Responsabilidade solidária de cooperativa de crédito com cooperada não pode ser presumida

Data:

Responsabilidade solidária de cooperativa de crédito com cooperada não pode ser presumida
Créditos: 4rtuna / shutterstock.com

A responsabilização solidária de cooperativas centrais e de bancos cooperativos com a cooperada local não pode ser presumida, e não há legislação vigente que estabeleça esse tipo de responsabilização por atos de gestão da cooperada local.

Após diferenciar o papel de cada instituição, os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) excluíram a responsabilização solidária do Bancoob (banco cooperativo) e da Cecremge (cooperativa central) por atos praticados pela Creditec, cooperada singular do interior de Minas Gerais que foi liquidada após ficar sem dinheiro para cobrir os depósitos dos correntistas.

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que a responsabilização solidária não ocorre por dois motivos: a cooperativa central atuou nos limites de suas atribuições legais e regulamentares; e não há na legislação em vigor referente às cooperativas de crédito nenhuma disposição que atribua às cooperativas centrais qualquer responsabilidade solidária por eventuais prejuízos causados pelas cooperativas singulares.

No caso analisado, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) responsabilizou todas as entidades envolvidas por entender que haveria hierarquia entre elas, e que as centrais deveriam arcar com as dívidas de sua suposta filial.

Serviços distintos

A ministra explicou que a relação existente entre o Bancoob, a Cecremge e a Creditec é de mera prestação de serviços entre pessoas jurídicas distintas e que a natureza jurídica das instituições é distinta, razão pela qual não há hierarquia ou subordinação capaz de ensejar a responsabilização solidária por qualquer tipo de ato da cooperada local.

“Apesar da constante ampliação das competências das cooperativas centrais, seu poder ainda é restrito, encontrando-se um limite máximo, que é a impossibilidade de substituir a administração de cooperativa de crédito singular que apresenta problemas de gestão”, resumiu a ministra.

Nancy Andrighi destacou que a Cecremge auditou a Creditec antes da liquidação e sugeriu uma série de mudanças para viabilizar a atividade da cooperativa, demonstrando não ter se furtado a supervisionar a instituição.

Fornecimento de serviços

O Bancoob firmou convênio com a Cecremge para compensação de cheques e outros papéis. A Creditec foi beneficiada pelos serviços prestados pelo Bancoob até seu descredenciamento. Com a insolvência da Creditec, os associados buscaram reaver os valores depositados que não foram pagos após a liquidação ordinária da instituição.

Quanto à responsabilidade do Bancoob, a ministra ressaltou que os serviços fornecidos pelo banco à Creditec, incluindo cheques com sua marca, não são suficientes para configurar a solidariedade. Isto porque os cheques e demais papéis continham o nome para cumprir regulamentação vigente do Banco Central.

“Não é juridicamente viável considerar o recorrente Bancoob como participante da cadeia de fornecimento dos serviços que geraram prejuízos aos recorridos e, por consequência, não pode ser considerado um fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor”, disse a relatora.

A decisão restabeleceu a sentença que condenou a Creditec à restituição dos valores, mas rejeitou o pedido de responsabilização solidária do Bancoob e da Cecremge.

Leia o acórdão.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça.

 

EMENTA:

