Recusada em trabalho por ter “cara de pobre” ex-empregada doméstica que se tornou juíza, diz que “A meritocracia é uma ilusão”

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Juíza aplica multa de R$10 mil a loja de vestuário infantil cuja testemunha mentiu em juízo
Créditos: Sebastian Duda / Shutterstock.com

A Juíza Antônia Marina Faleiros (57), é uma das poucas mulheres autodeclaradas negras que compõem o quadro de magistrados no Brasil. Alfabetizada pela própria mãe, aos 8 anos. ainda se lembra da esperança que sentiu quando um banco privado chegou à sua cidade natal, Serra Azul de Minas, a cerca de 300 km de Belo Horizonte. “Eu tinha 17 anos, era uma menina da roça, havia acabado de concluir o ensino médio e fui concorrer a uma vaga de emprego. Fiz uma prova e sei que havia ido bem, era ótima aluna”, conta. “Mas foi traumático, nem em último lugar fiquei. Muito tempo depois, soube que a prova sequer foi corrigida”.

Há 18 anos como juíza de uma comarca da Bahia, a magistrada diz que não pertencia àquele mundo privilegiado nem da aparência e nem da nascença. Foi a exclusão marcante “pela cara de pobre” na disputa pelo emprego que a levou a sair da cidade. Mudou-se para Belo Horizonte para ser empregada doméstica. Lá, dormiu durante 6 meses em um ponto de ônibus. “Não podia dormir na casa da patroa. Então dizia para ela que eu morava com uma tia em um bairro distante, e, para minha mãe, que morava com a patroa. Até que uma outra empregadora me estendeu a mão”, foi só o começo de sua trajetória.

A hoje juíza, que por 5 anos trabalhou como funcionária do lar, durante o dia, e se entregava aos estudos à noite, recolhia do lixo o material descartado por uma editora de apostilas para preparatórios de concursos jurídicos, “Fui até um cursinho e lá descobri que custava muito além do que eu poderia pagar com meu salário de doméstica. Então, passei a recolher as cópias manchadas ou inutilizadas que outros alunos jogavam no lixo”, dessa forma conseguiu passar em uma seleção e se tornar oficial de Justiça. Foi quando ela decidiu que queria ser juíza e começou a frequentar o curso de direito. Aos 40 anos, passou no concurso do TJBA.

Recentemente Antônia Marina Faleiros lançou seu primeiro livro, intitulado Retalhos, colcha de histórias para Mel dormir, dedicado à neta de 1 ano e 8 meses. São lembranças da infância permeada por dificuldades, mas também repleta de memórias afetivas.

Antônia rejeita o título de “exemplo de meritocracia”. Esse substantivo é usado para definir o predomínio numa sociedade daqueles que têm mais méritos (os mais trabalhadores, mais dedicados, mais bem-dotados intelectualmente etc). Para ela, no Brasil é impossível falar em meritocracia, já que nem todos têm as mesmas oportunidades e um caso individual de sucesso, apesar das adversidades, não pode ser usado como parâmetro.

“Meritocracia é só uma cortina para encobrir o remorso de quem fecha as portas para os outros. Você fecha as portas e essa pessoa não consegue nada. Então você diz: ‘Não conseguiu porque não tinha mérito’”, diz a juíza. Para ela as cotas raciais, são instrumentos para compensar essa desigualdade, e explica “É justo ter mecanismos que compensem as desigualdades. Não se trata de facilitar as coisas para ninguém, mas que se dê condições iguais”, finaliza.

Segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há apenas 6% de mulheres pretas ou pardas na magistratura. O órgão também projeta que a equidade racial no exercício da atividade jurisdicional brasileira só será alcançada no ano de 2044.

Com informações do UOL, Metropoles e Jusbrasil.

 

 

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Ricardo Krusty
Ricardo Krusty
Comunicador social com formação em jornalismo e radialismo, pós-graduado em cinema pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

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