A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a recurso da Serrano Distribuidora Ltda., de Cariacica (ES), contra decisão que reverteu a demissão por justa causa de duas operadoras de caixa que, com outras 15 funcionárias, paralisaram as atividades por cerca de cinco minutos em protesto contra o elastecimento do horário de funcionamento da loja na antevéspera de Ano Novo.
Para o relator do recurso na Turma, ministro Barros Levenhagen, a pena foi desproporcional ao ato e ressaltou que empresa deixou de observar a aplicação gradual de outras medidas disciplinares, como advertência ou suspensão, diante do histórico profissional sem ocorrência de outros atos insubordinados das trabalhadoras. “A recorrente (Serrano Distribuidora) não oportunizou às recorridas a readequação da conduta, mas agiu com evidente rigor excessivo no exercício de seu poder disciplinar, razão pela qual se mantém a reversão da justa causa”, disse o relator.
Entenda o caso
De acordo com a inicial, as operadoras cumpriam jornada das 13h30 às 21h, de segunda a quinta-feira, e das 13h30 às 22h50, às sextas e sábados. Elas alegam que no dia 30/12/2014, uma terça-feira, o estabelecimento deveria ser fechado às 21h, porém, sem que os funcionários fossem previamente avisados, foi decidido pela gerência que a loja permaneceria aberta até às 22h, devido ao grande movimento de fim de ano.
As funcionarias explicaram que, após notarem que a loja permaneceu aberta após às 21h, 17 operadores dos 21 caixas abertos acenderam a luz do caixa para que a fiscal esclarecesse a situação, de modo que, depois de cinco minutos, retornaram ao trabalho normalmente, mas foram surpreendidas com a dispensa por justa causa três dias depois (02/01/2015).
Motim
A distribuidora, no entanto, afirmou que as empregadas demitidas participaram de um “motim” que consistiu na interrupção das atividades, sob a condição de que só retornariam a registrar as mercadorias se o gerente fechasse as portas do estabelecimento. “Ficaram com os braços cruzados por cerca de cinco minutos, somente retornando ao trabalho após o gerente fechar a porta da loja, mesmo sem concordar com a atitude das funcionárias”.
O juízo da Vara do Trabalho da 3ª Vara do Trabalho de Vitória (ES) manteve a justa causa, por considerar que a conduta das empregadas foram graves e passíveis de rescisão direta, pois exigiram algo que excede a razoabilidade e a boa-fé que deve reger os contratos de emprego. “A gravidade é representada pelo dia em que isso ocorreu (30 de dezembro), pelo enorme prejuízo que podiam causar a reclamada (financeiro e de imagem), considerando, acima de tudo, que houve uma recusa ilegal e orquestrada”.
O Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) reformou a sentença, por entender que o caso não se enquadra aos previstos no artigo 482 da CLT, que trata sobre as causas ensejadoras da justa causa. Para o Regional, a empregadora usou de um rigor excessivo que poderia manchar a imagem profissional e pessoal do trabalhador e, consequentemente, impedir o acesso ao direto às verbas rescisórias, garantidos com a reversão da justa causa. “A conduta das reclamantes não se mostrou tão grave e desabonadora a ponto de ensejar a demissão por falta grave”, afirmou. “A empresa excedeu em seu poder punitivo sem observar os critérios da proporcionalidade e razoabilidade, deixando de atender ao caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar”, completou.
TST
No recurso ao TST, a distribuidora sustentou que o acórdão Regional deixou de observar que as empregadas agiram em concluiu junto das outras 15 operadoras, e que a paralisação durante a jornada é ato grave, passível de dispensa motivada nos termos do artigo 482, alínea “h”, da CLT, “diante da quebra da fidúcia necessária para a continuidade do contrato de trabalho”.
O ministro Barros Levenhagen, no entanto, negou provimento ao recurso, por entender que houve desproporcionalidade entre o ato faltoso e a medida disciplinar. O relator explicou que as faltas capituladas no artigo 482 estão sujeitas aos requisitos da atualidade, do nexo causal, da proporcionalidade da pena e a proibição “bis in idem” (dupla penalidade pelo mesmo ato). “Não houve prova de que o recorrente tivesse observado a necessária graduação das penas de advertência e suspensão, considerando ter sido essa a única ocorrência envolvendo as recorridas”, concluiu.
A decisão foi unânime.
