O 2º Juizado Especial Cível da Comarca de Brasília (DF) condenou a empresa Tickets For Fun a devolver, em dobro, valor de taxas de entrega e conveniência cobrado de consumidores em venda de ingressos via internet. A exigência da taxa foi considerada ilegal e abusiva.
Os demandantes da ação judicial contaram que adquiriram, em plataforma digital, dois ingressos para o show da cantora Taylor Swift, em São Paulo, no valor total de R$ 1.028,00 (um mil e vinte e oito reais). Afirmaram que a compra foi realizada no sítio virtual da empresa demandada e que, ao emitir os bilhetes, a mesma cobrou R$ 178,00 (cento e setenta e oito reais) a mais a título de conveniência e entrega via e-mail.
A demandada, em sua contestação, afirmou que agiu dentro dos critérios legais, tendo em vista que é permitida a cobrança de taxas extras ao cliente que optar pela conveniência proporcionada pelo serviço de entrega disponibilizado via internet. Defendeu, ainda, que a estrutura montada para facilitar a venda de ingressos em plataforma digital possui elevado custo para o estabelecimento comercial.
Para o juiz de direito, a prática é considerada abusiva porque, pelo Código Civil, “as empresas que vendem ingressos celebram com o produtor do evento contrato de corretagem para intermediação da venda”. O julgador explicou que, por inexistir relação contratual direta entre a empresa de venda de ingressos (corretora) e o cliente, cabe à produtora do evento arcar com a remuneração da empresa intermediária.
No caso, de acordo com o juiz de direito, ao realizar a cobrança de taxas de entrega e conveniência, o fornecedor transferiu aos consumidores os custos da comercialização do ingresso. “Ademais, a taxa de entrega exigida é despropositada, vez que os ingressos foram encaminhados ao e-mail dos autores, medida que não acarretou custo extra à corretora”, destacou.
Dessa forma, diante do exposto, a empresa Tickets For Fun foi condenada a devolver aos demandantes a quantia de R$ 356,00 (trezentos e cinquenta e seis reais), equivalente ao dobro do que foi pago como taxa extra na venda dos ingressos.
Cabe recurso da decisão de primeira instância.
Processo: 0763431-83.2019.8.07.0016 – Sentença (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT)
Inteiro teor da sentença:
Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 2JECIVBSB |
Número do processo: 0763431-83.2019.8.07.0016
Classe judicial: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436)
AUTOR: ISABELA ALMEIDA BARROS, JOAO MARCOS GERTRUDES TAVARES
RÉU: T4F ENTRETENIMENTO S.A.
S E N T E N Ç A
Dispensado o relatório, nos termos do disposto no art. 38, caput, da Lei n.º 9.099/95.
Aplica-se à espécie o Código de Defesa do Consumidor e prerrogativas inerentes, dentre elas a inversão do ônus probatório, a plena reparação dos danos e a responsabilidade civil objetiva da empresa prestadora de serviços, que se aperfeiçoa mediante o concurso de três pressupostos: 1) defeito do serviço; 2) evento danoso; e 3) relação de causalidade entre o defeito do serviço e o dano (artigos 6º, VI e VIII e 14, “caput”, do CDC).
Segundo a inicial, em 22/10/2019 os autores adquiriram, via internet, dois ingressos para show musical, a ser realizado em São Paulo no dia 18/07/2020, pelo valor total de R$1.028,00 (um mil e vinte e oito reais), mas a ré cobrou indevidamente o valor de R$178,00 (cento e setenta e oito reais), a título de taxas de entrega e conveniência.
Dispõe o art. 722, do Código Civil: “Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”.
Nos termos do citado dispositivo legal, as empresas que vendem os ingressos celebram com o promotor ou produtor do evento contrato de corretagem, para a intermediação da venda dos respectivos bilhetes. E inexistindo relação contratual direta entre a empresa de venda de ingressos (corretora) e o consumidor, incumbe à empresa produtora do evento arcar com a remuneração da empresa intermediária (art. 725, do Código Civil).
No caso, ao cobrar taxa de conveniência, o fornecedor transferiu aos consumidores os custos da comercialização do ingresso, caracterizando prática abusiva, em desobediência ao artigo 39, do CDC, que dispõe:
“É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
[…]
IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais”.
Nesse contexto, importa ressaltar que a ré manteve exclusividade na venda de ingressos para o evento musical citado e, na hipótese, a compra e venda de ingressos pela internet não pode ser considerada mera conveniência. O Superior Tribunal de Justiça, em situação análoga, assim decidiu: “É abusiva a venda de ingressos em meio virtual (internet) vinculada a uma única intermediadora e mediante o pagamento de taxa de conveniência” (STJ. 3ª Turma. REsp 1.737.428-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/03/2019 – Info 644).
Ademais, a taxa de entrega exigida é despropositada, vez que os ingressos foram encaminhados ao e-mail dos autores, medida que não acarretou custo extra à empresa ré. Por conseguinte, forçoso reconhecer que os autores desembolsaram indevidamente a quantia de R$178,00 (cento e setenta e oito reais) e, em face da natureza da obrigação, cabível a incidência do art. 42, parágrafo único, do CDC, para a devolução em dobro do valor cobrado indevidamente, equivalente a R$356,00 (trezentos e cinquenta e seis reais).
Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial para condenar a ré à obrigação de devolver aos autores a quantia de R$356,00 (trezentos e cinquenta e seis reais), a ser corrigida monetariamente desde o desembolso, acrescida de juros legais a partir da citação, extinguindo o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Deixo de condenar a vencida ao pagamento das verbas de sucumbência, por força legal (art. 55, da Lei nº 9.099/95).
Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, formulado pedido, intime-se a devedora para o pagamento da obrigação constituída, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena da multa prevista no art. 523, §1º, do CPC. Decorrido o prazo, adotar-se-ão as medidas constritivas cabíveis, ficando os credores cientes de que, frustradas as medidas empreendidas, o processo será arquivado (art. 51, da Lei n.º 9.099/95), sem prejuízo do desarquivamento, caso indicados bens penhoráveis, de titularidade da devedora. Observado o procedimento legal, arquive-se.
BRASÍLIA (DF), 31 de março de 2020.
Assinado eletronicamente por: MARGARETH CRISTINA BECKER 31/03/2020 16:30:54 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam ID do documento: 60381806 |