A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por unanimidade, manteve a condenação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e da Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia (Faepu) ao pagamento de uma indenização a título de danos morais e estéticos a uma vítima por suposto erro médico ocorrido em procedimento cirúrgico ao qual ela foi submetida.
Em primeiro grau, a Justiça Federal de Uberlândia, no estado de Minas Gerais, condenou os demandandos ao pagamento da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), bem como à realização de procedimento cirúrgico reparador e à prestação de atendimento psicológico à demandante.
Segundo os autos, a mulher foi submetida a uma cesariana de emergência realizada no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, mantido pela Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia (Faepu), e que o procedimento cirúrgico ocorreu aparentemente sem complicações.
Depois de alguma tempo da realização da cirurgia, a parte demandante notou um volume estranho em seu abdômen quando foi verificado que a tumoração foi originada por gaze esquecida dentro de seu abdômen durante o procedimento cirúrgico, sendo necessária a realização de nova intervenção cirúrgica um ano e meio depois da cesariana.
Em seu recurso de apelação, alegou a parte autora que por força do novo procedimento cirúrgico sofreu graves sequelas e cicatrizes em seu corpo, que o valor arbitrado pelo Juízo a quo no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) é ínfimo e irrisório. Desta forma, requerer a majoração do quantum indenizatório para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) o valor da indenização a título de danos estéticos e morais.
Enquanto, que a Universidade Federal de Uberlândia (UFU) sustentou ausência de comprovação de nexo causal entre o corpo estranho encontrado no abdome da autora e eventual gaze usada no procedimento realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia. Afirmou, também, que a responsabilidade civil estatal no caso concreto deve ser fundada na culpa, e não à luz da responsabilização objetiva por se tratar de alegada falha médica, não havendo, no caso, comprovação da negligência.
Já a Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia (Faepu) afirmou que a demandante recebeu atendimento adequado, inexistindo omissão, negligência, imperícia ou imprudência, que justificasse a condenação a indenizar a vítima por danos morais e que não existem provas de que foi retirada uma gaze do seu corpo. Quanto à condenação para prestação de atendimento psicológico, a Faepu alegou que não restou comprovado que ela necessitasse desse tipo de tratamento.
Ao verificar o caso, o relator, desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão, afastou as alegações dos demandados e afirmou que, consoante entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é cabível a inversão do ônus da prova nas discussões de erro médico em razão da hipossuficiência da parte contrária, cabendo aos demandados a demonstração de que as medidas adotadas foram adequadas ao tratamento de saúde.
Para o relator, os acusados não obtiveram êxito em comprovar que o material encontrado no corpo da autora é decorrente de gaze esquecida por erro médico ou se é resultado da utilização, na cirurgia, de fios de algodão para ligadura de vasos com sangramento ou outro procedimento realizado, como a própria costura da cirurgia. “Logo, necessária a averiguação da existência de erro médico, incumbindo aos réus a demonstração de que os procedimentos adotados foram adequados”.
O desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão afirmou, também, que todas as provas juntadas pela autora comprovaram que ela permaneceu com o material estranho em seu organismo por cerca de um ano, período que estava com seu filho recém-nascido e que necessitava de seus cuidados. “A privação de um convívio saudável com seu filho durante esse período certamente acarretou prejuízos de ordem psicológica imensuráveis, pelo que se mostra necessária a prestação de atendimento psicológico, conforme determinado na sentença. Além disso, houve também danos físicos e estéticos, visto que o corpo estranho lhe causava dores e a cirurgia para sua retirada deixou cicatrizes no abdome”.
Desta forma, afirmou o relator que restou comprovada a existência de dano decorrente da má prestação do serviço médico, configurando o nexo de causalidade e, logo, o dever de indenizar.
