Contrato desobriga locadora de imóvel de indenizar locatário

Data:

Inquilino exigia que dona do imóvel emitisse alvará de funcionamento comercial

Contrato de Locação
Créditos: Michał Chodyra / iStock

Um inquilino que deixou de regularizar os documentos antes da entrega do imóvel comercial à proprietária teve seu pedido de indenização a título de danos materiais negado pela Justiça.

A Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve decisão da Comarca de Betim (MG), levando em conta cláusula contratual que dispensa a locadora desse encargo.

Segundo o inquilino, o empreendimento seria uma loja de vendas de roupas. Ele alegou que, em se tratando de prédio de uso coletivo, a dona do imóvel tinha o dever de garantir a adequação do espaço para a instalação de seu comércio. Entretanto, ele devolveu o bem imóvel com pendências na licença de funcionamento e no auto de vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB).

O juiz de direito Robert Lopes de Almeida, da 5ª Vara Cível da Comarca de Betim, considerou que a não regularização dos documentos pela proprietária não isentam aquele que aluga da responsabilidade de providenciar a documentação necessária para a realização de suas atividades no espaço, ou seja, obter o alvará de licença e funcionamento.

O responsável pelo aluguel apelou ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), sustentando que era obrigação da proprietária fornecer o imóvel em condições de uso comercial, com documentos como o AVCB e as exigências municipais e autorizações para o funcionamento em dia.

Para o relator, desembargador Evandro Lopes da Costa Teixeira, está explícita no contrato de locação cláusula que isenta a locadora da responsabilidade pela obtenção de alvará e licença.

Desta forma, o comerciante, antes de alugar, tem a obrigação de verificar previamente as condições gerais do imóvel, no que diz respeito à regularização perante os órgãos públicos.

No entendimento do magistrado, a pessoa que deseja alugar o espaço pode ser responsabilizada pela expedição de alvará para a instalação da loja, sendo assim, é indevida a pretensão de receber indenização.

Os desembargadores Aparecida Grossi e Amauri Pinto Ferreira votaram de acordo com o relator.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0027.12.035590-7/002 – Acórdão (inteiro teor para download)

(Com informações do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG)

Inteiro teor do acórdão:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL — CONTRATO DE LOCAÇÃO – LICENÇA DE FUNCIONAMENTO ESTABELECIMENTO COMERCIAL – RESPONSABILIDADE DO LOCATÁRIO – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS – AUSÊNCIA DE PROVA DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR

– Embora a entrega do imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina constitua obrigação legal do locador (art. 22, I, da Lei nº 8.245/91), este não se responsabiliza pela obtenção de licença ou alvará necessário ao exercício da atividade comercial do locatário, mormente quando há expressa previsão contratual nesse sentido.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0027.12.035590-7/002 – COMARCA DE BETIM – APELANTE(S): WALNEY HONORIO GONÇALVES – APELADO(A)(S): ERLINDA MARIA SILVA

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA

RELATOR.

DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA (RELATOR)

V O T O

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença de ff. 158/159 que, na ação de indenização por danos materiais ajuizada por WALNEY HONÓRIO GONÇALVES em face de ERLINDA MARIA SILVA, julgou improcedente o pedido inicial e condenou o autor ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00, suspendendo a exigibilidade de tais verbas por ser ele beneficiário da justiça gratuita.

Em suas razões recursais (ff. 165/180), a parte autora pede a reforma da sentença, ao argumento de que cabia ao locador entregar o imóvel para locação em estado de servir ao uso a que se destina, sobretudo quanto à licença pelo corpo de bombeiros e AVCB, destacando que em qualquer locação comercial, quanto mais em um prédio destinado a uso coletivo, o fornecimento do projeto de prevenção e combate de incêndio, sem se olvidar das exigências municipais e o cumprimento de todos os requisitos para sua destinação. Afirma que as testemunhas demonstraram a culpa exclusiva do apelado e o dano moral sofrido que extrapola os meros aborrecimentos. Pede, ainda, a indenização por danos materiais.

