Violação da boa-fé afasta proteção legal do bem de família, diz STJ

Data:

Violação da boa-fé afasta proteção legal do bem de família
Créditos: Vi_L | iStock

​A 4ª Turma do STJ entendeu que a regra da impenhorabilidade do bem de família só é aplicável quando não há violação do princípio da boa-fé objetiva. Assim, negou provimento ao recurso de uma proprietária de apartamento que invocava tal impenhorabilidade de bem dado em garantia de empréstimo para empresa pertencente a uma das donas do imóvel.

Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, “não se admite a proteção irrestrita do bem de família se esse amparo significar o alijamento da garantia após o inadimplemento do débito, contrariando a ética e a boa-fé, indispensáveis em todas as relações negociais”.

Narram os autos que uma das proprietárias pegou emprestado R$ 1,1 milhão no banco para formar capital de giro na empresa da qual é a única dona. Ela ofereceu o imóvel como garantia, que possui outra co-proprietária, mas ambas assinaram voluntariamente o contrato de alienação fiduciária.

Diante da inadimplência da empresária, o banco entrou com o pedido de execução da garantia. As proprietárias propuseram ação cautelar e conseguiram liminarmente afastar temporariamente as consequências do inadimplemento. O juízo de primeira instância julgou o pedido de nulidade do contrato de garantia improcedente, cassando a liminar. O TJDF manteve a sentença, dizendo que o contrato não possui nenhum defeito e que é inválido o argumento de que o dinheiro recebido não reverteu em favor da família.

As recorrentes alegaram ao STJ que uma das proprietárias não é sócia da empresa e foi beneficiada pelo empréstimo. Por isso, pediram o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel, por ser bem de família, e a declaração de nulidade da hipoteca instituída sobre ele.

No entanto, o relator destacou que a proteção legal conferida ao bem de família não pode ser afastada por renúncia do devedor ao privilégio, que o único imóvel residencial é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida salvo as exceções legais ou quando há violação da boa-fé objetiva.

Para ele, “o abuso do direito de propriedade, a fraude e a má-fé do proprietário devem ser reprimidos, tornando ineficaz a norma protetiva, que não pode conviver, tolerar e premiar a atuação do agente em desconformidade com o ordenamento jurídico”. O ministro esclareceu que, segundo entendimento firmado pela 3ª Turma no REsp 1.141.732, é determinante a constatação da boa-fé do devedor para que se possa reconhecer a proteção da impenhorabilidade prevista em lei.

E destacou: “O uso abusivo desse direito, com violação ao princípio da boa-fé objetiva, não deve ser tolerado, devendo, assim, ser afastado o benefício conferido ao titular que exerce o direito em desconformidade com o ordenamento jurídico […] A boa-fé contratual é cláusula geral imposta pelo Código Civil, que impõe aos contratantes o dever de honrar com o pactuado e cumprir com as expectativas anteriormente criadas pela sua própria conduta”.

E concluiu dizendo que, “vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á a propriedade do imóvel em nome do fiduciário, consequência ulterior, prevista, inclusive, na legislação de regência”.​​

Processo: REsp 1559348

(Com informações do Superior Tribunal de Justiça)

Juristas
Juristashttp://juristas.com.br
O Portal Juristas nasceu com o objetivo de integrar uma comunidade jurídica onde os internautas possam compartilhar suas informações, ideias e delegar cada vez mais seu aprendizado em nosso Portal.

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Concessionária de energia é condenada a indenizar usuária por interrupção no fornecimento

A 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação de uma concessionária de energia ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais a uma usuária que ficou sem fornecimento de energia elétrica por quatro dias, após fortes chuvas na capital paulista em 2023. A decisão foi proferida pelo juiz Otávio Augusto de Oliveira Franco, da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Vila Prudente.

Homem é condenado por incêndio que causou a morte do pai idoso

A 3ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação de um homem pelo crime de incêndio que resultou na morte de seu pai idoso. A decisão, proferida pela Vara Única de Conchal, reduziu a pena para oito anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado.

Remuneração por combate a incêndio no Porto de Santos deve se limitar ao valor do bem salvo

A 9ª Vara Cível de Santos condenou uma empresa a pagar R$ 2,8 milhões a outra companhia pelos serviços de assistência prestados no combate a um incêndio em terminal localizado no Porto de Santos. O valor foi determinado com base no limite do bem efetivamente salvo durante a operação.

Casal é condenado por expor adolescente a perigo e mantê-lo em cárcere privado após cerimônia com chá de ayahuasca

A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a condenação de um casal pelos crimes de sequestro, cárcere privado e exposição ao perigo à saúde ou vida, cometidos contra um adolescente de 16 anos. A decisão, proferida pela juíza Naira Blanco Machado, da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos, fixou as penas em dois anos e quatro meses de reclusão e três meses de detenção, substituídas por prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo.