Foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça que a exigência de registro do contrato de alienação fiduciária em garantia no cartório de títulos e documentos e a respectiva anotação do gravame no órgão de trânsito não constituem requisitos de validade do negócio, tendo apenas o condão de torná-lo eficaz perante terceiros. Jurisprudência em Teses – Edição nº 80
Essa orientação consta do seguinte julgado:
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. TRADIÇÃO DO VEÍCULO. CONTRATO DE NATUREZA REAL. REQUISITO DE VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. ESCADA PONTEANA. ELEMENTOS ESSENCIAIS DO CONTRATO. NEGLIGÊNCIA DA PARTE AUTORA. MÁ-FÉ DA EMPRESA ALIENANTE. MATÉRIAS QUE DEMANDAM REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. VALIDADE DO CONTRATO. REGISTRO EM CARTÓRIO. ANOTAÇÃO NO CERTIFICADO DE REGISTRO DO VEÍCULO. NECESSIDADE APENAS PARA PRESERVAR DIREITOS DE TERCEIRO. SÚMULA 83/STJ. MORA DO DEVEDOR. NOTIFICAÇÃO PESSOAL. DESNECESSIDADE. ALEGAÇÃO DE VULNERABILIDADE E CABIMENTO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. SÚMULA 7/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não há falar em violação ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido resolve todas as questões pertinentes ao litígio, tornando-se dispensável que venha a examinar todos os argumentos trazidos pelas partes. 2. Em negócio de alienação fiduciária em garantia, por se tratar de contrato de natureza real, a tradição constitui requisito de validade do negócio jurídico. 3. A análise da pretensão recursal sobre a alegada ausência dos elementos essenciais do contrato, negligência da parte autora e má-fé da empresa alienante demandaria a alteração das premissas fático-probatórias estabelecidas pelo acórdão recorrido, com o revolvimento das provas carreadas aos autos, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos do enunciado da Súmula 7/STJ. 4. Impõe-se, no caso, a aplicação da máxima venire contra factum proprium, tendo em vista que parte recorrente primeiro anuiu ao prosseguimento do contrato e, em seguida, de modo oposto ao primeiro comportamento, questionou sua validade e existência. 5. A exigência de registro do contrato de alienação fiduciária em garantia no cartório de título e documentos e a respectiva anotação do gravame no órgão de trânsito não constitui requisitos de validade do negócio, tendo apenas o condão de torna-lo eficaz perante terceiros. 6. Nos casos envolvendo contrato de alienação fiduciária, a mora deve ser comprovada por meio de notificação extrajudicial realizada por intermédio do cartório de títulos e documentos, a ser entregue no domicílio do devedor, sendo dispensada sua notificação pessoal. 7. A alegação de vulnerabilidade e da presença dos requisitos necessários ao deferimento da inversão do ônus da prova encontram óbice na Súmula 7/STJ. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1190372/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe 27/10/2015)
O notário (ou tabelião) e o oficial de registro (ou registrador) são profissionais do direito, dotados de fé pública, que recebem delegação do Estado para o exercício das atividades notariais e de registro.
Os titulares de serviços notariais e de registro são os[1]: i) tabeliães de notas; ii) tabeliães e oficiais de registro de contratos marítimos; iii) tabeliães de protesto de títulos; iv) oficiais de registro de imóveis; v) oficiais de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas; vi) oficiais de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas; vii) oficiais de registro de distribuição.
Aos notários compete[2]: i) formalizar juridicamente a vontade das partes; ii) intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo; iii) autenticar fatos.
Aos tabeliães de notas compete, com exclusividade[3]: i) lavrar escrituras e procurações, públicas; ii) lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados; iii) lavrar atas notariais; iv) reconhecer firmas; e v) autenticar cópias.
A alienação fiduciária em garantia é um negócio que instrumentaliza outros contratos de mútuo ou financiamento, mediante a entrega de bens como garantia.
Este contrato pode ter por objeto bens móveis (fungíveis ou infungíveis) ou imóveis.
Só será admitida a alienação fiduciária em garantia de bem móvel fungível no âmbito do mercado financeiro, de capitais ou para garantir crédito fiscais ou previdenciários (lei nº 4.728/65, artigo 66- B).
Caso a alienação fiduciária em garantia tenha por objeto bem móvel fungível, nas condições indicadas, a mora gera o vencimento antecipado das prestações vincendas e autoriza a imediata busca e apreensão judicial do bem.
Nessa hipótese, a lei autoriza a venda da coisa pelo credor, independentemente de leilão, avaliação prévia ou interpelação do devedor.
Além disso, a retomada da posse só será admitida mediante pagamento integral das quantias devidas.
Se a alienação fiduciária em garantia disser respeito a bem móvel infungível, fora das hipóteses referidas, não serão admitidos os procedimentos específicos indicados.
Tratando-se de alienação fiduciária em garantia de bens imóveis, aplicam-se os artigos 22 e seguintes da lei nº 9.514/97, além das disposições contidas no Decreto-lei nº 911/69.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o instrumento de cessão fiduciária de direitos creditórios deve indicar, de maneira precisa, o crédito, e não o título objeto de cessão (Resp. 1797196)[4].
