Decisão do TJSP sobre auxílio-aluguel em casos de violência doméstica gera debate sobre competência jurisdicional

Data:

Lei Maria da Penha
Créditos: lolostock / iStock

Em uma decisão recente, publicada em 15/02, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou um recurso da defesa de uma vítima de violência doméstica, ao determinar que a esfera criminal não é competente para decidir sobre pedidos de medida protetiva de auxílio-aluguel. A defesa buscava que a Vara da Violência Doméstica e Familiar do domicílio da vítima decidisse sobre o pedido, introduzido no Artigo 23, VI, da Lei Maria da Penha em setembro de 2023.

Segundo a decisão da 4ª Câmara, as varas especializadas em violência doméstica e familiar contra a mulher têm competência exclusivamente para questões de natureza criminal. Dessa forma, como o auxílio-aluguel é uma medida de natureza assistencial, cuja competência de pagamento cabe aos estados e municípios, a câmara entendeu que não cabe à vara da violência doméstica decidir sobre o assunto.

A advogada Beatriz Vendramini Rausse, Sócia da Borguezi e Vendramini Advogadas, especialista em direito das mulheres, levanta a questão sobre qual seria o juízo competente para decidir sobre um tema de tamanha importância para as vítimas de violência doméstica.

Decisão do TJSP sobre auxílio-aluguel em casos de violência doméstica gera debate sobre competência jurisdicional | Juristas
Advogada Beatriz Vendramini Rausse, Sócia da Borguezi e Vendramini Advogadas, especialista em direito das mulheres

“A discussão mora justamente aí, estamos tentando entender quem será competente, já que o juiz da vara de violência doméstica e familiar não o é. Tudo o que a decisão esclareceu é de que a seara criminal não é competente para decidir sobre esse pedido de medida protetiva de auxílio-aluguel”.

A advogada explica ainda, que “a Lei Maria da Penha determina, em seu Artigo 14, que os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. E vai além: determina em seu Artigo 23, VI, que poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: conceder à ofendida auxílio-aluguel, com valor fixado em função de sua situação de vulnerabilidade social e econômica, por período não superior a 6 (seis) meses. Ou seja, pela interpretação dos dois artigos chega-se a conclusão de que o juiz da vara de violência doméstica e familiar, quando ela existir, pois não são todos os fóruns que possuem essa vara, será competente para apreciação dos pedidos de medida protetiva de auxílio-aluguel”, esclarece.

“O juiz da Fazenda Pública tem competência para julgar todas as causas cíveis em que figurem como parte o estado e os municípios. Então, considerando que quem vai pagar o auxílio-aluguel é o estado, até que faz sentido, em uma análise preliminar, que o pedido de auxílio-aluguel seja protocolado na Vara da Fazenda Pública”, esclarece.

Na visão da especialista, o pedido em questão não é apenas por auxílio-aluguel, mas sim por uma medida protetiva desencadeada por violência doméstica, destacando sua natureza de gênero, dado que afeta mais mulheres. A Lei Maria da Penha estabelece juizados especializados em violência doméstica e familiar contra a mulher, capacitados para lidar com questões relacionadas a esse fenômeno, tanto cíveis quanto criminais.

E continua: “com a devida vênia ao decidido, entendemos que o Juiz da Fazenda Pública não teria competência, pois mesmo que o pedido envolva o estado, por ser essa uma matéria mais específica, ela atrai a competência para o juiz específico que lida com a matéria de violência doméstica. No entanto, mesmo que se entenda que a Vara da Fazenda Pública é competente, espera-se que seja capacitada para atender tais casos tendo em vista os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, que determinam que todos os agentes de justiça devam ser capacitados para atuar em causas envolvendo violência contra as mulheres, bem como o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ que obrigou todo o Poder Judiciário a julgar com perspectiva de gênero”, conclui.

Com informações da assessoria.


Você sabia que o Portal Juristas está no FacebookTwitterInstagramTelegramWhatsAppGoogle News e Linkedin? Siga-nos!

Ricardo Krusty
Ricardo Krusty
Comunicador social com formação em jornalismo e radialismo, pós-graduado em cinema pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Justiça catarinense confirma possibilidade de penhora de bens comuns do casal em ação de execução

A penhora sobre os bens comuns do casal no regime de comunhão universal de bens é juridicamente viável, desde que a meação do cônjuge não devedor seja devidamente preservada, conforme determina o artigo 1.667 do Código Civil, observando as exceções previstas no artigo 1.668.

Digital Influencer será indenizado após suspensão injustificada de conta no TikTok

A suspensão arbitrária de um perfil em rede social configura falha na prestação de serviço, especialmente quando a conta é utilizada como fonte de renda. Caso a plataforma não comprove a violação dos termos de uso, pode ser condenada à reativação do perfil e ao pagamento de indenização por danos morais.

Justiça exige maior rigor de multinacional para combater golpes virtuais durante Black Friday

O juízo da 2ª Vara Cível da comarca de Brusque determinou que uma multinacional de anúncios digitais adote medidas imediatas para prevenir o uso de sua plataforma em golpes virtuais. A decisão, proferida em 25 de novembro de 2024, obriga a empresa a bloquear anúncios que utilizem indevidamente o nome e a imagem de uma rede de lojas de departamentos e de seu proprietário, salvo os provenientes de perfis verificados e oficiais.

TJ aplica Protocolo de Gênero e condena ex-marido a indenizar mulher por ofensas em rede social

Em decisão inédita, a 4ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) aplicou o Protocolo de Gênero, conforme previsto na Resolução nº 492/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em julgamento realizado no dia 28 de novembro. O caso envolveu recurso interposto por uma mulher contra o ex-marido, abordando temas como dissolução de união estável, partilha de bens, guarda de menor, pensão alimentícia e indenização por danos morais.