Uma paciente de 25 (vinte e cinco) anos que teve uma gaze esquecida em seu abdômen depois de passar por cesariana, em hospital da Grande Florianópolis, no estado de Santa Catarina (SC), será indenizada em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) a título de danos morais e estéticos.
A decisão de primeira instância foi confirmada em julgamento do recurso de apelação pela Quinta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina – TJSC. A mulher precisou, por este fato, ser submetida a uma nova cirurgia para a retirada da gaze, que lhe causou grave inflamação intestinal.
A cesárea foi realizada no ano de 2018. Passados 6 (seis) meses, com dores abdominais que intensificavam cada vez mais, a parte autora buscou socorro no hospital. Ao realizar uma ultrassonografia, descobriu-se a presença de um “corpo estranho” em seu abdômen, posteriormente identificado como um pedaço de gaze.
Para a retirada do material e contenção da inflamação intestinal que se instalou, foi realizada uma nova cirurgia que também trouxe sequelas. Essa nova operação deixou uma cicatriz transversal à cicatriz da cesariana, razão pela qual a mulher também postulou reparação por dano estético. Além da indenização, o hospital foi condenado a custear posterior cirurgia plástica em favor da parte demandante.
Apelação n. 0300012-13.2019.8.24.0007/SC – Acórdão
(Com informações do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina – TJSC)
EMENTA
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – FALHA NO SERVIÇO DE SAÚDE – CORPO ESTRANHO (GAZE) DEPOSITADO NO ABDÔMEN DA AUTORA APÓS CESARIANA – DANOS MORAIS E ESTÉTICOS – IRRELEVÂNCIA DA DISTINÇÃO – ESTIMATIVA GLOBAL BEM DOSADA – PREJUÍZOS MATERIAIS NÃO DEMONSTRADOS – CUSTOS DE FUTURA CIRURGIA PLÁSTICA A SEREM DEFINIDOS EM LIQUIDAÇÃO – FALTA DE PROVA QUANTO À NECESSIDADE DE TRATAMENTO PSICOLÓGICO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A autora foi submetida a cesariana e poucos meses depois, ao se deparar com muitas dores abdominais, se revelou a presença de corpo estranho (uma gaze) aderido ao seu intestino, o qual restou inclusive perfurado. Foi internada e submetida a procedimento cirúrgico para remoção, permanecendo com cicatriz.
Prova firme quanto a tal evento, que torna certo o dever de indenizar.
2. Há danos morais e há danos materiais. Não existe uma terceira categoria, de danos estéticos. Na verdade, um prejuízo à imagem física gerará um prejuízo moral (por assim dizer, presumido), mas também poderá ocasionar (o que é menos frequente) um malefício material. Por sua vez, os danos materiais valem pela redução do patrimônio ou pela perda da perspectiva de incremento.
Seja como for, o dano estético deverá ser considerado para fins de quantificação dos danos morais, atendendo-se ao proposto pela Súmula 387 do STJ (que fala da cumulação de danos morais e estéticos).
3. A indenização a título de danos morais – orçada globalmente, isto é, já considerado o que decorre do dano estético – foi bem posta (R$ 40.000,00), pois mesmo sensíveis as consequências, deve-se ponderar que se está diante de responsabilidade objetiva. Em outros termos, é situação em que se impõe observar os dois ângulos: a autora padece consideravelmente, mas não se pode também propor que a Administração, gravada pela amplitude da responsabilidade sem culpa, indenize em patamares idênticos aos de um ato doloso.
4. Faltam provas, todavia, de que o fato tenha repercutido em prejuízos financeiros por conta de um cogitável afastamento do trabalho. A afirmação do perito nesse sentido prova que a autora assim se pronunciou, não que o enunciado seja verdadeiro.
5. Não se demonstrou a necessidade de tratamento psicológico.
6. Adequada a imposição para que o réu arque com os custos de futura cirurgia plástica – ainda que um tratamento cirúrgico para fins estéticos não faça retroceder por completo as marcas da sequela, a perita atestou ser possível que ao menos sejam amenizadas as consequências da falha médica -, relegando-se à fase de liquidação a apuração da estimativa financeira para o respectivo procedimento.
7. Ainda que ratificada a sucumbência recíproca estabelecida pela sentença, os honorários advocatícios deverão ser escalonadamente definidos em posterior liquidação do julgado (§ 4º, II), prioritariamente no patamar mínimo do art. 85, § 3º, do CPC.
8. Recurso fazendário desprovido; apelação da autora parcialmente provida para impor ao réu os custos com cirurgia plástica.
(TJSC, Apelação n. 0300012-13.2019.8.24.0007, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 11-04-2023).