Paciente idosa possui câncer de ovário em estágio irreversível; Bradesco Saúde teria negado tratamentos e exames médicos
A Bradesco Saúde deverá promover internação domiciliar de uma segurada portadora de câncer de ovário em metástase. A decisão é do juiz de direito José Cícero Alves, da 4ª Vara Cível da Comarca de Maceió (AL).
De acordo com o que consta nos autos, a consumidor, que possui 76 (setenta e seis) anos, foi diagnosticada com câncer de ovário em metástase para os pulmões no mês de julho de 2018. A idosa já passou por diversas cirurgias e está fazendo sessões de quimioterapia para amenizar os efeitos da doença, tendo em vista que sua situação é irreversível.
Ainda com base na demanda judicial, mesmo a paciente estar sempre com as mensalidades em dia, a Bradesco Saúde teria negado por inúmeras vezes a realização de exames e tratamentos. Depois da última internação da idosa, há algumas semanas, uma médica especialista condicionou sua alta à imediata internação domiciliar.
“Nesse trilhar, o tratamento mais adequado é o denominado home care, já que os serviços são fornecidos diretamente no domicílio do paciente. Além do benefício alcançado, tal serviço é, ainda, uma forma de diminuir os custos que a operadora de plano de saúde teria em caso de internação hospitalar, sendo efetivamente um tratamento mais vantajoso”, destacou o juiz de direito.
Para o juiz de direito José Cícero Alves, mesmo não havendo previsão contratual para o atendimento domiciliar, o caso deve ser visto à luz dos princípios constitucionais do direito à vida e à saúde, além da proteção pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
“A conduta da parte ré agride frontalmente o direito à saúde e à vida. O respeito à vida humana é uma das maiores ideias de nossa civilização e o primeiro princípio da moral médica. Além de tudo o que até aqui se disse, cumpre salientar correndo o risco de parecer repetitivo, que a negativa de cobertura pode acarretar sérios danos à saúde da autora, motivo pelo qual é imprescindível a prévia atuação do Judiciário no sentido de evitar tais danos”, destacou o magistrado. O descumprimento da decisão acarretará multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais).
Processo nº 0703131-10.2020.8.02.0001 – decisão (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça de Alagoas – TJAL)
Teor do ato:
DECISÃO Trata-se de tutela provisória de natureza antecipada proposta por VALDA PAPINI GÓES TEIXEIRA, qualificada na exordial, em face de BRADESCO S/A, igualmente qualificada. Narra a exordial que a requerente é pessoa idosa que conta atualmente com 76 (setenta e seis) anos de idade, foi diagnosticada, em julho de 2018, com adenocarcinoma de ovário (câncer) metastásico para a pleura (membrana que recobre os pulmões). A doença, desde então, tem lhe acarretado sérios problemas de saúde, obrigando-a a submeter-se a diversas intervenções cirúrgicas invasivas, dentre as quais pleuroscopia, pleurodese e extração dos ovários, além de ter alterado drasticamente a sua qualidade de vida. Segue narrando que, tem participado de um seriado de sessões agressivas de quimioterapia com o propósito de retardar a evolução da doença, hoje já em estado considerado irreversível, ao passo em que tem buscado realizar tratamentos destinados a favorecer o seu bem-estar nessa fase final de sua vida. A despeito de todos os esforços seus, de seus médicos e de seus familiares o quadro geral de sua saúde é sensível, Aduz que, apesar de o réu custear as despesas básicas de tratamento de quimioterapia (mesmo porque a autora permanece e sempre permaneceu em dia com sua mensalidades), sua posição em relação ao estado da autora, historicamente, tem sido de descaso e de desdém. Com efeito, nesse ano e meio passado desde seu diagnóstico, vários tratamentos e exames foram quase criminosamente negados, exigindo-se a imediata intervenção do Poder Judiciário para impor o cumprimento de suas obrigações. Aduz ainda que, após uma das inúmeras internações hospitalares que já realizou na Santa Casa de Misericórdia de Maceió ainda neste mês de janeiro/2020, a equipe médica que a acompanhou, na pessoa da Dra. Daiana Rego Pinto (CRM/AL 5459), CONDICIONOU A SUA ALTA HOSPITALAR À IMEDIATA INTERNAÇÃO DOMICILIAR COMPLETA DA AUTORA (HOMECARE), CONFORME SOLICITAÇÃO EXPEDIDA PELA PRÓPRIA SANTA CASA AO RÉU (DOC. 03), CERTOS DE QUE A AUTORA JÁ SE ENCONTRA EM SUA RESIDÊNCIA APENAS AGUARDANDO A EQUIPE DO HOMECARE, Requer, em sede de tutela provisória antecedente, que seja determinado que a Requerida forneça internação domiciliar completa – home care em sua residência. É o breve relatório. Ab initio, concedo a Demandante as benesses da assistência judiciária gratuita, em respeito as determinações contidas no art. 98 e art. 99 da Lei nº. 13.105/2015 (Código de Processo Civil CPC/2015). De igual modo, com fundamento no art. 1.048, I, do CPC/2015, defiro a prioridade de tramitação em face do Estatuto do Idoso, devidamente comprovada através dos documentos acostados aos autos. Passo a apreciar o pedido de tutela provisória de urgência. Segundo o art. 300 do CPC/15, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. O dispositivo deixa evidentes os requisitos da tutela antecipada de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito, doutrinariamente conhecida como fumus boni iuris, e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, chamado periculum in mora. Nesse trilhar, importa esclarecer que a tutela de urgência antecipada se funda em um Juízo de cognição sumária, de modo que a medida, quando concedida, será precária, haja vista ser fundamental a necessidade de ser reversível (300, §3º, do CPC/2015). Portanto, a antecipação provisória dos efeitos finais da tutela definitiva, permite o gozo antecipado e imediato dos efeitos próprios da tutela definitiva pretendida, mas não se funda em um juízo de valor exauriente, de modo que pode ser desconstituída a qualquer tempo. Nessa esteira de pensamento, passa-se a analisar o caso concreto e o preenchimento dos requisitos necessários à concessão da tutela provisória pretendida. No caso em análise, a probabilidade do direito da parte autora encontra fundamento nos documentos acostados aos autos. A autora, idosa, conta com 76 (setenta e seis) anos de idade e foi diagnosticada com adenocarcinoma de ovário metastático para a pleura. Já submeteu-se a diversas intervenções cirúrgicas (pleuroscopia, pleurodese e extração dos ovários), além de diversas sessões de quimioterapia. Ressalto, que a médica que a acompanha condicionou sua alta hospitalar à imediata internação domiciliar completa – home care (fls.16/17). A prestação de serviço de saúde domiciliar destina-se àqueles pacientes que superaram a fase aguda do seu problema clínico e que, a rigor, necessitam estar ainda em ambientes hospitalares para receberem cuidados especializados, dando continuidade ao tratamento. Nesse trilhar, o tratamento mais adequado é o denominado home care, já que os serviços são fornecidos diretamente no domicílio do paciente. Além do benefício alcançado ao paciente, tal serviço é, ainda, uma forma de diminuir os custos que o a operadora de plano de saúde teria em caso de internação hospitalar, sendo efetivamente um tratamento mais vantajoso. Conquanto não haja previsão contratual para o atendimento domiciliar, o caso dos autos deve ser visto à luz dos princípios constitucionais do direito à vida e à saúde, além da proteção conferida pelo Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, impende colacionar o seguinte precedente: CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CÓDIGO CIVIL. PLANO DE SAÚDE. SERVIÇO DE ASSISTÊNCIA HOME CARE. NEGATIVA. ABUSIVIDADE. DIREITO À VIDA E À PRESERVAÇÃO DA SAÚDE. RECUSA INDEVIDA DE COBERTURA. DANO MORAL. 1. É facultado ao plano de saúde estabelecer as doenças que terão cobertura, porém, não esta sob sua discricionariedade a escolha do tipo de tratamento para a cura delas. 