Impedimento do ajuizamento da execução fiscal após o depósito preparatório do art. 38 da Lei de Execução Fiscal (LEF)

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Neste breve texto nos ocuparemos do ajuizamento da execução fiscal após o depósito prévio do Art. 38 da Lei de Execução Fiscal (LEF).

A possibilidade de discussão judicial da dívida ativa da Fazenda Pública está tratada no art. 38 da Lei de Execução Fiscal (LEF). De acordo com esse artigo, a aludida discussão deve ser realizada, como regra, no curso do processo de execução. Excepcionalmente, admite-se que ocorra discussão judicial da dívida ativa da Fazenda Pública nos processos de mandado de segurança, nas demandas de repetição do indébito ou nas ações anulatórias de declarativo da dívida.

Nesta hipótese, segundo a LEF, a discussão estaria condicionada à realização de depósito preparatório do valor do débito, devidamente corrigido.

Nesse mesmo contexto, o legislador assinalou que a propositura de demandas dessa natureza, objetivando a discussão judicial da dívida ativa, implica renúncia ao direito de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso eventualmente já interposto.

Sobre esse tema, convém pontuar que o oferecimento de depósito prévio, na forma de garantia, configura hipótese de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, conforme assinalado no art. 151 do Código Tributário Nacional. Com efeito, o aludido artigo, ressalvados os cumprimentos das obrigações assessórias, estipula que a suspensão da exigibilidade do crédito tributário pode decorrer das seguintes causas: moratória; depósito do seu montante integral; reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; concessão de medida liminar em mandado de segurança; concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; e parcelamento.

Além de servir como meio de suspensão da exigibilidade do crédito tributário o depósito preparatório, indicado no art. 38 da LEF, naturalmente impede a propositura de execução fiscal relativa ao crédito suspenso.

Para fins de suspensão da exigibilidade do crédito e impedimento da propositura da execução o depósito preparatório é medida facultativa, que pode ser tomada pelo contribuinte segundo seu interesse.

Em sentido oposto, o art. 38 da LEF exige a realização do depósito preparatório, como condução para a propositura de demanda judicial. Trata-se, entretanto, de normas materialmente inconstitucional.

Nesse sentido, é correto entender que a exigência legal do depósito preparatório como condição de procedibilidade da propositura da ação anulatória, apontada no citado art. 38 da LEF, afronta o princípio constitucional de acesso à justiça, reconhecido no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.

Assim, revela-se equivocado atribuir ao depósito prévio condição de exigência legal limitativa ao exercício do direito de propor demanda anulatória. Essa interpretação conduz ao reconhecimento da incompatibilidade constitucional do referido artigo.

Será adequado reconhecer, como dito, que a efetivação do depósito preparatório é uma faculdade do contribuinte, cujo exercício enseja a suspensão da exigibilidade do crédito tributário e inibe a propositura de demanda executiva, sem impedir a propositura da ação anulatória.

A respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça, de modo ajustado, com os correspondentes limites, concluiu que o depósito prévio indicado no art. 38 da LEF não constitui condição de procedibilidade da ação anulatória. Entretanto, ponderou a Corte, configura uma faculdade do autor para suspender a exigibilidade do crédito tributário, ante o teor do art. 151 do CTN, e impedir o ajuizamento da execução fiscal. O posicionamento indicado se deu em demanda julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (Tema 241).

O posicionamento consta no seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANULATÓRIA DO CRÉDITO FISCAL. CONDICIONAMENTO AO DEPÓSITO PRÉVIO DO MONTANTE INTEGRAL. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. INOCORRÊNCIA.

  1. A propositura de ação anulatória de débito fiscal não está condicionada à realização do depósito prévio previsto no art. 38 da Lei de Execuções Fiscais, posto não ter sido o referido dispositivo legal recepcionado pela Constituição Federal de 1988, em virtude de incompatibilidade material com o art. 5º, inciso XXXV, verbis: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
  2. "Ação anulatória de débito fiscal. art. 38 da lei 6.830/80. Razoável a interpretação do aresto recorrido no sentido de que não constitui requisito para a propositura da ação anulatória de débito fiscal o depósito previsto no referido artigo. Tal obrigatoriedade ocorre se o sujeito passivo pretender inibir a Fazenda Pública de propor a execução fiscal. Recurso extraordinário não conhecido." (RE 105552, Relator Min. DJACI FALCAO, Segunda Turma, DJ 30-08-1985)
  3. Deveras, o depósito prévio previsto no art. 38, da LEF, não constitui condição de procedibilidade da ação anulatória, mas mera faculdade do autor, para o efeito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151 do CTN, inibindo, dessa forma, o ajuizamento da ação executiva fiscal, consoante a jurisprudência pacífica do E. STJ. (Precedentes do STJ: AgRg nos EDcl no Ag 1107172/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2009, DJe 11/09/2009; REsp 183.969/SP, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/03/2000, DJ 22/05/2000; REsp 60.064/SP, Rel. Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/04/1995, DJ 15/05/1995; REsp 2.772/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/03/1995, DJ 24/04/1995)
  4. O art. 535 do CPC resta incólume se o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
  5. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art.

543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.

(REsp 962.838/BA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 18/12/2009)

Antonio Evangelista de Souza Netto
Antonio Evangelista de Souza Netto
Juiz de Direito Titular de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutorando em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP.

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