Sem sombra de dúvidas, auxílio-reclusão é um dos benefícios mais conhecido pela sociedade, sob os mais diversos aspectos. Há muito tempo, corretas informações a respeito não são transmitidas pela Previdência Social, responsável maior pela sua gestão, manutenção e concessão.
Resumidamente, não se trata de um benefício de fácil acesso, tampouco seu valor é aquele superior ao salário mínimo tão amplamente divulgado por grande parte dos meios de comunicação.
E mais, existe toda uma razão sociológica, filosófica e histórica de existir, afinal, previdência é técnica de proteção social que deve ser aprimorada e estruturada de tal maneira, que seus abrigados possam exercer esse direito social e fundamental com ampla qualidade.
Pelo menos, esse é o sonho constitucional que deve ser vivido e buscado por todos os atores sociais. Devido ele é apenas aos dependentes do recluso, razão de que inexistindo familiares dependentes, nenhum benefício é concedido.
Também, que não se trata de qualquer prisão, mas tão somente aqueles que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto, requisitos esses que já excluem por si só uma grande quantidade de segregados pela justiça penal.
Existe ainda outro requisito, a qualidade de segurado do recluso, que a época da prisão deve estar contribuindo com o sistema em valores não superiores ao teto administrativo fixado pela política governamental.
Logo, facilmente se verifica um benefício que possui muitos filtros, requisitos, enfim, que muitas das vezes são de total desconhecimento público, razão de sua notória e injusta discriminação.
Aqui, por essa rápida reflexão, necessária a análise de um aspecto jurídico pouco visto em seu importante estudo. Regularmente, a Previdência Social informa de maneira administrativa e por Portaria um valor de salário-de-contribuição para aferir a miserabilidade do segurado, ou seja, estando dentro deste teto é considerado ele e seus dependentes pessoas que vivem sob a miserabilidade.
Atualmente, por força da Portaria 01 de 08/01/2016 esse valor intitulado “baixa-renda” fixa a quantia de R$ 1.212,64.
Portanto, mesmo tendo dependentes válidos, estando em um regime fechado, mas se a época da prisão, o segurado detinha contribuições acima desse patamar, aliás, meramente objetivo, sua família não receberá o auxílio-reclusão e ficará a mercê da sorte.
De outro lado, por exemplo, imaginemos um casal, em que o marido por um desatino da vida foi preso, processado e condenado, estando no regime prisional semiaberto, cujo salário a época estava dentro da aludida portaria ministerial, ou seja, por sua última contribuição previdenciária é considerado segurado de “baixa-renda”.
Imaginemos ainda que sua esposa, uma médica conceituada, com rendas mensais expressivas, tão somente com um simples agendamento no INSS, apresentando os documentos exigidos informados na homepage da Previdência, receberá normalmente o auxílio-reclusão ora analisado, durante todo o período de cumprimento de pena até a sua efetiva extinção.
Logo, obviamente uma legal, mas absurda injustiça social entre esses dois simples exemplos, cuja distorção sequer é debatida em termos de discussões acaloradas de uma iminente reforma previdenciária.
Em termos de relevância social, uma singular lição do Professor Hermes Arrais Alencar a respeito da existência e justificativa desse benefício:
“Codificado pelo INSS como B/25, o auxílio-reclusão é benefício previdenciário de caráter substitutivo da renda do trabalho, devido aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão. Criado com o intuito de garantir a subsistência da família do segurado detento ou recluso, durante o período no qual a família se ressente da perda temporária de uma fonte de subsistência”.
Assim, a desigualdade e exclusão feita por essa restritiva interpretação normativa é flagrante, na contramão clara da própria essência da Previdência Social.
Neste sentido, o que pensam os doutrinadores a respeito:
”A alteração constitucional foi de extrema infelicidade, pois exclui da proteção diversos dependentes, cujos segurados estão fora do limite de baixa renda. Esta distinção, para o auxílio-reclusão, não tem razão de ser, pois tais dependentes poderão enfrentar situação difícil, com perda da remuneração do segurado. Pessoalmente, sempre considerei a citada alteração como inconstitucional, haja vista gerar uma diferenciação desprovida de qualquer razoabilidade, pois o segurado mesmo com remuneração vultosa, poderá deixar a família em situação de necessidade mais gravosa do que outra família, mais humilde, mas que tenha outras fontes de renda. Para piorar, a inércia legislativa em disciplinar o conceito derradeiro de baixa-renda provoca, como se percebe com facilidade, discrepância ainda maior, possibilitando que dependentes percam o benefício por centavos ou mesmo pelo fato do segurado ter sido preso no mês de férias, no qual recebe, além do salário, mais 1/3 de adicional constitucional, o que não raramente produz resultado maior do limite vigente”.
Portanto, além de altamente polêmico, questionado e mal compreendido, o auxílio-reclusão que é sociologicamente justificado, produz claras injustiças como a ora exemplificada, acabando por ser inacessível, se o critério administrativo, fixado por portaria for o único objetivamente a ser trilhado.
Por isso, questões nevrálgicas como essa merecem fazer parte do debate sobre a reforma previdenciária, pois, a melhor reforma é a que traz e produz qualidade no plano de proteção, ainda que com reajustes econômicos, novos critérios de acessibilidade, mas que preserve em sua essência o sonho constitucional de um planejamento previdenciário amplo, justo e efetivo.