(Alessandro Jacó/RR)
Processo: RR – 8-47.2015.5.17.0003
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho
Ementa:
RECURSO DE REVISTA. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. I – De início, registre-se que a Súmula 459 do TST admite a possibilidade de conhecimento do recurso de revista pela preliminar de negativa de prestação jurisdicional tão-somente pela via das violações ao art. 832 da CLT, ou 458 do CPC, ou 93, IX, da Constituição Federal/88, razão pela qual se deixa de apreciar a apontada violação aos artigos 5º, XXXV, da CF, bem como a divergência jurisprudencial colacionada. II – Pois bem, da leitura do acórdão impugnado e do acórdão dos embargos de declaração, sobressai a convicção de o Colegiado de origem ter enfrentado todas as questões relevantes para o deslinde da controvérsia, notadamente acerca da reversão da justa causa, explicitando que não houve a observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na aplicação da justa causa. III – Infirma-se, desse modo, a denúncia de negativa de prestação jurisdicional, suscitada à guisa de inocorrida violação dos artigos 93, IX, da Constituição e 458, II, do CPC de 73 Não é demais enfatizar que, à luz do princípio da persuasão racional, cabe ao juízo dar os motivos jurídico-factuais do seu convencimento, desobrigado assim de apreciar e rebater todos os argumentos colocados pelas partes, visto que o comando constitucional acerca da fundamentação das decisões judiciais não implica interlocução sequenciada e interminável com o magistrado. IV – Aliás, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 23/6/2010, ao apreciar a Questão de Ordem no AI nº 791.292/PE (Relator Ministro Gilmar Mendes), reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional atinente à obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais. V – No julgamento do mérito, assentou, contudo, que “o art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão”. VI – Vê-se desse precedente ter a Suprema Corte afastado a hipótese de negativa de prestação jurisdicional se o acórdão ou a decisão estiverem fundamentados, mesmo que concisamente, sem necessidade de que haja fundamentação correlata a cada uma das alegações ou provas, tampouco que essa se mostre ou não juridicamente correta, visto que, nesse caso, terá havido, quando muito, erro de julgamento, inassimilável ao vício proscrito pelo artigo 93, inciso IX, da Constituição. VII – No mais, quanto à alegação de que não houve apreciação dos requisitos para o deferimento dos honorários advocatícios, cumpre registrar a ausência de interesse recursal, haja vista ter o Regional expressamente consignado que as reclamantes encontram-se assistidas por advogado particular, razão pela qual não fazem jus aos honorários advocatícios (fls. 154/155 – doc. seq. 3). VIII – Recurso de revista não conhecido. REVERSÃO DA JUSTA CAUSA. ATO DE INSUBORDINAÇÃO. FALTA GRAVE. GRADAÇÃO DAS PENAS. I – Conquanto os elementos descritos no acórdão regional demonstrem a prática de ato de insubordinação praticado pelas recorridas ao paralisarem temporariamente as atividades como forma de protesto contra o elastecimento do horário de funcionamento da loja na antevéspera do Ano Novo, sobressai a certeza de terem se utilizado do direito de resistência, em função do qual a dispensa por justa causa revela-se desproporcional. II – Acresça-se, ainda, não ter havido prova de que o recorrente tivesse observado a necessária graduação das penas de advertência e suspensão, não obstante o ato de insubordinação, em regra, dispensar a imposição dessas penalidades pedagógicas, considerando ter sido essa a única ocorrência envolvendo as recorridas, a justificar, excepcionalmente, a precedência da aplicação de uma daquelas medidas disciplinares. III – Some-se a tais digressões jurídico-factuais, extraídas do acórdão recorrido, em conformidade com a Súmula 126/TST, a certeza de que a recorrente não oportunizou às recorridas a readequação da conduta, mas agiu com evidente rigor excessivo no exercício de seu poder disciplinar, razão pela qual se mantém a reversão da justa causa. VI – Recurso de revista conhecido e desprovido. MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. REVERSÃO DA JUSTA CAUSA. POSSIBILIDADE. I – Da interpretação teleológica da norma do § 8º do artigo 477 da CLT extrai-se a conclusão de o legislador ter instituído a multa ali preconizada, para o caso de as verbas rescisórias devidas ao empregado serem incontroversas, cujo pagamento não seja efetuado nos prazos contemplados no § 6º daquele artigo, salvo eventual mora que lhe seja atribuída. III – No caso dos autos, a despeito de a justa causa ter sido revertida em juízo, tal condição não obstaculiza a condenação ao pagamento da multa do artigo 477 da CLT. IV – Isso porque, com o cancelamento da OJ nº 351 da SDI-I do TST, não mais prevalece o entendimento de que, em havendo controvérsia sobre a obrigação cujo inadimplemento gerou a multa, esta seria descabida. V – Com efeito, a atual iterativa e notória jurisprudência desta Corte é a de que a multa em questão somente não seria devida quando o próprio trabalhador tiver dado causa à mora, hipótese não verificada nos autos. VI – Recurso de revista não conhecido. (TST – Recurso de Revista n° TST-RR-8-47.2015.5.17.0003, Recorrente: SERRANO DISTRIBUIDORA S.A.; Recorrido ELIZABETE ALVES DA SILVA E OUTROS. Data da Publicação: 16.12.2016).