Compliance e advocacia: até aonde vai a hipocrisia de algumas grandes empresas?

Data:

Observem-se, nos últimos anos, diversos escândalos que afetaram sociedades por ações de capital aberto, inclusive. Em alguns casos, os fatos graves aconteceram com a atuação indevida de diretores jurídicos e de advogados, os quais, em coautoria ou participação, contribuíram para o cometimento de atos ilícitos, de crimes.

O mundo corporativo vive como a moda: segue tendências de determinado momento, com o fim de agradar a certo número de pessoas. Agora, a todo tempo, se fala de ESG – a sigla contemporânea que sugere respeito ao meio ambiente, responsabilidade social e preocupação com a governança.

governança
Créditos: undefined undefined | iStock

Tais premissas de gestão empresarial significam dar atenção, não apenas aos lucros, mas se porém os olhos da administração nas questões de sustentabilidade, consciência social e de ética, dentre outras.

No âmbito da governança, não há dúvidas da importância da implementação dos compliances – setores das empresas que zelam pelo cumprimento de regras e pelos comportamentos íntegros dos funcionários e gestores. Essas áreas desenvolvem controles internos e treinamentos com o objetivo de aprimorar os cuidados nas relações entre as pessoas, internas e externas.

Como sabido, nas grandes corporações, o ESG vem acompanhado de muita propaganda. Divulgam-se em notícias, campanhas e publicidade paga o quanto a empresa encontra-se adequada aos novos e melhores padrões de administração.

Ora, nas companhias de capital aberto, existe todo sentido de se aplicarem esses preceitos de gestão, afinal, se deve proteger o investidor que adquiriu ações, confiante em resultados econômicos e reputação da empresa.

Se as premissas acima podem ser tomadas como válidas, emerge a questão: Por que grandes empresas contratam escritórios de advocacia e advogados que, sabidamente, não atuam conforme a lei e a ética profissional?

Sim, por qual razão as regras de conformidade legal e integridade não se aplicam quando as companhias enfrentam questões judiciais, ou procedimentos administrativos?

gestão
Créditos: undefined undefined | iStock

Observem-se, nos últimos anos, diversos escândalos que afetaram sociedades por ações de capital aberto, inclusive. Em alguns casos, os fatos graves aconteceram com a atuação indevida de diretores jurídicos e de advogados, os quais, em coautoria ou participação, contribuíram para o cometimento de atos ilícitos, de crimes.

Mesmo assim, controladores, administradores e conselhos de administração preferem que as empresas contratem advogados que se apresentam não apenas para prestar serviços jurídico-profissionais, mas que se comprometem a alcançar êxito em processos-crime, litígios e procedimentos perante a administração pública, alguns sem esconder práticas de corrupção, ou clientelismo.

O pior adjetivo para um advogado – se verdadeiro o padrão ESG disseminado a todos nós – deveria ser resolvedor. No atrium dos códigos de ética da advocacia, sempre se encontra a distinção entre obrigação de meio e obrigação de resultado, não em função do acaso, porém, por fundamento lógico e jurídico. Não obstante, campeiam nos jornais, na internet e nas redes sociais, os nomes dos autodenominados resolvedores que, das modestas prefeituras às Altas Cortes, propalam relacionamentos e formas de entregar o que o cliente almeja.

Curioso notar que alguns colegas os admiram e, muitas vezes, sucumbem, até mesmo, a indicar a atuação dessa caterva, sob o pretexto de que, em determinado órgão público, ou tribunal, o funcionamento seria assim. Livram-se da responsabilidade, quando não abocanham participação nos valiosos honorários advocatícios.

Mas, no campo das perplexidades, resta a percepção de que os compliances não se dedicam a examinar a contratação de advogados, não perquirem quem estão a contratar, nem os respectivos contratos de prestação de serviços.

Na realidade, se parcela importante das companhias – em especial, as companhias de capital aberto – procedesse a perquirição de quem atua, como advogado e consultor jurídico, verificaria que o G da famosa sigla não prepondera em diversos departamentos jurídicos.

Nesse curioso ambiente corporativo, caso sinceros os propósitos que se espalham nos dias atuais, os diretores e compliances deveriam promover novíssimo programa: Conheça seu advogado (Know your lawyer).

Desse modo, se terá contribuição brasileira inovadora à práxis da administração de empresas e mais ética na advocacia.


Você sabia que o Portal Juristas está no FacebookTwitterInstagramTelegramWhatsAppGoogle News e Linkedin? Siga-nos!

Antonio Sergio Altieri de Moraes Pitombo
Antonio Sergio Altieri de Moraes Pitombo
Antônio Sérgio Altieri de Moraes Pitombo, Advogado, mestre e doutor em Direito Penal pela USP, pós-doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra. Advoga no escritório Moraes Pitombo Advogados.

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Direitos básicos dos passageiros segundo a ANAC no Brasil

O transporte aéreo é uma peça fundamental na mobilidade...

Juristas Academy realiza a 3ª Edição do Congresso Advocacia 5.0 nos dias 28 e 29 de novembro de 2024

A Juristas Academy apresenta a 3ª Edição do Congresso Advocacia 5.0, que acontecerá nos dias 28 e 29 de novembro de 2024, reunindo mais de 50 palestrantes de renome para debater as transformações tecnológicas e suas implicações para o direito. O evento será um marco para advogados, juristas e demais profissionais que buscam se destacar em um cenário cada vez mais digital e inovador.

Direito do Passgeiro por Perda da Conexão

Descubra o seu Direito do Passageiro por Perda da Conexão e saiba como reivindicar compensações e assistência em viagens aéreas no Brasil.

História dos Direitos Autorais

Descubra a História dos Direitos Autorais desde sua origem até os dias atuais. Entenda como a proteção intelectual evoluiu e impactou a criatividade ao longo do tempo