.

10.Na hipótese dos autos, o juízo rescindente promovido pelo Tribunal de origem ultrapassou os limites das causas de pedir deduzidas pelo autor na presente ação rescisória, além de não ter observado que o indeferimento da produção probatória e o julgamento antecipado da lide foi devidamente fundamentado.

11.O acolhimento da pretensão de desconstituição da sentença transitada em julgado acarretou, portanto, a utilização da ação rescisória como sucedâneo recursal.

12.Recurso especial provido.

(STJ - RECURSO ESPECIAL Nº 1.663.326 - RN (2017/0067009-6) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE : TDC DISTRIBUIDORA DE COMBUSTIVEIS S.A ADVOGADOS : EDGLAY DOMINGUES BEZERRA - PB009999 ANNE KARINE GUIMARÃES DE SOUTO MAIOR MELO - PE017503 JOSÉ EVANDRO LACERDA ZARANZA FILHO E OUTRO(S) - RN003850 MARCELO VIEIRA FERNANDES - PE022289 CLEHILTON DA SILVA FRANÇA NETO - PE031093 JOSÉ DE CASTRO MEIRA - DF042503 FELIPE ARNT AMENO - RN014536 RECORRIDO : S.R MEDEIROS E CIA LTDA ADVOGADOS : FELIPE AUGUSTO CORTEZ MEIRA DE MEDEIROS - RN003640 RENATA DANTAS COSTA BORGES DE MELLO E OUTRO(S) - RN004107. Data do Julgamento: 11/02/2020)

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Justiça mantém condenação por calúnia em vídeo nas redes sociais

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Em decisão unânime, a 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve decisão da juíza Flávia de Cassia Gonzales de Oliveira, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Piracicaba, que condenou réu por calúnia contra funcionário público por meio de vídeo disponibilizado em redes sociais. A pena foi fixada em nove meses e dez dias, de serviços à comunidade, bem como pagamento de 14 dias-multa.