Volkswagen e concessionária indenizarão consumidor por defeito

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Veículo teve cobertura negada, mesmo dentro da garantia.

Volkswagen e concessionária indenizarão consumidor por defeito | Juristas
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O juiz José Wilson Gonçalves, da 5ª Vara Cível de Santos, condenou uma montadora de automóveis e uma concessionária a reembolsarem um consumidor que teve a cobertura de seu veículo negada, ainda que dentro da garantia contratual. A decisão também determinou o pagamento de 20 salários mínimos por danos morais.

O autor alegou que adquiriu um carro zero km, fez todas as revisões exigidas e, três anos depois, o veículo começou a apresentar problemas. A fábrica se recusou a fornecer peças e mão de obra para o conserto, ainda na vigência da garantia, e apresentou orçamento para que o problema fosse sanado.

Para o magistrado, a cobrança indevida constitui evidentemente ato ilícito, passível de reparação. “É que não se pode aceitar a alegação de o consumidor ter perdido a garantia automaticamente porque deixou de realizar a primeira revisão dentro do prazo, quando a quilometragem ainda não havia atingido o limite estabelecido e o atraso, considerando o tempo de tolerância, não excedeu a um mês. Demais disso, não existe nos autos minimamente elemento que justifique a conclusão de o defeito ter decorrido de mau uso do veículo, situação que não se presume, em vez disso, deve ser demonstrada de forma irrefutável”, disse.

Ele reconheceu o dever das rés de efetuarem o reembolso ao autor, em regime de solidariedade, no valor gasto com o reparo do veículo, totalizando a quantia de R$ 4.350,00. Quanto ao dano moral, também julgou o pedido procedente. “A quantia indicada pelo autor (20 salários mínimos na data de hoje) é suficiente à dupla função a que a indenização se destina, de punir o ofensor e de amenizar para o ofendido”, concluiu.

Cabe recurso da decisão.

Processo nº 1018772-35.2015.8.26.0562 – Sentença

Autoria: Comunicação Social TJSP – AG
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP

Teor do ato:

Vistos.AROLDO RIBEIRO BARBOSA, qualificado na inicial, ajuizou ação de Procedimento Comum – DIREITO DO CONSUMIDOR em face de COMERI LITORAL COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA. e VOLKSWAGEN DO BRASIL INDÚSTRIA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES LTDA..Trata-se de “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS”.Segue, abaixo, o registro das principais ocorrências do processo:Fls. 1/32: Petição inicial com documentos.Inicialmente, alega que a relação entre as partes é de consumo, regendo-se pelo CDC, com foco na regra atinente à responsabilidade objetiva da empresa pelos danos causados ao consumidor, independentemente da demonstração de culpa, e na inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC). Informa que em 29.6.2012 comprou da ré Volkswagen, diretamente na loja da ré Comeri, o veículo VW Fox 1.6 GII, placas EVM 0151, começando a fluir, a partir de tal data, o prazo da garantia de 3 anos do veículo, conforme certificado de garantia e nota fiscal que anexa. Afirma que durante o uso do veículo foram realizadas todas as revisões obrigatórias, em 13.2.2013, 1.6.2013, 14.1.2014, 7.5.2014, 6.11.2014 e 5.5.2015. Ocorre que em 8.6.2015 o automóvel começou a apresentar vários problemas: começou a falhar; as luzes do carro indicavam que havia um problema; o controle do alarme parou de funcionar, impedindo que o autor fechasse o carro, as luzes internas apagaram e não tornaram a ligar. No mesmo dia o autor levou o veículo à oficina da ré Comeri, pagando R$ 550,00 pelo conserto (diagnóstico eletrônico e serviço elétrico). Destaca que no mesmo dia, antes de chegar em casa, o carro voltou a apresentar os mesmos problemas. Então, no dia seguinte, o autor retornou à concessionária ré, onde foi informado sobre a ausência total de custos para o conserto, eis que estava na garantia, que se encerraria em 29.6.2015. Após 10 dias, a ré Comeri lhe apresentou um orçamento no valor de R$ 4.233,00 (R$ 3.800,00 para pagamento à vista). Esclarece que não concordou com a atitude da ré, posto que o automóvel ainda estava na garantia, mas se viu obrigado a efetuar o pagamento, único meio para retirar o veículo da loja, vez que ele é seu meio de transporte, em razão de sua deficiência física. Acrescenta