Contrarrazões às ff. 182/191.

DA INCIDÊNCIA DO NOVO CPC

De início, registro que já está em vigor o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e, considerando que a sentença foi proferida e publicada em sua vigência, é este o código a ser observado no caso.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

PRELIMINARES

Não há preliminares a serem enfrentadas.

MÉRITO

A Lei nº 8.245/91, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos, prevê, em seu art. 22, inciso I, a obrigação do locador em entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina.

No presente caso, o imóvel locado destinava-se ao funcionamento de loja de venda de roupas, conforme se vê do contrato de locação celebrado entre as partes (ff. 9/13).

Nesse contexto, a apelada tinha o dever legal de garantir ao locatário a adequação do imóvel ao fim para o qual foi alugado, isto é, a instalação de uma loja de roupas. No entanto, tal fato não exonera o locatário de tomar as medidas necessárias para o desenvolvimento de suas atividades, dentre elas, obter o alvará de licença e funcionamento.

Com efeito, no próprio contrato de locação, há cláusula que exime o locador da responsabilidade pela obtenção de qualquer tipo de alvará e licença, conforme se verifica pela leitura da cláusula denominada FINALIDADE.

Ora, o locatário-comerciante, antes de alugar um imóvel para desenvolver seu empreendimento, tem a obrigação de verificar previamente as condições gerias não só do prédio em si, mas especialmente no que diz respeito para regularização perante os órgão públicos, sendo, portanto, indevida a pretensão inicial.

Assim, a meu ver, a apelada não pode ser responsabilizada pelo eventual indeferimento da expedição de alvará para a instalação da loja.

Nesse sentido:

Na hipótese de locação de imóvel comercial, salvo disposição contratual em sentido contrário, a obrigação do locador restringe-se tão somente à higidez e à compatibilidade do imóvel ao uso comercial e não abrange a adaptação do bem às peculiaridades da atividade a ser explorada pelo locatário ou mesmo o dever de diligenciar perante os órgãos públicos para obter alvará de funcionamento ou qualquer outra licença necessária ao desenvolvimento do negócio. A extensão do dever do locador em entregar imóvel compatível com a destinação é aferida considerando-se o objetivo do uso, ou seja, a depender da modalidade de locação, se residencial, para temporada ou comercial (art. 22, I, da Lei n. 8.245/1991). Compete ao locatário a análise das características particulares que o bem deve apresentar para a instalação do empreendimento, bem como verificar se o imóvel e sua documentação estão regularizados e aptos à instalação pretendida, pois é o locatário quem detém o essencial conhecimento a respeito da atividade que será desenvolvida. Em outras palavras, é obrigação do locatário examinar previamente a aptidão do bem conforme o negócio a ser realizado, inclusive os documentos do imóvel para viabilizar a obtenção de licenças, que são imprescindíveis ao exercício de qualquer atividade comercial. Na hipótese de locação comercial, salvo disposição contratual em sentido contrário, o comando legal não impõe ao locador o encargo de adaptar o imóvel às peculiaridades da atividade a ser explorada, ou mesmo diligenciar junto aos órgãos públicos para obter alvará de funcionamento ou qualquer outra licença necessária ao desenvolvimento do negócio. Aliás, a permissão para o exercício de atividades industriais e comerciais é ônus que recai sobre aqueles que almejam desempenhar tais atividades, pois é fato estranho à relação locatícia e implicaria desestímulo à locação comercial. Por outro lado, os deveres anexos à boa-fé, especialmente os deveres de informação, cooperação, lealdade e probidade, exigíveis das partes na execução dos contratos, impõem ao locador uma conduta colaborativa, no sentido de fornecer ao locatário os documentos e as informações necessárias à implementação da atividade no imóvel objeto da locação. Ademais, à luz do disposto no art. 22, I, da Lei n. 8.245/1991, o impedimento de exploração do imóvel locado por falta de regularidade do bem perante os órgãos públicos não está inserida na esfera de obrigações do locador, ou seja, é fato imputável exclusivamente ao locatário. REsp 1.317.731-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 26/4/2016, DJe 11/5/2016.

