Por unanimidade, a Quarta Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), em matéria sob a relatoria do desembargador Helio David Vieira Figueira dos Santos, decidiu manter a sentença que condenou um médico na cidade de Florianópolis pela morte de uma criança, de 9 (nove) anos, depois de cirurgia para a retirada das amígdalas.
O médico indenizará a família da criança a título de danos morais no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais R$ 1.188,00 (um mil cento e oitenta e oito reais) por danos materiais e pensão no valor de 2/3 do salário mínimo, da data em que o jovem completaria 14 (catorze) anos até os seus 25 (vinte e cinco) anos de idade. A responsabilidade subjetiva do hospital foi afastada.
Para a retirada das amígdalas, o menino passou por cirurgia no dia 24 de maio de 2010 em unidade hospitalar privada. 7 (sete) dias depois do procedimento cirúrgico, o garoto teve um sangramento na garganta. Logo em seguida, o mesmo foi atendido em pronto-socorro, medicado e teve alta após o controle da hemorragia. No dia posterior, os genitores o levaram ao consultório do demandado para atendimento, onde permaneceram por mais de 2 (duas) horas, por cautela, embora não houvesse mais sangramentos.
No mesmo dia, por volta das 21 horas, o profissional médico recebeu uma ligação telefônica dos pais da criança, que afirmavam que o garoto apresentava novo sangramento. Ele recomendou que se fizesse um gargarejo com água e pediu que os pais verificassem se havia sangue. De acordo com o médico, a resposta foi negativa. Por volta da meia-noite, o demandado foi cientificado que o menino morrera sufocado no seu próprio sangue.
Condenado pelo juiz de direito Cláudio Eduardo Régis de Figueiredo e Silva, da 2ª Vara Cível da comarca da Capital – Continente, o profissional médico recorreu para reiterar que prestou todo o atendimento e apontou a conclusão do laudo pericial, que o isentou de qualquer responsabilidade. Os genitores também recorreram para pleitear a majoração do valor indenizatório, com base na tremenda dor pela perda de um filho.
Para os desembargadores, o demandado agiu com negligência no acompanhamento dos problemas que o paciente apresentou e, por isso, contribuiu para o resultado morte. “A meu juízo, o médico subvalorizou o risco. Ele conhecia esse risco e sua gravidade, pela sua formação especializada. Se esse risco é controlado em regime de emergência, com o paciente hospitalizado, é fácil concluir como poderia ficar fora de controle no caso concreto. A gravidade e o conhecimento da situação pelo médico, no meu entender, inclusive estão patenteados pelo fato de ter deixado o paciente em observação por duas horas em sua clínica”, concluiu o relator.
Participaram também da sessão os desembargadores José Agenor de Aragão e Selso de Oliveira. Cabe recurso aos tribunais superiores.
Apelação Cível n. 0005231-64.2010.8.24.0082 – Acórdão (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC)
Ementa
ERRO MÉDICO – AMIGDALECTOMIA – SANGRAMENTO PÓS-CIRÚRGICO OCORRIDO REPETIDO QUE OCORREU DIAS APÓS A CIRURGIA – MORTE DO PACIENTE QUE SE ENCONTRAVA EM CASA, ANTES DE CHEGAR AO HOSPITAL – ALEGAÇÃO DE NEGLIGÊNCIA DO MÉDICO EM DAR A ATENÇÃO DEVIDA À GRAVIDADE DO CASO – PERÍCIA QUE ISENTA O MÉDICO DE RESPONSABILIDADE – SENTENÇA, TODAVIA, DE PROCEDÊNCIA, QUE RECONHECE A CULPA DO CIRURGIÃO E FIXA INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA – RECURSO DAS PARTES. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CULPA E DE QUE O SANGRAMENTO É COMPLICAÇÃO CIRÚRGICA E QUE TODAS AS MEDIDAS ADEQUADAS FORAM TOMADAS PELO MÉDICO – REJEIÇÃO DOS ARGUMENTOS DO RÉU – GRAVIDADE DO SANGRAMENTO EM AMIGDALECTOMIA RECONHECIDA PELA LITERATURA MÉDICA – DOIS ÚNICOS EVENTOS TESTEMUNHADOS PELO CIRURGIÃO AO LONGO DE 27 ANOS DE PROFISSÃO QUE OCORRERAM NO PÓS-CIRÚRGICO, EM AMBIENTE HOSPITALAR – PACIENTE INFANTE QUE APRESENTOU SANGRAMENTO REPETIDOS DIAS APÓS A CIRURGIA E QUE, APESAR DE ATENDIDO PELO CIRURGIÃO, NÃO FOI MANTIDO EM AMBIENTE MONITORADO, COM SIMPLES RECOMENDAÇÃO DE QUE FOSSE LEVADO A UMA EMERGÊNCIA EM CASO DE RECIDIVA – SANGRAMENTO OCORRIDO À NOITE – LIGAÇÃO EFETUADA AO MÉDICO COM AQUELA RECOMENDAÇÃO – SANGRAMENTO QUE SE REPETIU – A CRIANÇA, LEVADA AO HOSPITAL COM URGÊNCIA, LÁ CHEGOU MORTA POR BRONCOASPIRAÇÃO – PERÍCIA JUDICIAL QUE NÃO VINCULA O MAGISTRADO – SUBVALORIZAÇÃO DO RISCO DE UM EVENTO FATAL POR PARTE DO MÉDICO – OBRIGAÇÃO DE MANTER A CRIANÇA EM AMBIENTE MONITORADO PARA O CASO DE EMERGÊNCIA – PAIS DA CRIANÇA QUE SE MOSTRARAM DILIGENTES E RESPONSÁVEIS DURANTE TODO O PROCESSO – CULPA DO MÉDICO NA MODALIDADE DE NEGLIGÊNCIA RECONHECIDA. DANO MORAL – VALOR ARBRITADO NA ORIGEM QUE SE MOSTRA ADEQUADO AO CASO EM TELA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. PENSÃO MENSAL – ALTERAÇÃO DO DIES AD QUEM DA SUA FLUÊNCIA – ACOLHIMENTO DO RECURSO DO RÉU NESTE PARTICULAR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS – MAJORAÇÃO DEVIDA – RECURSO DOS AUTORES PROVIDO NO PONTO. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
(TJSC, Apelação Cível n. 0005231-64.2010.8.24.0082, da Capital – Continente, rel. Des. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 30-01-2020).