que na ocasião, funcionários da ré Comeri lhe afirmaram que a fábrica (a ré Volkswagen) havia se recusado a fornecer as peças e mão de obra, razão pela qual foi desconsiderado o fato de a garantia ainda estar em vigência. O autor ficou revoltado por se ver obrigado ao pagamento indevido por reparos em seu veículo, que eram responsabilidade das rés, eis que o adquiriu zero Km, fez todas as revisões exigidas e, quando ainda coberto pela garantia, o veículo apresentou problemas que são verdadeiros vícios intrínsecos do produto. Ressalta que o fato de possuir deficiência física em razão de acidente, sendo inclusive aposentado por invalidez, agrava imensamente sua dificuldade de locomoção, aumentando, desse modo, a necessidade do veículo e, por outro lado, a responsabilidade das rés por apresentar grave e ilegal obstáculo à utilização do automóvel. Alega que a possibilidade de indenização por dano material e moral estão previstas na CF (art. 5º, V e X ) e que o art. 186 do CC estabelece a obrigação de reparar o dano, por parte daquele que comete um ato ilícito. Pelos fatos expostos, verifica-se que a cobrança indevida constitui, evidentemente, um ato ilícito, passível de reparação, nos termos do art. 927 do CC. Aduz que o dano material causado é evidente, conforme comprovam o documento emitido pela própria ré Volkswagen, onde consta a garantia de 3 anos do veículo e os documentos emitidos pela ré Comeri, cobrando R$ 550,00 + R$ 4.233,00 (R$ 3.800,00 à vista, pagos pelo autor). Ainda, a existência do dano material a ser reparado é reforçada pelo CDC (arts. 12, 14, 17, 18 e 21), os quais firmam a responsabilidade objetiva das rés. Já o dano moral se mostra igualmente claro, comprovado notoriamente pela irresponsável atitude das rés frente a uma pessoa com deficiência física, sem outro meio de locomoção, senão o seu veículo. Cita ainda o art. 12 do CC. Aduz que, a princípio, verifica-se a dificuldade de arbitrar-se uma indenização pecuniária que equivalha a uma dor subjetiva, entretanto, atualmente a boa doutrina inclina-se no sentido de conferir à indenização do dano moral caráter dúplice, tanto punitivo do agente, quanto compensatório em relação à vítima. Levando-se em conta as circunstâncias do caso, a indenização a título de danos morais merece ser fixada em 20 salários mínimos, vigentes na data do pagamento.Fls. 9: REQUERIMENTOS:a) citação das rés;b) procedência da ação, para os fins de:1. condenar as rés à devolução do valor cobrado indevidamente, na quantia de R$ 4.350,00, a título de danos materiais;2. condenar as rés ao pagamento de 20 (vinte) salários mínimos, a título de danos morais;3. condenar as rés ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, corrigidos monetariamente, no valor a ser arbitrado em grau máximo por Vossa Excelência, se houver recurso;c) aplicação do Código de Defesa do Consumidor;d) deferimento do pedido de gratuidade de justiça;e) produção de todos os meios de prova admitidos em direito.Fls. 34: DECISÃO (deferiu a gratuidade e ordenou a citação).Fls. 53/81: CONTESTAÇÃO DA VOLKSWAGEN DO BRASIL – COM DOCUMENTOS.Em considerações iniciais, a ré alega que a garantia contratual do veículo somente vige enquanto obedecidos os termos do contrato de garantia com revisões periódicas a cada 6 meses, segundo o tempo, ou a cada 10.000 Km, prevalecendo o que ocorrer primeiro, salientando que o autor não obedeceu aos termos de garantia, eis que logo na primeira revisão, realizou-a extemporaneamente, inclusive considerando o tempo de 1 mês a mais (tolerância), perdendo o direito de ser atendido em garantia, conforme previsão contratual. (se refere a fls. 20. Lá consta “Previsão para execução do 1º Serviço Prevalecendo o que ocorrer primeiro – 10.000,00 km ou 29.12.2012”. Consta data em que o serviço foi realizado: 13.2.13) Assim, resta claro que a partir de 29.12.2012 o autor perdeu o atendimento a garantia contratual, contando somente com a garantia legal de 90 dias, sendo que esta última expirou em 29.3.2013. Ressalta que tanto a garantia contratual quanto a legal tiveram o termo final em 29.3.2013, sendo que os inconvenientes reclamados pelo autor ocorreram somente em 8.6.2015. O autor alega os inconvenientes ocorridos em 8.6.2015, ocasião em que a concessionária realizou o diagnóstico eletrônico, executando reparo elétrico e a troca das lâmpadas internas, sendo a cobrança de peças e mão de obra