Nas hipóteses de crimes tributários em desfavor de municípios ou estados, a configuração de grave dano à coletividade – prevista no artigo 12, inciso I, da Lei 8.137/1990 – depende da classificação do crédito, pela Fazenda Pública local, como prioritário, ou, ainda, que o crédito seja destacado como de grande devedor. Essa aferição deve levar em conta o valor total devido, incluídos os acréscimos legais.
A tese foi fixada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos. Como consequência, o colegiado afastou o agravamento da pena de um empresário de Santa Catarina pela caracterização de grave dano à sociedade. Com a redução da pena, o colegiado ainda decretou a prescrição da pretensão punitiva estatal.
Nos termos do artigo 12, inciso I, da Lei 8.137/1990, o grave dano à coletividade é circunstância que aumenta de um terço até a metade a pena por crime contra a ordem tributária.
Segundo o processo, o empresário teria escriturado documentos fiscais fraudulentos, que não correspondiam à efetiva entrada de mercadorias em seu estabelecimento. Com isso, ele teria se apropriado indevidamente de créditos de ICMS. O valor sonegado seria de cerca de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) – com juros e multa, o montante chegava a aproximadamente R$ 625.000,00 (seiscentos e vinte e cinco mil reais).
Em primeiro grau, o juiz condenou o empresário a 3 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto, incluindo nesse total a elevação de um terço da pena pela configuração de grave dano à coletividade. A pena restritiva de liberdade foi substituída por duas restritivas de direito, entre elas o pagamento de 50 salários mínimos – valor posteriormente reduzido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) para 20 salários mínimos.
Em relação à incidência da majorante do artigo 12, inciso I, da Lei 8.137/1990, o TJSC entendeu que o valor total sonegado era suficiente para caracterizar o grave dano social.
O relator do recurso especial do empresário, ministro Nefi Cordeiro, destacou que o grave dano à coletividade exige a ponderação de situação anormal, que justifique a determinação de agravamento da sanção criminal. No caso de tributos federais, o ministro considerou razoável a adoção do patamar de R$ 1 milhão em débitos, nos termos do artigo 14 da Portaria 320/2008 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – que considera essa referência para a definição de devedores cujos processos terão tratamento prioritário por parte dos procuradores.
"Esse patamar, que administrativamente já indica especial atenção a grandes devedores, é razoável para determinar a incidência de desvalor penal também especial. Claro que esse delimitador, como demonstrador do especial interesse tributário federal, será também na esfera criminal reservado como critério à sonegação de tributos da União", disse o relator.
Em se tratando de tributos estaduais ou municipais, Nefi Cordeiro afirmou que, por equivalência, o critério para caracterização do grave dano à coletividade deve ser aquele definido como prioritário pela Fazenda local.
A Terceira Seção, acompanhando o voto do relator, definiu também que – a despeito de haver precedente em sentido contrário – o valor considerado para a aferição do grave dano à coletividade deve ser a soma dos tributos sonegados com os juros, as multas e outros acréscimos legais.
No caso dos autos, relativo à sonegação de ICMS em Santa Catarina, Nefi Cordeiro ressaltou que a legislação local não prevê prioridade de créditos, porém define como grande devedor o sujeito passivo cuja soma dos débitos seja igual ou superior a R$ 1 milhão.
"Na espécie, o valor sonegado relativo a ICMS – R$ 207.011,50 – alcança o valor de R$ 625.464,67 com multa e juros, o que não atinge o patamar diferenciado de dívida tributária acolhido pela Fazenda estadual catarinense e, assim, não se torna, tampouco, apto a caracterizar o grave dano à coletividade do artigo 12, I, da Lei 8.137/1990", concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial do empresário.
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