PROCESSUAL CIVIL. INÉPCIA DA INICIAL. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTRATO DE LOCAÇÃO. ENCARGOS LOCATÍCIOS. RECONVENÇÃO. IPTU. RECURSOS DE APELAÇÃO CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. I – A ausência de indicação das normas jurídicas que embasam o pedido não implica a inépcia da inicial, porquanto fundamento jurídico não se confunde com fundamento legal, o qual, em decorrência do princípio iura novit curia (o juiz conhece o direito), não se apresenta como requisito da petição inicial. II – O julgamento antecipado da lide é possível, desde que dispensável a dilação probatória para o deslinde da questão litigiosa. III – Não há falar-se cerceamento de defesa, quando as provas pretendidas pela parte não se mostrarem aptas a influenciar a formação do convencimento do Juiz. IV – Embora a entrega do imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina constitua obrigação legal do locador (art. 22, I, da Lei nº 8.245/91), este não se responsabiliza pela obtenção de licença ou alvará necessário ao exercício da atividade comercial do locatário, mormente quando há expressa previsão contratual nesse sentido. V – Comprovada a inadimplência do locatário, o locador faz jus ao recebimento das quantias relativas aos aluguéis e demais encargos locatícios em atraso. VI – Ausente a demonstração da ilegalidade na cobrança do IPTU incidente sobre o imóvel locado, não merece prosperar o pedido reconvencional de pagamento de indenização pelos prejuízos decorrentes da cobrança do encargo locatício.

V.v.p. O IPTU a ser cobrado deve ser apenas o correspondente ao imóvel locado, excluída a cobrança do imposto sobre outros imóveis. (TJMG – Apelação Cível 1.0024.05.782092-0/001, Relator(a): Des.(a) Bitencourt Marcondes , 15ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/07/2008, publicação da súmula em 20/08/2008)

“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RECISÃO CONTRATUAL C/C COM INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL. IMÓVEL DESTINADO A EXPLORAÇÃO ECONÔMICA DA PARTE AUTORA. FALTA DE DILIGÊNCIA DO LOCATÁRIO QUANTO A VERIFICAÇÃO DE REGULARIZAÇÃO DO IMÓVEL JUNTO À PREFEITURA COMPETENTE, A FIM DE PERMITIR A IMPLEMENTAÇÃO DE SUA ATIVIDADE COMERCIAL. O LOCADOR NÃO PODE SER RESPONSABILIZADO PELO INDEFERIMENTO DA EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ MUNICIPAL PARA INSTALAÇÃO DO EMPREENDIMENTO DO LOCATÁRIO. SENTENÇA MANTIDA”. (STJ – REsp 299154 / MG. 6ª Turma. Relator Ministro VICENTE LEAL. DJ 15.10.2001)

“EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E LUCROS CESSANTES. CONTRATO DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. NÃO CONCESSÃO DE ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO PELA MUNICIPALIDADE.

É inadmissível a pretensão do locatário de atribuir ao locador a responsabilidade pela obtenção de alvará junto à prefeitura para regulamentar a atividade comercial. (TJRS – Apelação Cível nº 70013282488. 15ª CC. Rel. DES. ANGELO MARANINCHI GIANNAKOS. Julg. 05.06.2006).

Cabe registrar que as cláusulas contratuais não deixam dúvidas em relação à entrega do imóvel ao locatário em perfeitas condições de uso, tendo este aderido livremente ao contrato de locação, e somente após a negativa da licença/alvará de funcionamento, é que alegou a existência de vício no negócio.

POSTO ISSO, nego provimento ao recurso.

Em razão do que restou decido, e em observância ao que dispõe o § 11 do art. 85 do novo CPC, majoro os honorários de advogado, fixando-os em R$ 2.000,00, ficando suspensa a exigibilidade de tal verba por ser o autor beneficiário da justiça gratuita.

DESA. APARECIDA GROSSI – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. AMAURI PINTO FERREIRA – De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.”

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