corretas e nos termos do contrato de garantia. Ao comparecer à oficina da concessionária Comeri em 9.6.2015, o automóvel foi analisado e foram diagnosticados novos problemas/atuador, conforme demonstra à fls. 25, sendo apresentado orçamento no valor de R$ 4.233,00. Sustenta que o orçamento apresentado pela concessionária é justo, sendo que o custo do reparo deve ser arcado única e exclusivamente pelo proprietário do veículo, ante a expiração da garantia contratual e legal. Afirma que o autor é conhecedor desse fato, tanto que autorizou o reparo, mas na inicial julgou ser uma cobrança indevida e pleiteia indenização por dano moral e material.No mérito, alega que o manual do veículo traz de forma clara que a garantia do automóvel está condicionada à realização dos serviços de manutenção na rede concessionária Volkswagen, dentro dos limites de quilometragem ou tempo, sendo registradas as passagens das revisões no referido documento. Como já mencionado, as revisões devem ser realizadas a cada seis meses ou 10.000 km, prevalecendo sempre o que ocorrer primeiro, sendo todos os procedimentos anotados na manual. Ressalta que, com a juntada do documento à fls. 19, o autor confessa pleno conhecimento de que a garantia do veículo era condicionada à execução das revisões previstas no plano de manutenção e dentro dos limites de quilometragem ou tempo (fls. 19: consta que “A garantia está condicionada à realização dos serviços de manutenção em uma Concessionária Volkswagen de sua preferência, dentro dos limites de quilometragem ou de tempo previstos neste caderno”). E à fls. 20 faz prova contra si mesmo, pois junta o registro das revisões, onde se observa a anotação de execução da 1ª revisão em 13.2.2013, com 7.593 Km, quando deveria ter sido realizada em 29.12.2012 e, ainda que fosse considerada a tolerância de mais 1 mês, deveria ter ocorrido em 29.1.2013. Alega que o autor descumpriu totalmente o plano de manutenção do veículo, perdendo o direito de reclamar qualquer atendimento em garantia contratual a partir de 29.12.2012. A partir desta data o autor começou a contar com a garantia legal de 90 dias, que expirou em 29.3.2013. O autor recebeu o manual de garantia e manutenção, onde consta de forma clara e precisa os termos para usufruir da garantia, com todos os direitos e ônus a ela inerentes, em estrita observância ao disposto no art. 50, § único do CDC. Menciona novamente fls. 19 da inicial. Aduz que tal manual é importante, pois estão registrados a data de entrega e da venda do veículo e o início do período de garantia e, nos locais apropriados, registram-se a execução dos serviços. Esta comprovação de serviços servirá como principal documento ao direito de garantia (cita novamente fls. 20 da inicial). É admissível uma tolerância, para mais ou para menos de 1.000 Km nos serviços executados por quilometragem e de 1 mês nos executados por tempo. Cita os itens “V” e “VI” das condições da garantia, ou seja, a necessidade de que todas as manutenções, reparos e regulagens tenham sido executados por concessionário Volkswagen, observados as quilometragens e tempos já explicitados; e que a não execução das manutenções previstas no manual dentro destes parâmetros enseja a extinção da garantia. O autor descumpriu totalmente o plano de manutenção, não lhe assistindo qualquer razão sobre eventuais prejuízos de ordem material ou moral. Ressalta que o próprio autor comprovou o descumprimento no que tange à obrigação de fazer as revisões nos prazos determinados (fls. 19/20) ferindo, claramente, o disposto no art. 476 do CC. Entende que resta totalmente comprovada a ausência de justa causa dos pedidos do autor, inexistindo qualquer respaldo legal, devendo a ação ser julgada improcedente. Quanto aos danos materiais, o autor pretende ressarcimento no valor de R$ 4.350,00, relativos a serviços e peças. A ré esclarece que somente o motor possui 3 anos de garantia, desde que obedecidas as condições do contrato de garantia. Como já explicado, o autor perdeu o direito à garantia, tanto a contratual, quanto a legal, desde 29.3.2013. Ademais, diversamente do apontado pelo autor, os itens reclamados à fls. 25 – atuador – possui 1 ano de garantia, e à fls. 26/7 – diagnóstico elétrico e lâmpadas – não são cobertos pela garantia, por ser considerado peça de desgaste natural. (fls. 19: 1 ano de garantia para o veículo completo, sem limite de quilometragem; e 3 