Com o entendimento de que houve vício no serviço prestado o juiz da 2ª Vara Cível de Brasília decidiu que a Anhanguera Educacional Participações, por não disponibilizar as atualizações legislativas em curso de pós-graduação, deve indenizar uma aluna.
Consta nos autos do processo (0728123-94.2020.8.07.0001), que a autora firmou contrato com a ré para curso de pós-graduação em direito penal e processo penal, na modalidade de ensino a distância, com início previsto para outubro de 2019. Segundo ela o curso estava desatualizado, visto que não ofertava a legislação do Pacote Anticrime e as alterações no CTB, ECA e Lei de Drogas. Conta que pediu a rescisão do contrato, o que foi negado pela ré. Agora, requer, além da indenização por dano moral, a restituição em dobro do valor pago.
A instituição de ensino afirma que o Pacote Anticrime, por exemplo, entrou em vigor em janeiro de 2020 e que os materiais da pós-graduação foram atualizados no mês de fevereiro. Assevera que não praticou ato ilícito e que não há dano moral a ser indenizado.
O Juiz destacou que as reclamações acerca da desatualização começaram em janeiro de 2020 e se estenderam até agosto e não havendo comprovação de que as aulas atualizadas foram disponibilizadas. Para ele, houve vício no serviço e está configurado o dano moral, uma vez que a “contratação de prestação de serviço de educação de pós-graduação, sobretudo na seara do direito, imbui a legítima expectativa de que seu conteúdo esteja atualizado com inovações legislativas, quando menos das leis dos anos de 2016 e 2017”, pontuou.
O magistrado lembrou que a faculdade agiu com negligência para solucionar o problema, mesmo diante dos pedidos da autora. Segundo ele: “A parte teve de despender tempo estudando o conteúdo desatualizado, já que as provas e avaliações virtuais eram elaboradas conforme o material disponibilizado”. Nessa caso, surge a teoria do desvio produtivo do consumidor ou da perda do tempo livre ou ainda da perda do tempo útil, caracterizada na jurisprudência, quando “a busca por solução de problema, não provocado pelo consumidor, represente verdadeiro calvário; ou quando os procedimentos para solução destes problemas privem tempo relevante do consumidor”, explicou.
Quanto ao pedido de repetição de indébito, o magistrado entendeu que não deve ser acolhido, uma vez que não houve cobrança indevida. “Ainda que se argumente pela deficiência do serviço – algumas aulas/materiais desatualizados –, não se enquadra como pagamento indevido, na medida em que a parte requerente cursou todas as disciplinas e obteve aprovação no curso”, ressaltou.
Dessa forma, a Anhanguera Educacional foi condenada a pagar a autora a quantia de R$ 10 mil a título de danos morais. Já o pedido de repetição de indébito em dobro foi julgado improcedente.
Para o advogado Marcos Dessaune, autor da tese do desvio produtivo, “a decisão é muito boa e aplica corretamente a Teoria. Minha única observação é quanto a uma nomenclatura inadequada que vem se disseminando pelo Brasil, sem que haja o correspondente respaldo científico ou doutrinário. Enquanto bem jurídico, entendo que não se deva classificar o tempo de ‘útil’, pois isso implicaria reconhecer que existe um tempo ‘inútil’ na vida humana. Penso que também não se deva denominá-lo de ‘livre’, pois alguém poderá alegar, ainda que falaciosamente, que se trata de um tempo ‘de pouca importância’. Aliás, rigorosamente falando não existe tempo ‘livre’ em nossas vidas. Ele é sempre ‘ocupado’, do ócio ao negócio. Portanto é mais adequado chamar esse relevante valor jurídico de ‘tempo vital ou existencial’, como o denomino na Teoria aprofundada do desvio produtivo do consumidor, que é a tese mundialmente pioneira no estudo dessa temática”.
Com informações do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.
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