IA generativa e a nova fronteira dos Direitos Autorais

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IA generativa e a nova fronteira dos Direitos Autorais | Juristas
Amanda Dias Luz, Advogada do Entretenimento no escritório DMS Advogados. Cláudio Roberto Santos, Advogado. Sócio-fundador do escritório DMS Advogados.

A Inteligência Artificial Generativa (IAG) é uma das mais fascinantes fronteiras da tecnologia moderna. Ao contrário das formas tradicionais de IA, que são programadas para responder a estímulos de maneira específica, a IAG aprende de um conjunto de dados e, em seguida, usa esse aprendizado para criar conteúdo novo e original. Essa capacidade é alcançada através de técnicas como redes neurais, aprendizado de máquina supervisionado e não supervisionado, e aprendizado por reforço.

As aplicações da IAG são vastas e variadas. Na arte, por exemplo, programas de IAG podem gerar pinturas que imitam estilos de artistas famosos ou até criar estilos completamente novos. Na música, IAGs podem compor peças que vão desde melodias clássicas até pop moderno. No campo do design, a IAG auxilia na criação de produtos inovadores e soluções arquitetônicas. Na escrita, ferramentas de IAG são utilizadas para gerar textos, desde artigos jornalísticos até roteiros de filmes.

Posto a definição e as aplicações, destaque-se que a ascensão da IAG apresenta desafios únicos para o campo dos direitos autorais. Tradicionalmente, os direitos autorais protegem a expressão criativa humana. No entanto, quando uma obra de arte, música ou texto é gerada por uma IA, surge a pergunta: quem detém os direitos autorais? É o criador da IA, o usuário que forneceu os dados iniciais ou a própria IA?

Em muitos casos, as leis atuais de direitos autorais não estão preparadas para lidar com essas questões. Por exemplo, se uma IA cria uma peça musical que soa semelhante a uma obra protegida por direitos autorais, isso constitui uma infração? Até que ponto a IAG “aprende” de exemplos existentes e em que momento começa a criar algo genuinamente novo e original?

A resposta a essas perguntas não é simples e varia de acordo com a jurisdição. Alguns argumentam que a IAG não pode ser autora, pois falta-lhe a intencionalidade e a consciência que caracterizam a criação humana, como ocorre na legislação brasileira. Outros sugerem novas formas de direitos autorais, adaptadas para reconhecer a contribuição tanto dos desenvolvedores da IA quanto da própria tecnologia.

Ao analisar os termos de uso de ferramentas como a Midjourney, por exemplo, observamos que ao utilizar seus serviços, o usuário concede à Midjourney uma licença perpétua, mundial, não exclusiva, sublicenciável, gratuita, isenta de royalties e irrevogável para reproduzir, preparar trabalhos derivados, exibir e distribuir as solicitações de texto e imagem inseridas nos serviços ou ativos produzidos pelo serviço. Isso destaca
uma questão importante: a propriedade intelectual das obras geradas por IA muitas vezes fica nas mãos da empresa que fornece o serviço, e não do indivíduo que criou a entrada original. Além disso, os usuários que não são membros pagos não possuem os ativos que criam, mas recebem uma licença sob a Licença Creative Commons Noncommercial 4.0 Attribution International para esses ativos.

Já nos termos de uso do Adobe Firefly, ferramenta de IA generativa da Adobe, há previsão diversa, inclusive informam que o conteúdo produzido pelos clientes não será utilizado para treinamento do Firefly, salvo se o cliente optar por disponibilizar seu conteúdo no Adobe Stock voluntariamente e de acordo com os termos de uso desta ferramenta. O Adobe Stock é a base de dados utilizada pela Adobe para treinar o Firefly.