anos para o conjunto motor e transmissão, sem limite de quilometragem). Lembra que o reparo foi autorizado pelo autor. Destaca ainda que no item “VI” do manual consta expressamente os serviços considerados de manutenção normal do veículo e as peças consideradas de desgaste natural, não se vislumbrando, então, qualquer hipótese de responsabilização da ré por qualquer valor cobrado indevidamente, eis que todas as peças e serviços de mão de obra, conforme conhecimento do autor, são de responsabilidade única e exclusiva do proprietário do veículo, seja pelo desgaste natural, seja pela extinção da garantia, que mesmo que tivessem sido cumpridos todos os termos e condições do contrato, era de um ano, a contar da aquisição do bem (29.6.2012). Assim, ausente o ato ilícito e o dano material, pressupostos elementares da responsabilidade civil. Aduz que as alegações do autor deveriam ter sido provadas quando da propositura da ação e, considerando que isto não ocorreu, está precluso seu direito, e não foi provado qualquer defeito de fabricação, eis que não foi juntado aos autos qualquer laudo neste sentido. Desta feita, há que se sopesar a possibilidade de indícios de culpa do autor decorrente da má utilização do veículo, bem como, o fato do veículo ter sido reparado, tornando impossível a realização de perícia técnica. Deve-se ainda considerar que um defeito de fabricação aparece nos primeiros meses de utilização e, no caso do autos, o inconveniente reclamado nunca teve qualquer registro de reclamação anterior, surgiu após mais de 3 anos de utilização, o que corrobora a inexistência de qualquer vício ou problema de fabricação. Ressalta que um suposto defeito de fabricação, conforme alegado, não pode ser presumido. Alega que o autor deixou de trazer elementos de provas suficientes para respaldar o seu pedido de reparo em garantia, pois sequer teve o interesse de juntar o inteiro teor do manual do veículo e, principalmente, no que tange ao seu alcance, prazo de vigência, condições e extinção. A ré, ao contrário, comprovou que o veículo já não estava mais coberto pela garantia. Já quanto ao dano moral, alega que não basta a alegação da ocorrência, deve haver a prova incontestável de que o eventual comportamento reprovável do agente causador do dano contribuiu de alguma forma para sua caracterização. O autor não demonstrou nenhuma situação ensejadora de qualquer prejuízo ou ofensa à sua pessoa, honra ou imagem, fundamentando seu pedido no fato de ter levado o veículo para reparo e ser negado o atendimento em garantia. Não há sequer uma passagem por atendimento médico ambulatorial a fim de ao menos demonstrar qualquer tipo de irritação suscetível de abalo psicológico ou emocional. A ré jamais humilhou, constrangeu ou envergonhou o autor. Deve ser analisado se de fato ocorreu o nexo causal entre o alegado dano, a culpa e a responsabilidade do suposto agente. A ré não agiu com qualquer grau de culpa ou causou o suposto dano ao autor. Não se há falar em responsabilidade indenizatória, eis que não poderá haver o desvirtuamento da teoria da responsabilidade civil, sob pena de estimular o enriquecimento indevido. Sustenta mais que não deve ser aplicada ao caso dos autos a regra da inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do CDC, pois tal regra não é aplicada automaticamente para os casos que envolvam relação de consumo, mas somente àqueles em que haja verossimilhança nas alegações do autor. Restou comprovado que a ré jamais praticou qualquer ação ou omissão ilícita que pudesse acarretar prejuízo ao autor, ou que tivesse descumprido qualquer condição da garantia contratual. Não restou comprovado na inicial qualquer defeito do produto. Foi demonstrado por meio documental a expiração do prazo de garantia contratual e legal e a autorização de forma livre e consciente dos reparos do veículo. O caso concreto não comporta a inversão do ônus da prova. Aduz que, caso alguma indenização venha a ser devida, os juros moratórios e correção monetária somente deverão incidir a partir da prolação da sentença que determinar o pagamento de alguma verba. Quanto aos juros de mora, devem ser contados a partir do seu arbitramento. Não estando definida e nem sido acolhida em seu precisos termos pela decisão, os juros de mora devem ser contados a partir da decisão que declara a importância devida ou arbitra o valor, (art. 407 do CC). Portanto, somente