Nesses termos, o Colegiado, acompanhando o voto do relator, negou provimento à apelação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e da Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia (Faepu) e aumentou o valor da indenização por danos morais para a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e por danos estéticos no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). (Com informações do TRF1)
Processo: 0008622-86.2013.4.01.3803/MG – Acórdão (inteiro teor para download)
Ementa:
TRF1 – APELAÇÃO CÍVEL N. 0008622-86.2013.4.01.3803/MG
RELATOR | : | DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO |
APELANTE | : | RAFAELA CRISTINA FERREIRA DA SILVA |
ADVOGADO | : | MG00090933 – TADEU BACIOTTI MOREIRA E OUTRO(A) |
APELANTE | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLANDIA – UFU |
PROCURADOR | : | PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO |
APELANTE | : | FUNDACAO DE ASSISTENCIA ESTUDO E PESQUISA DE UBERLANDIA – FAEPU |
ADVOGADO | : | MG00046787 – ADELMO FARIA COIMBRA |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA COMPROVADA. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS CONFIGURADOS. INDENIZAÇÃO DEVIDA.
1.No caso de responsabilidade decorrente de prestação de serviço médico, por ser obrigação de meio, faz-se necessária a configuração de conduta negligente por parte do agente. Assim, apenas mediante a comprovação de erro médico que haverá a responsabilização do Estado pelo serviço prestado.
2.Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, cabível a inversão do ônus da prova nas discussões de erro médico em razão da hipossuficiência da parte contrária, cabendo aos réus a demonstração de que as medidas adotadas foram adequadas ao tratamento de saúde.
3.In casu, a controvérsia cinge-se, inicialmente, acerca da comprovação de que o corpo estranho retirado do corpo da autora é decorrente de gaze esquecida por erro médico ou se é resultado da utilização, na cirurgia, de fios de algodão para ligadura de vasos com sangramento ou outro procedimento realizado, como a própria costura da cirurgia. Logo, necessária a averiguação da existência de erro médico, incumbindo aos réus a demonstração de que os procedimentos adotados foram adequados.
4.Os réus não lograram êxito em comprovar que o material encontrado é decorrente de reações orgânicas naturais a produto habitualmente empregado nesse tipo de procedimento, ônus que lhes cabia conforme entendimento do STJ mencionado. Verifica-se, assim, a existência de dano decorrente da má prestação do serviço médico, configurado o nexo de causalidade, portanto, e o dever de indenizar.
5.Para a fixação do quantum indenizatório relativo aos danos extrapatrimoniais suportados, considerando-se a sua finalidade compensatória e preventiva (punitiva), deve-se ter em conta no seu arbitramento “as circunstâncias da causa, bem como a condição socioeconômica do ofendido e do ofensor, de forma que tal valor não seja ínfimo, para não representar ausência de sanção efetiva ao ofensor; nem excessivo, a fim de evitar o enriquecimento sem causa da vítima. Tal fixação deve orientar-se, portanto, pelos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da moderação” (TRF 1 ª Região, AC 1999.38.00.035044-8/MG).
6.No caso, a autora permaneceu com o material estranho em seu organismo por cerca de um ano, período que estava com seu filho recém-nascido e que necessita de seus cuidados. A privação de um convívio saudável com seu filho durante esse período certamente acarretou prejuízos de ordem psicológica imensuráveis, pelo que se mostra necessária a prestação de atendimento psicológico, conforme determinado na sentença. Além disso, houve também danos físicos e estéticos, visto que o corpo estranho lhe causava dores e a cirurgia para sua retirada deixou cicatrizes no abdome (fls. 19 a 21). Dessa forma, entende-se que o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para danos morais e de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para danos estéticos arbitrados pelo Juízo a quo se mostra aquém dos danos e do sofrimento da autora.
7. Apelações dos réus desprovidas e apelação da autora parcialmente provida para majorar a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e indenização por danos estéticos no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
ACÓRDÃO
Decide a Turma, por unanimidade, negar provimento às apelações dos réus e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Quinta Turma do TRF da 1ª Região, 7 de agosto de 2019.
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO
RELATOR