A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou em R$ 100 mil o valor de indenização por danos morais contra a montadora Mitsubishi devido a lesões corporais permanentes decorrentes do acionamento de air bag em veículo dirigido por um desembargador aposentado. A decisão foi unânime.
Na ação de indenização, o desembargador afirmou que transitava com seu carro quando, ao desviar de uma pessoa que invadiu a pista, colidiu com um poste e, apesar da baixa velocidade no momento da batida, o air bag foi acionado. Devido ao impacto do dispositivo de segurança, ele alegou ter sofrido lesões no rosto, perda parcial de visão e glaucoma, o que o levou a ser submetido a diversas cirurgias.
O juiz de primeira instância estabeleceu compensação por danos morais no valor de R$ 400 mil, montante que foi reduzido para R$ 140 mil pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC).
Perícia
Por meio de recurso especial, a Mitsubishi buscou afastar integralmente a condenação. Em sua defesa, alegou que o processo de indenização foi proposto um ano e meio depois do acidente, o que impossibilitou a realização de perícia. Além disso, a montadora defendeu que os air bags, por sua própria natureza e função, submetem o usuário ao risco de lesões na face e nos olhos para protegê-lo da morte ou de danos corporais maiores.
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, apontou primeiramente que o fabricante tem o dever de colocar no mercado um produto de qualidade. Por isso, caso haja alguma falha em relação à segurança ou à adequação do produto em relação aos fins a que se destina, haverá a responsabilidade objetiva do fabricante pelos danos que o produto vier a causar, conforme prevê o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Valor proporcional
Todavia, segundo a ministra, a responsabilidade objetiva não dispensa a prova do dano e do nexo causal. Com base nos elementos juntados aos autos, o tribunal catarinense concluiu haver a responsabilidade da montadora pelo evento danoso e pelas consequências causadas ao autor da ação.
“O fato da utilização do air bag como mecanismo de segurança de periculosidade inerente não autoriza que as montadoras de veículos se eximam da responsabilidade em ressarcir danos fora da normalidade do ‘uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam’ (artigo 12, parágrafo 1º, II, do CDC)”, disse a relatora.
Em relação ao dano moral estabelecido pelo TJSC, a ministra entendeu que é correto o arbitramento de valor proporcional como compensação do prejuízo extrapatrimonial sofrido pelo consumidor e como forma de desestimular as práticas lesivas dos fabricantes.
“Por outro ângulo, a compensação financeira arbitrada não pode representar o enriquecimento sem causa da vítima”, concluiu a ministra ao fixar a indenização por danos morais em R$ 100 mil.
Leia o acórdão.
Processo: REsp 1656614
Fonte: Superior Tribunal de Justiça
EMENTA:
DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. SEGURANÇA. GRAVES LESÕES. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF. INTERESSE RECURSAL. QUESTÕES RESOLVIDAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. MECANISMO DE SEGURANÇA. RISCO INERENTE. PRODUTO DEFEITUOSO. EXCESSO. REVISÃO DO VALOR DA COMPENSAÇÃO. 1. Ação de indenização por dano material e compensação por dano moral ajuizada em 17.03.2009. Recurso especial atribuído ao gabinete em 25.08.2016. Julgamento: CPC/73. 2. O propósito recursal consiste em afastar a responsabilidade objetiva da Mitsubishi Motors Corporation decorrente de alegado dano ocasionado por fato de produto. 3. A existência de fundamento do acórdão recorrido não impugnado – quando suficiente para a manutenção de suas conclusões – impede a apreciação do recurso especial. 4. Ausência de interesse recursal da recorrente em questões já deferidas pelo Tribunal de origem. 5. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. 6. Considera-se o produto como defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele se espera, levando-se em consideração a época e o modo em que foi prestado, e no que mais importa para a espécie, os riscos inerentes a sua regular utilização. 7. O fato da utilização do air bag, como mecanismo de segurança de periculosidade inerente, não autoriza que as montadoras de veículos se eximam da responsabilidade em ressarcir danos fora da normalidade do “uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam” (art. 12, §1º, II do CDC). 8. É clara a necessidade de se arbitrar valor proporcional e estritamente adequado à compensação do prejuízo extrapatrimonial sofrido e ao desestímulo de práticas lesivas. Por outro ângulo, a compensação financeira arbitrada não pode representar o enriquecimento sem causa da vítima. 9. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, parcialmente provido para fixar definitivamente neste julgamento o valor da compensação pelo dano moral. (REsp 1656614/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 02/06/2017)