pode ser considerado em mora aquele que sabe o quanto deve, mesmo porque, antes de se definir o quanto devido, o obrigado não tem sequer como cumprir sua obrigação, não havendo, portanto, como se lhe impor sanção. Sabe-se que nas obrigações ilíquidas, há necessidade de prévia liquidação. Logo, sem prévia liquidação não se pode falar em constituição. Por fim, quanto aos honorários advocatícios, entende que seu valor deve ser fixado pelo juiz, que possui a faculdade de arbitrar a respectiva percentual sobre o valor da condenação em conformidade com o art. 20 do CPC.Fls. 72: REQUERIMENTOS.1. improcedência da ação, condenando-se o autor ao pagamento das despesas processuais, honorários advocatícios, despesas com assistentes técnicos e outra de praxe;2. provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos. Fls. 82/114: CONTESTAÇÃO DA COMERI LITORAL COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA – COM PRELIMINAR – COM DOCUMENTOS.Em preliminar alega carência da ação – falta de interesse processual, posto que o problema no motor do veículo não decorre de vício ou defeito, mas sim da inobservância do plano de manutenção periódica constante no manual do fabricante para o modelo VW Fox. Considerando que o termo inicial da garantia é a data da nota fiscal (29.6.2012), o primeiro serviço de revisão deveria ter sido realizado aos 10.000 Km ou até 29.12.2012. Entretanto, o autor só realizou a revisão em 13.2.2013, ultrapassando inclusive a tolerância de 1 mês prevista no manual, suportando em razão de sua negligência a perda da garantia da fabricante. Daí porque cumpria ao autor pagar pelo reparo do veículo, restando evidente a falta de interesse processual para pleitear reparação de danos de qualquer natureza. Pede a extinção, sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC.No mérito, esclarece que os R$ 550,00 pagos pelo autor à concessionária em 8.6.2015 se referem ao serviço de elétrica (R$ 298,50), troca de lâmpadas (R$ 172,50) e diagnóstico eletrônico (R$ 79,00), ocasião em que não foi identificado problema no câmbio do veículo. Posteriormente, quando o autor retornou em 10.6.2015 é que foi identificado o problema no “posicionador de marchas” e “cilindro retentor”, peças que não estavam cobertas pelo período de garantia de 3 anos, mas sim sujeitas à garantia geral de 1 ano, razão pela qual a fabricante Volkswagen não autorizou o reparo em garantia. Destaca mais que o plano de manutenções periódicas não foi observado, pois a primeira revisão deveria ter sido realizada em 6 meses ou 10.000 Km, o que ocorresse primeiro, a contar da data da nota fiscal (29.6.2012), mas o autor só efetuou o serviço em 13.2.2013. Sequer foi observada a data limite de tolerância, conforme observação no manual da garantia. Por esta razão é que foi cobrado o valor de R$ 3.800,00 e, tanto o autor tinha ciência de que havia dado causa à perda da garantia, que pagou o valor sem qualquer ressalva ou objeção. De outro lado, o veículo do autor não apresentou nenhum vício ou defeito, mas sim manutenção compatível com o tempo de uso, contando com mais de 48.000 Km rodados na época do reparo, ou seja, não se mostrou impróprio ou inadequado. Afirma não ter praticado qualquer ilícito realizando o reparo contratado e autorizado pelo autor, enquanto que a garantia foi negada pela fabricante, quer porque o plano de manutenção se encontrava irregular, quer porque o componente substituído se submetia à garantia geral de 1 ano, há muito transcorrida naquela ocasião. Alega ser impossível ao autor se socorrer dos arts. 12 e 18 do CDC. Também não é caso de falha no serviço prestado pela concessionária que prestou assistência técnica ao autor e, quando identificado o problema, abriu procedimento junto à fabricante a fim de averiguar, recebendo como resposta a negativa da garantia em razão da inobservância do plano de revisões periódicas. Sustenta que o autor só compareceu para realizar a primeira revisão após esgotada a tolerância, assumindo, dessa forma, o risco de utilizar o veículo sem a devida manutenção programada, o que não pode ser imputado à concessionária, nem à fabricante por força do art. 12, § 3º, III, do CDC. Ressalta que deve ser considerado que o componente substituído no veículo do autor não era coberto pela garantia de 3 anos, mas sim de 1 ano, já que não se tratava de peça do câmbio/transmissão, mas sim item externo (posicionador de