E-mails trocados entre Loredana Albacete, proprietária da companhia aérea LaMia, e Simon Kaye, corretor de seguros da AON, demonstram que eles sabiam das proibições relativas às operações da empresa boliviana que transportou a Chapecoense no voo que vitimou 71 pessoas em novembro de 2016 na Colômbia. Os e-mails integram vários documentos disponibilizados ao Senado Federal.
Um dos trechos demonstra a negociação entre Albacete e Kaye para que a AON assegurasse a aeronave. O argumento utilizado foi uma série de voos futuros em decorrência do início da temporada dos times de futebol.
No e-mail, Loredana escreveu: “Odeio pressionar você com tempo quando eu tenho atrasado nas respostas, mas não tenho opções. Vamos ter de assinar o contrato na segunda para a viagem de 10 de abril. (…) Espero que você entenda. É um cliente com alto potencial para nós. Eles lidam com todos os times de futebol e a temporada está começando”.
O cliente seria a Off Side Logística, empresa carioca que intermediou negociações com a Chapecoense e outros clubes. Neste caso do e-mail, a viagem não ocorreu, porque o seguro não saiu a tempo.
Outro cliente perdido foi o time argentino Rosário Central, que viajaria para Medellín (Colômbia) em maio de 2016. No entanto, a Colômbia proíbe o sobrevoo de fretados em seu espaço aéreo por temor de atos terroristas de grupos guerrilheiros. Em geral, as seguradoras não fazem apólices para aeronaves que sobrevoam o destino, mas a LaMia conseguiu.
Em um e-mail, Kaye, representando a AON, deu sinal verde para a cobertura, dizendo que iriam “proceder para formalizar a indicação”, pois obtiveram suporte da cobertura aérea. No mesmo texto, ele discutiu uma queda no valor da cobertura para reduzir o custo da apólice: “Vamos investigar se tem alguma redução significante na cobertura entre US$ 25 milhões e 50 milhões, então você pode decidir qual o valor a comprar”. Ele ainda sugeriu a retirada de cobertura de seguro da tripulação, mas Loredana não aceitou.
Em seguida, a proprietária da LaMia agradeceu pelos “esforços gentis para uma solução viável em pouco tempo” e disse que estavam “aptos a obter as permissões para voarmos Venezuela e Bolívia sem os certificados”. Ela contestou o valor da cobertura e disse que US$ 25 milhões seria o limite.
A troca de e-mails demonstra a influência política da empresa no convencimento dos clubes para utilizarem sua aeronave. No mesmo sentido, comprova que a AON sabia que a companhia aérea circulava em espaço aéreo colombiano.
Atualmente, a corretora de seguros utiliza a proibição de voos fretados para a Colômbia como um dos argumentos para não dialogar com as famílias das vítimas para o pagamento de uma indenização.
Nos documentos, também é possível verificar que a AON, por meio de operação de resseguros no mercado de Londres, garantiu à Bisa, seguradora boliviana, a emissão da apólice com valores abaixo do mercado e com sugestões, como a retirada da tripulação da LaMia da cobertura. A Bisa, garantida pela AON, emitiu a apólice internacional para a LaMia, também ciente dos riscos. A Tókio Marine Kiln também é citada como resseguradora.
Para Abel Dias, consultor especialista em seguros contratado pela AFAV-C (Associação das Famílias de Vítimas do Acidente da Chapecoense), “a AON renova as apólices desde 2012, conhece o mercado de aviação, vinha com limite de 300 milhões de dólares e troca por uma de 25 milhões por qualquer motivo. Pense que o avião tivesse caído na cidade: US$ 25 milhões não cobrem as responsabilidades, já não cobre apenas com os passageiros; a AON conhece o risco, é a assessoria para seguros do cliente e oferece uma apólice menor”.
Apesar de terem sido convidadas para as audiências públicas no Senado e na Câmara, Bolívia, Colômbia e AON não compareceram. Os governos são cobrados pelo aceite do plano de voo, mesmo sabendo que não há seguro para voo fretado rumo à Colômbia, e pela irregularidade do planejamento de combustível.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a AON se manifestou ao UOL Esporte: “A AON atuou somente como corretora de resseguros, ou seja, intermediando e apoiando na colocação da proteção de resseguros para a companhia seguradora. Qualquer tratativa sobre indenizações e reclamações, e sobre as condições do programa de seguros, deve ser conduzida com o segurador do risco. A AON não comenta assuntos de clientes.”
(Com informações do Uol)
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