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A questão da obrigatoriedade de vacinação no Brasil

Créditos: Remains | iStock

O tema de vacinação, pelo menos em tempos recentes, nunca esteve tão à tona. Não é de se espantar, afinal, o mundo enfrenta de uma grave crise de saúde. Alguns aguardam a vacina ansiosamente, outros optam pela não vacinação. Fato é, que o tema tomou conta do noticiário e virou assunto importante por todo o Brasil. Mas, afinal, a vacinação é obrigatória no Brasil? A resposta para esta intrigante pergunta depende de uma análise, ainda que breve.

A Constituição Federal, em seu artigo 196, estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Assim, penso que não restam dúvidas que a vacinação é direito de todos, pois visa proteger a saúde. Mas o fato de ser um direito não significa, necessariamente, que este direito é de exercício obrigatório ou automático.

Este tema desperta debates, pois há um grande conflito entre a tutela coletiva à saúde e a própria proteção individual versus a liberdade individual de poder optar pela não vacinação.

Há, no ordenamento jurídico, previsão sobre a compulsoriedade da vacinação.

O Decreto 78.231/76 estabelece ser “dever de todo cidadão submeter-se e os menores dos quais tenha a guarda ou responsabilidade, à vacinação obrigatória”. Há de se notar que, além de um direito, é um dever, portanto, uma obrigação do cidadão em se vacinar e proporcionar vacinação de menores que tenha a guarda.

Em relação a menores, o Estatuto da Criança e Adolescente trata da obrigatoriedade de vacinação de crianças quando recomendado pelas autoridades sanitárias (art. 14,§1º).  O ECA ainda prevê que o descumprimento de obrigações do poder familiar incide o infrator a multa.

A lei n. 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública consequente do coronavírus, trata a vacinação como medida de enfrentamento a emergência de saúde pública, mas não aborda acerca da compulsoriedade.

Mas e se alguém não quiser se vacinar? E se a pessoa não quiser exercer este direito?

De fato, a liberdade individual vem ganhando cada vez mais espaço e sendo mais valorizada através do Código Civil e da própria Constituição.

O código civil trata da liberdade ao corpo e autonomia pessoal. O Código de ética médica determina ser proibido ao profissional desrespeitar a vontade do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas.

Destes dispositivos, percebe-se uma valorização do indivíduo frente ao Estado, permitindo ao indivíduo a escolha por fazer ou não um tratamento.

Além do mais, o Decreto n. 78.231/76 determina que a vacinação será dispensada se houver contraindicação.

A questão aqui gira em torno da renunciabilidade ou não de direitos fundamentais. Se a pessoa pode abrir mão do direito de ser vacinada. Mas, além do direito da pessoa em ser ou não vacinada, está em jogo também o direito da coletividade em viver num ambiente salubre. Estamos, pois, diante de um conflito entre direitos, ambos fundamentais. Como solucionar este conflito de direitos? Qual direito deve prevalecer? A autonomia individual da escolha pela não vacinação ou o direito da coletividade em obter uma sociedade saudável? Qualquer resposta a estes questionamentos tende a não ser pacífica, mas devem ser enfrentados.

Certamente, cada caso merece uma atenção e uma abordagem. No caso da pandemia de COVID 19, inegável se se tratar de doença de rápido contágio e proliferação, sendo questão de saúde pública. Então, aqui, além do conflito entre o direito de querer ser vacinado versus o direito de não ser vacinado (ambos tratados individualmente), destaca-se o conflito entre o direito íntimo da recusa pela vacina versus o direito à saúde pública.

Neste ponto, a perspectiva merece um outro ponto de vista. Não estamos mais a tratar de direitos meramente particulares de querer ou não querer. Agora a questão vislumbra a coletividade versus o individual.

“O seu direito termina onde começa o do outro”, já dizia o ditado. A partir do momento que o exercício de um direito particular obsta alguém do exercício do seu direito, há uma limitação. Isso é tutelado no ordenamento jurídico.

Não posso, no meu exercício do direito individual de ir e vir, entrar na residência de alguém se sua autorização. Há uma limitação ao meu direito de locomoção.

Não posso, no exercício do meu direito de construir, edificar um prédio cuja altura, obstaculiza o tráfego de aviões em regiões próximas a aeroportos. Há uma limitação do meu direito de construir e direito de propriedade.

Não posso no meu direito de liberdade de expressão, ofender determinada pessoa ou classe. Há restrição ao meu direito de expressar.

Todos estes exemplos trazem a possibilidade de restrição a direitos fundamentais, quando há conflito com outros direitos igualmente fundamentais.

No caso da vacinação, a coletividade clama por um ambiente saudável. A crise sanitária de covid-19 ocasionou isolamento social, fechamento de escolas, comércios e diversas atividades. Milhares de pessoas tiverem a renda afetada e inúmeras empresas encerraram as atividades, aumentando o desemprego e crise na economia. Pessoas perderam a vida e tantas outras ficaram doentes. A questão aqui tem um aspecto coletivo.

Assim, se a vacinação for recomendada, deve ser aplicada. Uma pessoa não vacinada pode contrair a doença e transmitir a outras pessoas, que podem transmitir a outras, mantendo a crise sanitária de proporções jamais vivenciadas neste século.

Assim, se for recomendada, a vacinação deve ser realizada em larga escala e com caráter obrigatório, salvo recomendação médica em sentido contrário.

Vídeo sobre este artigo do mesmo autor:

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