marchas e cilindro retentor). Afirma que, de um jeito ou de outro, o autor não tinha direito à garantia da fabricante. Assim, a cobrança pelo reparo do veículo não configura prejuízo ilícito ou indevido ao autor, afastando a pretensão indenizatória de danos, porque ausentes os elementos do art. 186 do CC. Ausente o prejuízo, a conduta ilícita ou antijurídica por parte da contestante e o nexo de causalidade, o pedido indenizatório de danos materiais deve ser julgado improcedente. Quanto aos pretendidos danos morais, alega que o autor não demonstrou a ofensa a direitos da personalidade ou à dignidade da pessoa humana, limitando a questão à esfera dos meros aborrecimentos, que não autorizam o pedido reparatório porque compatíveis com a vida moderna. Ademais, aduz que o STJ já cimentou entendimento de que o inadimplemento contratual não dá lugar à reparação de danos morais. Ressalta que o autor deu causa à perda da garantia, pretendendo verdadeiro enriquecimento ilícito, agindo contra fato próprio em manifesta ofensa à boa-fé. Todavia, na improvável hipótese de acolhimento do pedido indenizatório de danos morais, pede sejam observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando o enriquecimento ilícito do autor.Fls. 91: REQUERIMENTOS:1. requereu que receba a presente contestação, acolhendo a preliminar arguida;2. não sendo acolhida a preliminar requereu que julgue improcedente o pedido, pelas razões deduzidas e com os subsídios que o emérito Julgador certamente acrescentará, condenando o autor pelo litigância de má-fé, no ônus da sucumbência, inclusive honorários advocatícios;3. provar o alegado pelos documentos anexos e por todos os meios de prova em direito admitidos.Fls. 117/126: RÉPLICA.Quanto à preliminar, afirma que o interesse processual sobressai de ter ele, autor, imputado às rés parcela de conduta determinante do prejuízo materializado, o que reclama um exame da relação substancial da ação. O remédio jurídico eleito é necessário e adequado à realização do pedido deduzido na inicial, estando preenchidas todas as condições da ação. A preliminar deve ser afastada, pois se confunde com o mérito da ação, e com ele será decidida.Relativamente à aplicação do CDC, observa que as rés não negam que a relação jurídica estabelecida entre as partes está sujeita ao CDC, posto que fornecedoras de produtos e prestadoras de serviço. Reitera pela aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, haja vista a verossimilhança dos fatos alegados e a hipossuficiência do autor.No mérito, alega que adquiriu em 29.6.2012 um veículo zero Km. Certo é que quem compra um carro zero Km espera se utilizar dele por um longo período sem que sofra qualquer interferência, mas não foi o que ocorreu. As rés sustentam suas defesas unicamente no fato de que a primeira revisão efetuada pelo autor ocorreu alguns dias após expirado o prazo e que por isso, ele teria perdido o direito de ser atendido em garantia, conforme previsão contratual. Afirmam também que as cobranças efetuadas foram corretas, tendo o autor ciência de que dera causa à perda da garantia. Entretanto, o autor alega que efetuou todas as revisões na concessionária, não faltando uma sequer, e que todas elas foram feitas sem qualquer ressalva quanto à perda do direito de garantia. Defende que essa comunicação era vital, pois se ele havia perdido a garantia, já na primeira revisão, poderia a partir daí fazer as revisões fora da concessionária. Alega que é de conhecimento público que as revisões em concessionárias sempre têm custo muito elevado, bastante superior aos de boas oficinas do ramo, e se não havia mais garantia, essa certamente seria a opção do autor. Destaca que até o momento da última revisão realizada pelas rés em 5.5.2015, o veículo não apresentava nenhum defeito, tanto que nada neste sentido foi alegado por elas. Alega que o veículo passou por todas as revisões na concessionária e após a última, quase imediatamente, apresentou vários problemas elétricos, gerando a cobrança de R$ 550,00. “Não nega as rés que este é um problema coberto pela garantia”. As rés alegam que troca de lâmpadas não são cobertas pela garantia, mas a troca não decorreu do uso, e sim de problemas elétricos que não foram a tempo e modo verificados por elas, o que levou à queima e necessidade de troca. Aduz ainda que elas não negam que o valor pago de R$ 3.800,00 se refere a itens cobertos pela