O redirecionamento da condenação pela prática de propaganda enganosa, da matriz para a filial, é medida possível, tendo em vista, que ainda que tenham CNPJs diferentes e autonomia administrativa e operacional, as filiais são um desdobramento da matriz, integrando a pessoa jurídica como um todo.
Esse foi o entendimento da 3a. Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao rejeitar o recurso de um posto de combustíveis condenado a veicular contrapropaganda em ação civil pública que investigou a comercialização de produtos de bandeira distinta da anunciada aos clientes.
De acordo com a denúncia, o posto de combustíveis, localizado na cidade de Cuiabá e detentor da bandeira Texaco, comercializaca produtos adquiridos de outras distribuidoras de combustíveis, confundindo os consumidores. A matriz da empresa informou que entrou em recuperação judicial e não tinha como cumprir a determinação para exibir cartazes com a informação de que havia sido condenada por propaganda enganosa.
O juízo responsável pela ação civil pública determinou o cumprimento da sentença pela filial do grupo empresarial localizada na cidade de Várzea Grande, na região metropolitana da capital mato-grossense.
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) manteve a decisão ao rejeitar o recurso de apelação, afirmando que a filial poderia responder, no cumprimento de sentença, pelo ato ilícito praticado pela matriz.
No recurso ao Superior Tribunal de Justiça, a empresa sustentou que não seria possível impor à filial – que não participou do processo principal – a obrigação de divulgar a sentença por meio de banners e cartazes.
Direito do consumidor
Ao analisar o caso, o ministro Villas Bôas Cueva, relator, destacou que o direito do consumidor não se submete ao princípio estrito da territorialidade, como sustentou a recorrente.
“É, aliás, salutar a realização mais ampla possível do direito informacional dos consumidores. Assim, ao se cumprir o comando sentencial em comarca contígua à de Cuiabá, toda a comunidade da região, possivelmente atingida, se beneficiará”, frisou o relator Villas Bôas Cueva.
Ele ressaltou que, não havendo plena extinção da atividade empresarial praticada pela matriz, cabe às filiais assumir a responsabilidade subsidiária, como previsto no parágrafo 2º do artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O ministro Villas Bôas Cueva ainda rejeitou o argumento de que a filial comercializaria combustíveis de bandeira distinta da matriz. “A alegação de que a filial não comercializa a marca Texaco não afasta a sua responsabilidade com relação à idoneidade da postura do grupo econômico como um todo. Desse modo, a filial deve cumprir o comando judicial, de modo a evitar que novas ofensas ao direito consumerista sejam reiteradas”, destacou.
O ministro afirmou que a condenação está atrelada à necessidade de evitar lesões dessa natureza, “não importando a bandeira assumida pelo posto na atualidade”.
Processo: REsp 1655796 – Acórdão (inteiro teor para download)
(Com informações do Superior Tribunal de Justiça – STJ)
Ementa
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROPAGANDA ENGANOSA. POSTO DE GASOLINA. COMBUSTÍVEL. MARCA COMERCIAL. COMERCIALIZAÇÃO. BANDEIRA DIVERSA. MATRIZ E FILIAL. ESTABELECIMENTOS. AUTONOMIA JURÍDICA. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO. PUBLICIDADE ENGANOSA. REDIRECIONAMENTO. POSSIBILIDADE. CONTRAPROPAGANDA. ARTS. 56, INCISO XII, E 60 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DIREITO À INFORMAÇÃO.
1.Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2.Ainda que possuam CNPJ diversos e autonomia administrativa e operacional, as filiais são um desdobramento da matriz por integrar a pessoa jurídica como um todo.
3.Eventual decisão contrária à matriz por atos prejudiciais a consumidores é extensível às filiais.
4.A contrapropaganda visa evitar a nocividade da prática comercial de propaganda enganosa ou abusiva.
5.A existência de dívida ilíquida excepciona o princípio da universalidade do juízo recuperacional.
6.Recurso especial não provido.
(STJ – REsp 1655796/MT, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/02/2020, DJe 20/02/2020)