O STJ decidiu que as ações de reintegração em cargo público ajuizadas por ex-presos políticos da ditadura no Brasil são imprescritíveis, valendo, porém, a prescrição quinquenal de eventuais efeitos retroativos. Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso especial de um ex-servidor da Assembleia Legislativa do Paraná contra decisão do TJPR. Ele buscava sua reintegração ao cargo que ocupava e do qual foi desligado em decorrência de perseguição política.
A relatora do recurso afirmou que “o retorno ao serviço público, nessa perspectiva, corresponde à reparação intimamente ligada ao princípio da dignidade humana, porquanto o trabalho representa uma das expressões mais relevantes do ser humano, sem o qual o indivíduo é privado do exercício amplo dos demais direitos constitucionalmente garantidos”.
O TJPR tinha afastado imprescritibilidade do direito, dizendo que o servidor não foi declarado anistiado pela Comissão de Anistia. Entretanto, ao determinar o retorno dos autos para nova apreciação do tribunal, a ministra considerou a superveniência de fato novo, já que ele foi reconhecido como anistiado político pelo Ministério da Justiça em março de 2018.
A relatora ainda ressaltou a imprescritibilidade da reparação de danos, material ou moral, “decorrentes de violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar, período de supressão das liberdades públicas”.
Por fim, salientou que a imprescritibilidade não tem o condão de afastar a prescrição quinquenal sobre as parcelas eventualmente devidas ao ex-preso político. Para ela, “não se deve confundir imprescritibilidade da ação de reintegração com imprescritibilidade dos efeitos patrimoniais e funcionais dela decorrentes, sob pena de prestigiar a inércia do autor, o qual poderia ter buscado seu direito desde a publicação da Constituição da República”. (Com informações Superior Tribunal de Justiça.)
RECURSO ESPECIAL Nº 1.565.166 – PR (20150280295-9)RECURSO ESPECIAL Nº 1.565.166 – PR (20150280295-9)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRETENSÃO DE REINTEGRAÇÃO AO CARGO PÚBLICO, CUJO AFASTAMENTO FOI MOTIVADO POR PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. VIOLAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. PRISÃO E TORTURA PERPETRADOS DURANTE O REGIME MILITAR.
IMPRESCRITIBILIDADE DA AÇÃO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973.
II – Trata-se, na origem, de ação ordinária proposta por ex-servidor da Assembleia Legislativa do Paraná buscando sua reintegração ao cargo anteriormente ocupado, além dos efeitos financeiros e funcionais, com fundamento no art. 8º do ADCT e na Lei n. 10.559/02, sob a alegação de que seu desligamento ocorreu em razão de perseguição política, perpetrada na época da ditadura militar.
III – A Constituição da República não prevê lapso prescricional ao direito de agir quando se trata de defender o direito inalienável à dignidade humana, sobretudo quando violada durante o período do regime de exceção.
IV – Este Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de ser imprescritível a reparação de danos, material e/ou moral, decorrentes de violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar, período de supressão das liberdades públicas.
V – A 1ª Seção desta Corte, ao julgar EREsp 816.209/RJ, de Relatoria da Ministra Eliana Calmon, afastou expressamente a tese de que a imprescritibilidade, nesse tipo de ação, alcançaria apenas os pleitos por dano moral, invocando exatamente a natureza fundamental do direito protegido para estender a imprescritibilidade também às ações por danos patrimoniais, o que deve ocorrer, do mesmo modo, em relação aos pleitos de reintegração a cargo público.
VI – O retorno ao serviço público, nessa perspectiva, corresponde a reparação intimamente ligada ao princípio da dignidade humana, porquanto o trabalho representa uma das expressões mais relevantes do ser humano, sem o qual o indivíduo é privado do exercício amplo dos demais direitos constitucionalmente garantidos.
VII – A imprescritibilidade da ação que visa reparar danos provocados pelos atos de exceção não implica no afastamento da prescrição quinquenal sobre as parcelas eventualmente devidas ao Autor. Não se deve confundir imprescritibilidade da ação de reintegração com imprescritibilidade dos efeitos patrimoniais e funcionais dela decorrentes, sob pena de prestigiar a inércia do Autor, o qual poderia ter buscado seu direito desde a publicação da Constituição da República.
VIII – Recurso especial provido.
(STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 1.565.166 – PR (2015/0280295-9) RELATORA : MINISTRA REGINA HELENA COSTA RECORRENTE : JOSÉ MARCOS DE ALMEIDA FORMIGHIERI ADVOGADO : AURACYR AZEVEDO DE MOURA CORDEIRO E OUTRO(S) – PR005133 ADVOGADA : ANA PAULA SWIECH – PR043737 RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ PROCURADOR : EUNICE FUMAGALLI MARTINS E SCHEER E OUTRO(S) – PR010501 RECORRIDO : ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARANÁ ADVOGADOS : ROGÉRIO DISTEFANO – PR004952 EMANUEL DE ANDRADE BARBOSA – PR033069. Data do Julgamento: 26 de junho de 2018.)