garantia, apenas que o autor perdeu a garantia pela não realização da primeira revisão no prazo. Destaca mais que a ré Comeri afirma que a garantia foi negada pela fabricante Volkswagen, juntando documento neste sentido (fls. 111 e 114), isso quando já havia dito ao autor que o problema estava coberto pela garantia. Alegam, tentando desviar da obrigação, que um dos componentes substituídos (relativo ao valor de R$ 3.800,00) teria garantia de 1 ano, por ser item externo e não peça de câmbio/transmissão. Ressalta que nenhuma das rés afirmou que os problemas noticiados na inicial são decorrentes da não realização da primeira revisão no prazo, menos ainda que os defeitos encontrados possam ser imputados ao autor, inclusive porque em momento algum alegaram eventual mau uso do produto. O fato de a primeira revisão ter sido feita alguns dias fora do prazo em nada altera a culpa das rés, que fizeram todas as revisões sem qualquer ressalva quanto à garantia e sem verificar qualquer problema no veículo. As rés sustentam ainda a inexistência de defeito e que ao autor caberia a prova dele. Nada mais absurdo frente as regras do CDC. E os documentos que instruem a inicial dão conta da existência do defeito e da necessidade de correção. Deve também ser observado o fato de o fornecedor responder pelo vício oculto do produto, ainda que ele se manifeste após o prazo de garantia contratual, haja vista o dever de observância da vida útil do produto, no caso, um veículo com menos de 3 anos de uso. Indiscutível que o autor suportou e suporta danos morais e materiais de grande monta, tendo direito de ser indenizado pelo dano material que se traduz no prejuízo resultante da perda ou depreciação de uma coisa e da identidade física da pessoa e, pelo dano moral que é o prejuízo resultante da ofensa à sua integridade psíquica e sua personalidade num todo. Também não se pode perder de vista que o autor teve violada a justa expectativa e confiança depositada nas rés, que agiram ilicitamente, e isso basta para ensejar a devida reparação pelos danos extrapatrimoniais. Reitera pela total procedência, nos exatos termos da inicial. Fls. 128/129: DECISÃO: “Digam as partes, em dez dias, se têm outras provas para produzir, pormenorizando-as e justificando a necessidade e a utilidade do meio por acaso pretendido. Caso a parte pretenda produzir prova oral, caber-lhe-á indicar precisamente a necessidade e a utilidade, para justificar a designação de audiência com essa finalidade. Requerimento genérico, sem demonstração da necessidade e da utilidade, não será aceito. Igual entendimento se dá em relação à prova pericial. Se as partes apresentarem manifestação no sentido de não terem mais provas para produzir, certifique-se e abra-se a conclusão na lista de SENTENÇAS. Se, por sua vez, houver especificação de provas nos moldes acima determinados, abra-se a conclusão na lista de DECISÕES.”Fls. 131: Manifestação do autor requereu designação de audiência. Não sendo este o entendimento de Vossa Excelência, pretende o depoimento pessoal das partes contrárias, oitiva de testemunhas, juntada de novos documentos , expedição de ofícios e perícia.Fls. 132: Manifestação da ré VOLKSWAGEN informou que não tem mais provas a produzir. Fls. 133: CERTIDÃO (que não houve manifestação da ré COMERI).Fls. 133: DECISÃO: “Ao Cejusc, visando à conciliação. Se não houver acordo, será deliberado sobre as demais questões.”. Fls. 143: TERMO DE AUDIÊNCIA – CONCILIAÇÃO INFRUTÍFERA. Fls. 144: CERTIDÃO (que nada mais foi requerido ou apresentado, e que não foram apresentada provas). Esse é o relatório.Passo a fundamentar, para justificar a conclusão.*Cuida-se de relação genuinamente de consumo, em que incide o princípio da ampla proteção do consumidor, a começar pela admissão da responsabilidade solidária e objetiva entre a montadora do veículo e a concessionária de vendas. Se o veículo apresentar problemas dentro do prazo contratual de garantia e não tiver sido suficientemente reparado pela garantia, determina-se a responsabilidade solidária das rés, como de fato ocorre.