Dia da Amazônia: em meio aos projetos de preservação do maior bioma brasileiro, no âmbito jurídico, os infratores estão sendo punidos?

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Dia da Amazônia: em meio aos projetos de preservação do maior bioma brasileiro, no âmbito jurídico, os infratores estão sendo punidos? | Juristas
Lívia Ferreira Maioli Soares é advogada especialista em Direito Constitucional do escritório Renata Franco, Sociedade de Advogados.

O dia da Amazônia é celebrado no dia 05 de setembro, e surgiu como meio de chamar a atenção da sociedade para este bioma, que é o maior bioma brasileiro. A data foi escolhida para homenagear a criação da Província do Amazonas por D. Pedro II em 1850 , hoje estado do Amazonas. A intenção é alertar a população sobre a destruição da floresta e incentivar a busca pelo desenvolvimento e utilização dos recursos que ela oferece com responsabilidade, para que tais recursos não se esgotem.

A Amazônia está presente em 9 (nove) estados do país , e corresponde a 49,29% do nosso território. Inclui a maior floresta tropical do planeta, e a maior bacia hidrográfica do mundo. Abriga milhares de espécies de animais e vegetais, matérias-primas para alimentos e medicamentos, e constitui uma importante fonte de biodiversidade, tornando o seu valor inestimável para a humanidade. É evidente a importância de se ter uma data com essa finalidade. No entanto, além de iniciativas como esta, são necessárias medidas que busquem soluções efetivas para a preservação do bioma.

Nessa esteira, há muitos projetos e iniciativas públicas e privadas, como o Amazônia Protege. O projeto foi idealizado pelo MPF em 2017, com o objetivo de combater o desmatamento ilegal na Floresta Amazônica brasileira. Ele conta com a parceria do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade(ICMBio) e da Universidade Federal de Lavras (UFLA).

Dia da Amazônia: em meio aos projetos de preservação do maior bioma brasileiro, no âmbito jurídico, os infratores estão sendo punidos? | Juristas

O projeto Amazônia Protege atua na propositura de ações civis públicas contra supostos responsáveis pelo desmatamento ilegal, através de dados de satélite e cruzamento de dados públicos. As informações estão disponíveis para consulta pública, e permitem que empresas que compram produtos provenientes da Amazônia deixem da fazê-lo ao saber que os mesmos são produzidos em áreas desmatadas ilegalmente. Os dados também podem auxiliar compradores de terras e órgãos públicos, para saberem se as terras a serem compradas ou regularizadas também foram alvo de desmatamento ilegal.

Isto posto, embora o projeto mereça o reconhecimento no tocante à efetividade em identificar as áreas desmatadas por satélites, sem a necessidade de estudos de campo, no âmbito jurídico, é possível afirmar que os desmatadores ilegais da Amazonia estão sendo punidos de fato?

Um estudo feito pelo Imazon publicado em junho de 2022 analisou mais de 600 (seiscentas) Ações Civis Públicas do Projeto, interpostas pelo MPF, que já haviam tido sentença proferida, e constatou algumas questões interessantes. A primeira conclusão é a de que os resultados foram limitados, dada a lentidão da justiça, rejeição dos laudos baseados em imagens de satélite, sem investigação de campo, e ainda, a rejeição de ações em que não foi possível a identificação dos réus.

Nas amostras analisadas, contatou-se que apenas 8% das ações tiveram sentença condenando o réu em primeira instância, ao passo que 78% foram extintas sem julgamento do mérito, dentre as quais estão as ações propostas contra réu incerto.

No tocante à indeterminação dos réus, porém, o STJ admitiu a possibilidade de citação por edital de réus desconhecidos nas ações decorrentes do projeto Amazonia Protege, por entender que não fere o devido processo legal. A decisão permite que as ações sigam em andamento mesmo sem identificação do réu, por entender que, nestes casos, nem sempre é possível identificá-los na fase pré-processual, o que pode ocorrer à medida que a ação é tramitada.

Além disso, considera-se importante o prosseguimento da ação sem réu identificado para que se determine, por exemplo, o embargo da área desmatada ilegalmente, para que receba o devido amparo diante da violação e danos sofridos, e para que se possibilite a identificação e responsabilização posterior de possuidores ou proprietários das terras alvos das ações, ainda que estes não tenham sido responsáveis pelo desmatamento, uma vez que o dano ambiental está vinculado ao imóvel (obrigação propter rem ).

Contudo, a questão que se coloca é se tal possibilidade, ainda que respaldada pelas razões acima expostas, de fato trará efetividade no alcance dos objetivos do projeto que é não apenas (i) a identificação das áreas desmatadas, como também (ii) a responsabilização dos causadores dos danos ambientais. Se a efetividade está no alcance de apenas um dos objetivos, restam bastante limitados os resultados do projeto. E mais. Se as ações não estão sendo efetivas na punição dos infratores, a identificação e embargo dessas terras não poderiam ser feitos no âmbito administrativo, sem onerar o Poder Judiciário? Possivelmente seriam melhores os resultados.

Não se pode negar a importância do projeto, porém é necessário analisar os caminhos percorridos e os resultados obtidos até o momento, para que as próximas etapas obtenham resultados mais significativos, sobretudo na punição dos desmatadores, para que tal prática seja efetivamente desestimulada.

*Lívia Ferreira Maioli Soares é advogada especialista em Direito Constitucional do escritório Renata Franco, Sociedade de Advogados.


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