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. SISTEMA NACIONAL DE COOPERATIVAS DE CRÉDITO. RESPONSABILIDADE DAS COOPERATIVAS CENTRAIS E DOS BANCOS COOPERATIVOS. INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESPONSABILIDADE CONFORME ATRIBUIÇÕES LEGAIS E REGULAMENTARES. TEORIA DA APARÊNCIA. INAPLICÁVEL. MERO CUMPRIMENTO DE DEVER NORMATIVO. TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO. CADEIA DE SERVIÇO. NÃO COMPOSIÇÃO.
1. Ação ajuizada em 22/07/2002. Recursos especiais interpostos em 02/07/2014 e 16/07/2014. Atribuídos a este Gabinete 25/08/2016.
2. O sistema cooperativo de crédito tem como maior finalidade permitir acesso ao crédito e a realização de determinadas operações financeiras no âmbito de uma cooperativa, a fim de beneficiar seus associados. Ao longo de sua evolução normativa, privilegia-se a independência e autonomia de cada um de seus três níveis (cooperativas singulares, centrais e confederações), incluindo os bancos cooperativos.
3. Nos termos da regulamentação vigente, as cooperativas centrais do sistema cooperativo de crédito devem, entre outras funções, supervisionar o funcionamento das cooperativas singulares, em especial o cumprimento das normas que regem esse sistema. No entanto, sua atuação encontra um limite máximo, que é a impossibilidade de substituir a administração da cooperativa de crédito singular que apresenta problemas de gestão.
4. Não há na legislação em vigor referente às cooperativas de crédito dispositivo que atribua responsabilidade solidária entre os diferentes órgãos que compõem o sistema cooperativo. Eventuais responsabilidades de cooperativas centrais e de bancos cooperativos devem ser apuradas nos limites de suas atribuições legais e regulamentares.
5. Na controvérsia em julgamento, a cooperativa central adotou todas as providências cabíveis, sendo impossível atribuir-lhe responsabilidade pela insolvência da cooperativa singular.
6. Não há solidariedade passiva entre banco cooperativo e cooperativa de crédito quanto às operações bancárias por esta realizadas com seus cooperados, uma vez que o sistema de crédito cooperativo funciona de molde a preservar a autonomia e independência – e consequente responsabilidade – de cada um dos órgãos que o compõem. Precedentes.
7. A obrigação do recorrente BANCOOB de fazer constar, por força normativa, sua logomarca nos cheques fornecidos pela cooperativa singular de crédito CREDITEC, afasta aplicação da teoria da aparência para sua
responsabilização.
8. No âmbito das relações de consumo, aplicando-se a teoria da causalidade adequada e do dano direto imediato, somente há responsabilidade civil por fato do produto ou serviço quando houver defeito e se isso for a causa dos
danos sofridos pelo consumidor.
9. Na hipótese sob julgamento, nenhuma das causas da insolvência da cooperativa singular pode ser atribuída ao recorrente BANCOOB, o qual atuava como simples prestador de serviços do sistema de crédito cooperativo, nos termos da regulamentação das autoridades competentes.
10. Não há como reconhecer a responsabilidade solidária prevista nos arts. 7º, parágrafo único, 20 e 25 do CDC, pois o recorrente BANCOOB não forma a cadeia de fornecimento do serviço em discussão na controvérsia em
julgamento.
11. Recursos especiais conhecidos e providos.

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : BANCO COOPERATIVO DO BRASIL S/A
ADVOGADOS : JOSÉ ANCHIETA DA SILVA E OUTRO(S) – MG023405
JOSÉ PERDIZ DE JESUS E OUTRO(S) – DF010011
ROBERTO KER ELIAS E OUTRO(S) – MG066241
RODRIGO NEIVA PINHEIRO – DF018251
ALEX RAFAEL HOFFLING E OUTRO(S) – DF014999
RENATA DANTAS GAIA – MG104160
VITOR PERDIZ DE JESUS BORBA E OUTRO(S) – DF031770
RECORRENTE : CENTRAL DAS COOPERATIVAS DE ECONOMIA E
CREDITO DO ESTADO DE MINAS GERAIS LTDA. – SICOOB
CENTRAL CECREMGE
ADVOGADOS : PAULO ROBERTO CARDOSO BRAGA – MG051821
MARCOS LOPES DA SILVA E OUTRO(S) – MG068293
RECORRIDO : MARCUS ANTONIO NEVES
RECORRIDO : DORVALINA BEATRIZ DA SILVA
RECORRIDO : SUELY DE FATIMA MARQUES ROCHA
RECORRIDO : MARCUS ANTONIO MOREIRA
RECORRIDO : CARLOS VANIL DE REZENDE
RECORRIDO : JOAO DELFINO DE RESENDE
RECORRIDO : MARIA CHAVES DE RESENDE
RECORRIDO : ANTONIO CARLOS MARQUES
RECORRIDO : EDNA MARIA NEVES
RECORRIDO : TEREZA DA GLORIA MARTINS SILVA
RECORRIDO : JOSE MARIA DA SILVA – ME
RECORRIDO : GERALDO VALTENCIR MIRANDA
RECORRIDO : LEONARDO JOSE DE CARVALHO
RECORRIDO : MARIA BENEDITA DO NASCIMENTO
RECORRIDO : JOAQUIM SEBASTIAO VELOZO
RECORRIDO : ELPIDIO FRANCISCO VIEIRA
RECORRIDO : EVARISTO PEDRO DO NASCIMENTO
RECORRIDO : MARIA ARACI DO NASCIMENTO
RECORRIDO : ANTONIO JOEL DE ALMEIDA
RECORRIDO : LUIZ PEREIRA DE NOVAES
RECORRIDO : ANTONIA DE LOURDES VIEIRA SILVA
RECORRIDO : LUIZA HELENA CARVALHO DE OLIVEIRA
RECORRIDO : ADAO CARVALHO DE OLIVEIRA
RECORRIDO : BENEDITO AQUILES ALVES
RECORRIDO : ROSALINA MIRANDA VITORIA
RECORRIDO : JOAO BATISTA VITORIA
RECORRIDO : JOSE ARLINDO MIRANDA
RECORRIDO : FATIMA HELENA DA FONSECA MIRANDA