É que não se pode aceitar a alegação de o consumidor ter perdido a garantia automaticamente porque deixou de realizar a primeira revisão dentro do prazo, quando a quilometragem ainda não havia atingido o limite estabelecido e o atraso, considerando o tempo de tolerância, não excedeu a um mês. Ademais, não consta que o consumidor tenha sido claramente informado acerca desse perdimento por ocasião do evento que o teria deflagrado, de tal maneira que as rés agiram reiteradamente como se a perda não tivesse ocorrido, gerando legítimas expectativas a ele que não podem, a esta altura, ser desconsideradas. Dito de outro modo, incide a proibição do venire contra factum proprium. Por outro lado, por disposição da lei, havendo alegação de vício do produto, cumpre ao fornecedor provar que o vício não existe ou que foi adequadamente reparado, não se cogitando, pois, de inversão judicial de ônus de prova, mas sim de atribuição legal. Por isso mesmo, cumpria às rés a demonstração nesse sentido, algo que não houve. Seja como for, o reparo foi efetuado, o que conduz à inevitável conclusão de o defeito ter existido. A divergência essencial diz respeito à cobertura ou não pela garantia contratual de três anos. E também não existe dúvida acerca de o defeito ter sido sentido no curso dessa garantia (que, conforme consta acima, não se extinguiu automaticamente com o fato de a primeira revisão ter sido realizada alguns dias depois do vencimento do prazo pré-fixado, já considerando o tempo de tolerância, que era de um mês). Demais disso, não existe nos autos minimamente elemento que justifique a conclusão de o defeito ter decorrido de mau uso do veículo, situação que não se presume, em vez disso, deve ser demonstrada de forma irrefutável.Aliás, no que atina ao ônus da prova, de acordo com o que foi dito atrás, as rés, instadas à indicação do meio preciso e justificado que ainda teriam para produzir, não o fizeram, a montadora declarando expressamente que não pretendia produzir mais provas e a concessionária optando pelo silêncio, o que implicou aceitação tácita com o julgamento desde logo do mérito, tanto que, infrutífera a conciliação tentada pela Cejusc, os autos foram incluídos na lista de sentença, sem oposição, notadamente dessa ré. Portanto, está caracterizado o dever das rés, em regime de solidariedade, de efetuarem o reembolso ao autor no que atina ao valor gasto com o reparo do veículo, devendo esse reembolso se dar na forma simples, eis que se tratou de equívoco na interpretação de regime legal e contratual, não se visualizando má-fé do fornecedor ou culpa grave. Significa isto dizer que a desavença consistiu em definir o significado e o alcance da garantia contratual em face do comportamento das partes durante sua vigência. Quanto ao dano moral, é in re ipsa (ou ipso facto ou do próprio fato), sem que haja necessidade de prova específica (para o STJ cuida-se de dano que se presume). Por seu turno, a quantia indicada pelo autor (vinte salários mínimos na data de hoje) é suficiente à dupla função a que a indenização se destina, de punir o ofensor e de amenizar para o ofendido. Ademais, tendo em vista que esse valor é tomado em conta nesta data, para os efeitos acima destacados, a correção monetária pela tabela oficial do tribunal será a partir desta ocasião; já os juros de mora, em relação contratual, como de fato ocorre, contam-se da citação, sendo a taxa a de doze por cento ao ano. Assim, julgo procedente o pedido. Com efeito, condeno as rés, solidariamente, ao pagamento ao autor, em reembolso, da importância de R$ 4.350,00 (somatório dos valores históricos desembolsados), corrigida pela Tabela do TJSP desde os desembolsos e acrescida de juros de mora de doze por cento ao ano, contados da citação, bem como ao pagamento, em indenização por dano moral, da quantia de R$ 18.740,00, corrigida a contar deste mês da prolação da sentença e acrescida de iguais juros de mora, também contados da citação.Condeno, por conseguinte, a parte vencida, também solidariamente, ao pagamento das custas, das despesas processuais e de honorários advocatícios de dez por cento do valor da condenação.Quanto a recurso, agora o controle total acerca do cabimento e da admissibilidade é do Tribunal, incumbindo ao recorrente, em relação ao preparo, observar a Lei estadual n. 11.608/03 (com os acréscimos dados pela Lei n. 15.855/15), quer no que pertine à base de cálculo
Advogados(s): Quezia Oliveira Freiria Simoes (OAB 115395/SP), Obed de Lima Cardoso (OAB 137795/SP), Paulo Eugenio de Araujo (OAB 228660/SP), Walter Maria Parente de Andrade (OAB 61769/SP), Matheus Rodrigues Feldberg (OAB 274693/SP), Juliana Fonseca de Almeida (OAB 290603/SP)

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