As implicações legais e éticas são profundas. Por exemplo, o Projeto de Lei nº 2338, que visa regular o uso e desenvolvimento de IA no Brasil, estabelece que a utilização automatizada de obras em processos de mineração de dados e textos em sistemas de IA não constitui ofensa aos direitos autorais, desde que respeite certos critérios legais. Isso sugere uma tentativa de equilibrar a inovação tecnológica com a proteção dos direitos autorais, mas também levanta questões éticas sobre a originalidade e a autoria.

O futuro dessa relação parece estar em direção a uma maior complexidade. Com a evolução da tecnologia, as leis de direitos autorais podem precisar ser reformuladas para abordar melhor as questões de autoria e propriedade no contexto da IA. Isso pode incluir novas formas de licenciamento e reconhecimento de direitos autorais que considerem tanto o papel dos desenvolvedores da IA quanto a contribuição da própria tecnologia.

Além do questionamento sobre quem deve ser reconhecido como autor e detentor dos direitos quando a criação envolve a participação significativa da IA, outros desafios são enfrentados pelos artistas. A IA pode analisar grandes volumes de dados e identificar semelhanças, com isto pode aumentar os casos de plágio e uso indevido de obras autorais, também dificulta o rastreamento e a proteção efetiva destas obras.

A disseminação da IA gera um questionamento quanto à remuneração nestes casos já que a comercialização e distribuição automatizadas devem ser distribuídas entre o criador humano e os algoritmos envolvidos na criação, sendo muito importante garantir a comprovação de autoria mesmo em casos de parceria com os algoritmos.

Questões éticas são levantadas sobre o mérito artístico e a originalidade das obras produzidas; movimentos foram criados a fim de valorizar a produção humana. Muitos artistas estavam se sentindo desvalorizados ou até subestimados com a substituição da mão de obra humana pelos algoritmos. Há autores reivindicando o direito autoral de suas imagens e obras perante a justiça para que não sejam utilizadas por empresas desenvolvedoras de IA em seus treinamentos.

No Brasil, pesquisas mostram que o uso da IA no processo criativo na indústria da música, apesar das inseguranças quanto ao risco para os artistas, tem tido uma recepção positiva. Especialmente na produção e edição, visto que recursos de IA são muito úteis nestes processos, como por exemplo para recuperação de gravações antigas. Na indústria fonográfica, após a greve de roteiristas e atores de Hollywood, os dubladores brasileiros iniciaram um movimento chamado “Dublagem Viva”, que busca a regulamentação do uso da inteligência artificial em dublagens de séries, filmes, animações e jogos de videogame, para que não ocorra a substituição da produção humana pela tecnologia gerando um aumento do desemprego.

Em resposta a esses desafios, é recomendável que o Brasil elabore o quanto antes diretrizes claras que estabeleçam os limites da utilização de obras protegidas por direitos autorais no treinamento de IA ao mesmo tempo que preveja a proteção dos direitos autorais para obras criadas por essas ferramentas.

Deve-se levar em consideração que a criação de uma obra através da IA envolve também o usuário, o programador e o próprio programa, não sendo clara a definição de autoria, sendo necessária uma análise da medida de interferência humana para se configurar este direito. E o questionamento que fica é, a IA generativa será tratada como uma possível substituidora do fator humano? Ou tão somente mais uma aliada, uma ferramenta?

Autoria:

Amanda Dias Luz, Advogada do Entretenimento no escritório DMS Advogados. Graduada em Direito pela Faculdade Metodista Granbery. Pós-graduada em Direito Público pela Puc Minas e Pós-graduada em Transformação Digital e inovações pela BBi of Chicago. Produtora Cultural, especialista em Advocacia Consultiva e criatividade

Cláudio Roberto Santos, Advogado. Sócio-fundador do escritório DMS Advogados. Doutorando em Teoria do Direito e Direito Constitucional (PUC Rio). Mestre em Direito Privado (PUC Minas). Professor universitário.


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Claudio Roberto Santos
Claudio Roberto Santos
Advogado, Doutorando em Teoria do Direito e Direito Constitucional e Mestre em Direito Privado (PUC Minas). Professor universitário

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