RECORRIDO : CARLOS CALCIM CAMPOS
RECORRIDO : LUIZ MARQUES DE OLIVEIRA
RECORRIDO : SEBASTIAO AGUIAR FARIA
RECORRIDO : CLAUDIO JOSE DE ALMEIDA
RECORRIDO : OLIMPIO MARCIANO DA CUNHA
RECORRIDO : MAURO JOSE NEVES
RECORRIDO : JOSE THEODORO NEVES
RECORRIDO : VALDELENA AGUIAR DE FARIA NEVES – MICROEMPRESA
RECORRIDO : RONALDO CARVALHO DE OLIVEIRA
RECORRIDO : RITA DE CASSIA DELGADO
RECORRIDO : MARIA LUCIA NEVES BORGES
RECORRIDO : MITRA ARQUIDIOCESANA DE JUIZ DE FORA
REPR. POR : DOMINGOS THEODORO DE LACERDA
RECORRIDO : EMERSON ALVES LACERDA
RECORRIDO : ROSELI BRAZ MAIA
RECORRIDO : JOAQUIM JOSE DE OLIVEIRA
RECORRIDO : ALEXSANDRO ELIAS DA CUNHA
RECORRIDO : SEBASTIAO VALTENCIR DE SOUZA
RECORRIDO : ROBERTO CARLOS RIBEIRO
RECORRIDO : JOSE GERALDO DE ALMEIDA
RECORRIDO : SEBASTIAO ANDRADE
RECORRIDO : ANA MARIA DA SILVA
RECORRIDO : SEBASTIAO DIMAS ALVES
RECORRIDO : SERGIO RODRIGUES DE ALMEIDA
RECORRIDO : JOSE LANDIM DA SILVA
RECORRIDO : JOAO FERREIRA FERNANDES
RECORRIDO : ELIANE FRANCISCA NAMORATO FONTOURA
RECORRIDO : RENATO LANDIM DA SILVA
RECORRIDO : FRANCISCA LANDIM
RECORRIDO : VICENTE BALIEIRO DE ALMEIDA
RECORRIDO : ANTONIO VALTENCIR MOREIRA
RECORRIDO : JOSE SEBASTIAO DA SILVA
RECORRIDO : CLAUDIO SEBASTIAO DA FONSECA
RECORRIDO : WALLACE ANDRADE SILVA
RECORRIDO : HELOISA HELENA DE ALMEIDA
RECORRIDO : MARIA DAS DORES DE ALMEIDA
RECORRIDO : MARIA ROSA DO CARMO ALVES
RECORRIDO : SERGIO LUIS MACHADO
RECORRIDO : VALDEMAR RODRIGUES DE ALMEIDA
RECORRIDO : JAIR HONORIO DE MIRANDA
RECORRIDO : THEREZINHA DE JESUS MIRANDA
ADVOGADOS : FRANCISCO DE ASSIS BELGO – MG062793B
ANTENOR LAMHA ROCHA E OUTRO(S) – MG133694

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Concessionária de energia é condenada a indenizar usuária por interrupção no fornecimento

A 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação de uma concessionária de energia ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais a uma usuária que ficou sem fornecimento de energia elétrica por quatro dias, após fortes chuvas na capital paulista em 2023. A decisão foi proferida pelo juiz Otávio Augusto de Oliveira Franco, da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Vila Prudente.

Homem é condenado por incêndio que causou a morte do pai idoso

A 3ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação de um homem pelo crime de incêndio que resultou na morte de seu pai idoso. A decisão, proferida pela Vara Única de Conchal, reduziu a pena para oito anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado.

Remuneração por combate a incêndio no Porto de Santos deve se limitar ao valor do bem salvo

A 9ª Vara Cível de Santos condenou uma empresa a pagar R$ 2,8 milhões a outra companhia pelos serviços de assistência prestados no combate a um incêndio em terminal localizado no Porto de Santos. O valor foi determinado com base no limite do bem efetivamente salvo durante a operação.

Casal é condenado por expor adolescente a perigo e mantê-lo em cárcere privado após cerimônia com chá de ayahuasca

A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a condenação de um casal pelos crimes de sequestro, cárcere privado e exposição ao perigo à saúde ou vida, cometidos contra um adolescente de 16 anos. A decisão, proferida pela juíza Naira Blanco Machado, da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos, fixou as penas em dois anos e quatro meses de reclusão e três meses de detenção, substituídas por prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo.