Um motorista de caminhão que se recusou a viajar por estar usando medicamentos que alteram o estado de atenção conseguiu reverter despedida por justa causa aplicada pela sua empregadora, Reiter Transporte e Logística. Ele estava em tratamento contra ansiedade generalizada e transtorno do pânico. No entendimento da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), a punição foi desproporcional, já que a recusa ocorreu em quatro episódios, sendo que em três deles o motorista já havia sofrido penalidade de suspensão. Com a decisão, a despedida por justa causa foi convertida em dispensa imotivada, e o trabalhador deve receber todas as verbas comuns a esse tipo de rescisão contratual. O acórdão confirma sentença do juiz José Carlos Dal Ri, da Vara do Trabalho de Alegrete. Não cabem mais recursos.
Como informado no processo, o motorista foi admitido em dezembro de 2009 e despedido por justa causa em agosto de 2014. No ano da despedida, apresentou diversos atestados médicos gerados por transtornos de ansiedade e estresse. As recusas a viajar ocorreram entre junho e agosto daquele ano, e foram citadas na carta de demissão apresentada pela empregadora, inclusive com a informação de que foram aplicadas penalidades de suspensão. A empresa, diante do contexto, despediu o motorista por desídia, motivo para justa causa previsto no artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Entretanto, como observou a relatora do caso na 4ª Turma do TRT-RS, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, receitas médicas trazidas ao processo prescreviam dois medicamentos distintos ao motorista, um para transtornos depressivos e de pânico e outro para controle da ansiedade. Em ambas as bulas dos remédios, como ressaltou a relatora, existe a advertência quanto ao perigo de conduzir veículos e operar máquinas enquanto se realiza o tratamento. Na perícia, por outro lado, foi apontado um terceiro medicamento, que também pode causar tontura e sonolência. O especialista afirmou que o empregado sofria de ansiedade generalizada com sintomas fóbicos.
Nesse contexto, segundo a desembargadora, “as recusas a realizar o trabalho, condução de carreta, podem até ser justificadas e verossímeis, como meio de evitar acidentes com o próprio reclamante, terceiros ou mesmo perda da carga sob sua responsabilidade”. Ainda conforme a relatora, “a atividade desenvolvida pelo reclamante é de extrema complexidade tendo em vista o trânsito encontrado nas cidades e nas estradas brasileiras, de intenso tráfico e péssima conservação, além da exposição a cumprimento de roteiros de entregas e horários, da preocupação com a segurança pessoal e da carga que transporta, sob os riscos sempre iminentes de assaltos e acidentes”. Portanto, “a aplicação da justa causa no caso dos autos – especialmente pelo fato de a reclamada ter ciência do estado de saúde mental do reclamante, e por este estar consumindo medicamentos que podem influenciar na sua capacidade de trabalho – é desproporcional aos fatos ocorridos”, concluiu a julgadora.
Processo 0000463-77.2014.5.04.0821 (RO)