2. O atendimento domiciliar, serviço de Home Care, a paciente que apresenta quadro clínico grave, necessitando de cuidados dessa natureza por recomendação médica, encontra fundamento no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que preconiza o direito à vida e à saúde e que deve informar a interpretação contratual. 3. O bem jurídico objeto do negócio firmado entre as partes é salvaguardar, em última análise, o direito à vida, que é o primeiro cuja inviolabilidade é garantida, nos termos do disposto no art. 5º, caput, da Constituição da Republica Federativa do Brasil. Recusa a tal garantia que ultrapasse o mero aborrecimento e que atinja a esfera íntima do contratante, gera dano moral. 4. Recurso conhecido e desprovido. Unânime. (TJ-DF – APC: 20120210013236, Relator: SILVA LEMOS, Data de Julgamento: 03/02/2016, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 26/02/2016 . Pág.: 128) Além disso, é cediço que compete ao médico que acompanha o estado de saúde do paciente recomendar qual a terapêutica necessária para condução de tratamento. Seguindo essa linha, é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, “(…) o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada uma delas (AgRg no Ag 1350717/PA, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJe 31.03.2011).” Como se não bastasse, a Conduta da parte Ré agride frontalmente o direito a saúde e a vida. O respeito à vida humana é uma das maiores ideias de nossa civilização e o primeiro princípio da moral médica. Sendo assim, o perigo da demora (periculum in mora), pressuposto da tutela provisória, é flagrante. Além de tudo o que até aqui se disse, cumpre salientar, correndo o risco de parecer repetitivo, que a negativa de cobertura pode acarretar sérios danos a saúde da autora, motivo pelo qual é imprescindível a prévia atuação do Judiciário no sentido de evitar tais danos. Lembro, ainda, que o art. 300, §2º, do CPC/15 autoriza a concessão liminar da tutela de urgência que poderá, a qualquer momento, ser modificada ou revogada (art. 296, CPC/15). Por fim, em que pese a providência jurisdicional impor uma obrigação de fazer que, uma vez realizada, não tem como ser desfeita no plano dos fatos, entendo que a irreversibilidade do provimento antecipado (art. 300, §3º, CPC/15) não constitui, no presente caso, um óbice à concessão da medida liminar, porquanto, caso a parte autora venha a restar vencida ao final do processo, subsiste a possibilidade de ressarcir o plano demandado com o equivalente em pecúnia. Não há, pois, o risco de irreversibilidade do provimento antecipado. Ante o exposto, com fulcro no art. 300 do novo CPC, DEFIRO o pedido de tutela de urgência, para determinar que a parte demandada o PROMOVA A INTERNAÇÃO DOMICILIAR COMPLETA (HOME CARE) na residência da autora enquanto subsistir determinação médica nesse sentido, CONTEMPLANDO TODOS OS SERVIÇOS ESPECIFICADOS NA DETERMINAÇÃO DE FLS.16/17, bem como quaisquer medidas indispensáveis à manutenção da saúde da Autora ligadas ao fato relatado. A parte ré deverá cumprir a decisão dentro do prazo de 05 (cinco) dias, após o qual passará a incidir multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) diários. Expeça-se mandado de citação e intimação com urgência, para que a parte demandada providencie o cumprimento desta decisão. Intime-se a parte autora para, no prazo de 15 (quinze) dias, aditar a petição inicial, com fulcro no art. 303, §1º, inciso I, do CPC/2015. Frise-se que, acaso não seja realizado o aditamento no prazo estipulado, o processo será extinto sem resolução do mérito, consoante prescreve o §2º, do art. 303, do CPC/2015. Realizado o aditamento da inicial, remetam-se os autos ao CJUS, para fins de citação da parte ré e inclusão do feito na pauta de audiências, nos termos do disposto no art. 334 e seguintes, do NCPC. Publique-se. Intimem-se. Maceió , 04 de fevereiro de 2020. José Cícero Alves da Silva Juiz de Direito Advogados(s): Leonardo Lins Miranda (OAB 12453/AL)