Escola de samba Filhos da Ilha será indenizada pela empresa Rumo
No exato momento em que a escola de samba Filhos da Ilha ia iniciar o seu desfile, um trem da empresa ALL América Latina Logística Malha Sul S/A (atualmente denominada de Rumo) cruzou o caminho dos foliões, causando pânico e um atraso de 20 (vinte) minutos. O fato inusitado ocorreu na cidade de São Francisco do Sul, no estado de Santa Catarina, no carnaval do ano de 2013.
A ferrovia corta parte da avenida, entretanto, a empresa responsável pelo transporte ferroviário (ALL América Latina Logística Malha Sul S/A) se comprometeu, com a prefeitura municipal de São Francisco do Sul, a interromper os serviços durante o carnaval, no entanto, não cumpriu o que foi acordado e surpreendeu a todos.
Segundo o que consta nos autos, apenas cerca de metade dos integrantes da escola de samba conseguiu desfilar, tendo em vista que a outra metade foi bloqueada pelo trem. “Além do transtorno”, de acordo com a demanda judicial, “muitas pessoas chegaram a pular pelo espaço entre os vagões, colocando suas vidas em risco”. Para piorar, com fantasias pesadas, os integrantes da escola de samba Filhos da Ilha não conseguiam se movimentar com agilidade.
Por força deste acontecimento, a escola de samba Filhos da Ilha terminou em último lugar e entrou com demanda judicial na Justiça estadual de Santa Catarina. Pugnou por uma indenização a título de danos morais e materiais, bem como por uma indenização pela perda de uma chance. A juíza de direito do primeiro grau acatou o pedido autoral em parte e condenou a ALL América Latina Logística Malha Sul S/A ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por abalos morais.
Ambas as partes apelaram ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina. A escola de samba pediu a majoração da indenização maior e ainda insistiu nos danos patrimoniais. Para tanto, comprovou a contratação de 180 (cento e oitenta) integrantes para compor as alas, incluindo mestre sala, porta bandeira e bateria. O objetivo seria “aprimorar o desfile e concorrer à premiação”. Desta forma, pugnava por uma indenização pela perda de uma chance. Ou melhor, em tese, a parte autoria poderia ter sido a campeã e ter recebido o prêmio.
Entretanta, a empresa ALL responsável pelo funcionamento do trem pugnou pelo afastamento da condenação em indenização a título de danos morais: “a escola já havia sido última colocada no carnaval passado e, agora, por ter estado novamente na última colocação, quer responsabilizar a empresa por isso, a qual em nada contribuiu para os não comprovados fatos alegados neste processo”. Sustentou também que não poderia interromper o transporte ferroviário, tendo em vista que tal fato ocasionaria grandes atrasos no Porto de São Francisco do Sul.
No entanto, conforme o relator do recurso de apelação, desembargador Selso de Oliveira, restou comprovado que parte dos integrantes da escola de samba não pôde desfilar e que a ALL descumpriu com o acordo. “Assim, verificado o nexo de causalidade entre a conduta da ré e os danos suportados pela autora, mister se faz a condenação também ao pagamento de indenização pelos danos materiais, no valor de R$ 25.500, corrigidos monetariamente”.
Portanto, o relator Oliveira aumentou a indenização a título de abalos morais para R$ 13.000,00 (treze mil reais). Ao todo, a ré ALL América Latina Logística Malha Sul S/A terá que realizar um pagamento de R$ 38.500,00 (trinta e oito mil e quinhentos reais) à escola de samba Filhos da Ilha.
O desembargador ora relator, entretanto, não acolheu o pedido de indenização pela perda de uma chance, “porque não há como se afirmar com segurança que a autora tinha reais possibilidades de vencer o desfile”.
A decisão foi unânime. Além do relator, participaram do julgamento o desembargador José Agenor de Aragão e a desembargadora Bettina Maria Maresch de Moura.
Apelação Cível: 0300444-40.2014.8.24.0061 – Acórdão (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC)
Ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (DANOS EMERGENTES E PERDA DE UMA CHANCE). LOCOMOTIVA E VAGÕES PERTENCENTES À RÉ QUE OBSTRUEM A PASSAGEM DE INTEGRANTES DA ESCOLA DE SAMBA AUTORA NO MOMENTO DO DESFILE DE CARNAVAL DE SÃO FRANCISCO DO SUL/SC. EMPRESA CONCESSIONÁRIA QUE SE COMPROMETERA INTERROMPER OS SERVIÇOS DURANTE O EVENTO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.
RECURSO DA AUTORA.
PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA RÉ EM DANOS MATERIAIS. VALORES GASTOS NA CONTRATAÇÃO DE INTEGRANTES PARA COMPOSIÇÃO DAS ALAS DO DESFILE. ACOLHIMENTO QUE SE IMPÕE. DANOS DEVIDAMENTE COMPROVADOS.
INDENIZAÇÃO PELA PERDA DE UMA CHANCE. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE SÉRIA E REAL POSSIBILIDADE DE ÊXITO. MERA EXPECTATIVA DE VENCER QUE NÃO GERA DIREITO AO PAGAMENTO.
RECURSO DA RÉ.
PLEITO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO QUANTO AOS DANOS MORAIS. INSUBSISTÊNCIA. CONDUTA QUE RESULTOU POR OFENDER A HONRA OBJETIVA DA AUTORA.
TESE COMUM.
PRETENSÃO DE MINORAÇÃO DO QUANTUM FIXADO A TÍTULO DE DANOS MORAIS PELA RÉ, E DE MAJORAÇÃO PELA AUTORA. MAJORAÇÃO VIÁVEL. OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
JUROS DE MORA QUE SE CONTAM DO EVENTO DANOSO, NOS TERMOS DA SÚMULA STJ Nº 54. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO.
HONORÁRIOS RECURSAIS. INVIABILIDADE. SENTENÇA PROFERIDA ANTERIORMENTE À ENTRADA EM VIGOR DO CPC/2015. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 7, DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSOS CONHECIDOS. APELO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO.
RECURSO DA RÉ DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação Cível n. 0300444-40.2014.8.24.0061, de São Francisco do Sul, rel. Des. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 15-08-2019).