A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve parte da sentença que julgou procedente a acusação e condenou pai e filho, respectivamente, proprietário e administrador de uma fazenda em Mato Grosso (MT) por manterem 21 seringueiros em condições análogas às de escravo (art. 149 do Código Penal).
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF) os seringueiros não recebiam remuneração devida, dormiam sobre tábuas em barracos de lona e madeira e alimentavam-se precariamente, consumindo água insalubre e dividindo o ambiente com animais peçonhentos. Viviam sem quaisquer condições de higiene, distantes por vários quilômetros dos locais de origem. Foram observadas também: irregularidades no registro funcional; discriminação das seringueiras (mulheres consideradas apenas ajudantes dos maridos, embora também trabalhassem na extração do látex) e servidão por dívida (sistema “truck sistem”).
Além disso, os trabalhadores não tinham equipamentos de proteção necessários às atividades que exerciam nos seringais, chegando ao ponto, inclusive, de levar materiais tóxicos para serem armazenados onde moravam com suas famílias, conforme o MPF.
No recurso ao TRF1 os réus pediram absolvição nos termos do artigo 386, III, do Código de Processo Penal (CPP), com reconhecimento da atipicidade dos fatos. Argumentaram os recorrentes não ter havido comprovação de cerceio de ir e vir, de restrição ao poder de reação ou ainda de opressão que impedisse os trabalhadores de deixar o local de trabalho e ser inexistente o elemento subjetivo (dolo), pois teriam adquirido a propriedade rural sem alterar as práticas de trabalho anteriormente adotadas, não tendo a intenção deliberada, livre e consciente de reduzir os seringueiros à condição análoga à de escravo.
Segundo o relator do processo (001448555.2010.4.01.3600), juiz federal convocado Pablo Zuniga Dourado, os seringueiros foram sujeitados a condições degradantes de trabalho na fazenda destinada à extração de borracha pertencente ao pai acusado, beneficiário final dos lucros, e administrada principalmente pelo seu filho, também alvo da investigação e responsabilizado pelo crime. A sujeição teria permanecido no período entre 2005 e 2009.
No voto, o magistrado convocado salientou que é firme a jurisprudência no sentido de que o crime é de ação múltipla e conteúdo variado. “Independe da restrição à liberdade de locomoção da vítima, que, após a alteração do dispositivo penal pela Lei 10.803/2003, passou a ser apenas mais uma das modalidades de configuração do delito”, afirmou.
“A conduta de submeter trabalhadores, sem registro funcional, a condições degradantes de trabalho, tais como ausência de equipamento de proteção individual (EPI) para a extrair o látex das seringueiras e aplicação de agrotóxicos que, inclusive, ficavam armazenados em seus alojamentos sem nenhuma proteção, ausência de instalação sanitária no local de trabalho, moradias precárias, falta ou dificuldade de acesso à água potável, bem como o pagamento dos salários por vezes inferiores ao mínimo e pela via de cheques nominais de outra praça, configura o tipo penal de redução à condição análoga à de escravo (art. 149, CP), cuja materialidade é comprovada pelo Relatório de Fiscalização do Ministério do Trabalho e pela prova testemunhal”, destacou.
Reformada a sentença tão somente quanto à dosimetria da pena dos réus.
Com informações de Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
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