O caso trata da cessão de créditos no sistema de financiamento imobiliário, nos termos da lei n. 9.514/1997.
Uma das partes (banco) emitiu cédula de crédito bancário e emprestou a uma sociedade empresária do seguimento têxtil um milhão de reais.
O empréstimo foi garantido por instrumento particular de cessão fiduciária de duplicadas e direitos, registrado em cartório.
As sociedades recuperandas pretenderam o reconhecimento da invalidade do instrumento de cessão fiduciária, alegando que não houve a correta determinação dos títulos de crédito cedidos.
O ministro Bellizze esclareceu que a cessão fiduciária sobre títulos de crédito transfere a titularidade do crédito cedido e que este crédito precisa estar especificado apenas no instrumento contratual. Não há necessidade de especificação do título que, segundo o ministro, simplesmente representa o crédito, conforme previsão dos artigos 18, IV e 19, I, da lei n. 9.514/1997.[5]
É pacífico o entendimento do STJ também de que a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de créditos, não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial, conforme indicado no Art. 49, § 3º, da lei n. 11.101/2005.
O ministro Bellizze assinalou que seria “cada vez mais comum a suscitação de teses, por parte das empresas em recuperação judicial, destinadas a infirmar a constituição do negócio fiduciário, com o declarado propósito de submeter o aludido crédito ao concurso recuperacional de credores. ”
Além disso, a Terceira Turma já reconheceu que a constituição da propriedade fiduciária, oriunda de cessão fiduciária, dá-se a partir da contratação. E é desde este momento, portanto, plenamente válida e eficaz entre as partes.
Acerca da duplicata virtual e da falta de especificação do título, o ministro relator ponderou, ainda, que na ocasião da realização da cessão fiduciária seria possível que o título representativo do crédito cedido não tivesse sido emitido, o que inviabilizaria a sua determinação no instrumento contratual.
Ainda nesse sentido, o ministro demonstrou que a garantia da cédula de crédito bancário pode ser constituída por crédito futuro, também impossibilitando a especificação de um título que ainda não teria sido emitido (de acordo com a lei n. 10.931/2004).
O ministro relator afirmou que exigir a especificação do título (e não do crédito) equivaleria ignorar a própria sistemática da duplicada virtual, na qual a devedora fiduciante alimenta o sistema, com a emissão da duplicata eletrônica, gerando a seu favor um crédito cujo borderô é remetido ao sacado/devedor.
De acordo com o enunciado 28 da Súmula da Jurisprudência dominante do STJ, nada impede que a alienação fiduciária em garantia tenha por objeto um bem que já pertença ao devedor.
Enunciados das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal – CJF sobre registros públicos
Enunciado nº 86. A expressão “justo título” contida nos arts. 1.242 e 1.260 do Código Civil abrange todo e qualquer ato jurídico hábil, em tese, a transferir a propriedade, independentemente de registro.
Enunciado nº 95. O direito à adjudicação compulsória (art. 1.418 do novo Código Civil), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula n. 239 do STJ).
Enunciado nº 143. A liberdade de funcionamento das organizações religiosas não afasta o controle de legalidade e legitimidade constitucional de seu registro, nem a possibilidade de reexame, pelo Judiciário, da compatibilidade de seus atos com a lei e com seus estatutos.
Enunciado nº 201. O empresário rural e a sociedade empresária rural, inscritos no registro público de empresas mercantis, estão sujeitos à falência e podem requerer concordata.
Enunciado nº 202. O registro do empresário ou sociedade rural na Junta Comercial é facultativo e de natureza constitutiva, sujeitando-o ao regime jurídico empresarial. É inaplicável esse regime ao empresário ou sociedade rural que não exercer tal opção.
Enunciado nº 208. As normas do Código Civil para as sociedades em comum e em conta de participação são aplicáveis independentemente de a atividade dos sócios, ou do sócio ostensivo, ser ou não própria de empresário sujeito a registro (distinção feita pelo art. 982 do Código Civil entre sociedade simples e empresária).
Enunciado nº 209. O art. 986 deve ser interpretado em sintonia com os arts. 985 e 1.150, de modo a ser considerada em comum a sociedade que não tiver seu ato constitutivo inscrito no registro próprio ou em desacordo com as normas legais previstas para esse registro (art. 1.150), ressalvadas as hipóteses de registros efetuados de boa-fé.
Enunciado nº 214. As indicações contidas no art. 997 não são exaustivas, aplicando-se outras exigências contidas na legislação pertinente, para fins de registro.
Enunciado nº 218.: Não são necessárias certidões de nenhuma espécie para com provar os requisitos do art. 1.011 no ato de registro da sociedade, bastando declaração de desimpedimento.
Enunciado nº 224. A solidariedade entre os sócios da sociedade limitada pela exata estimação dos bens conferidos ao capital social abrange os casos de constituição e aumento do capital e cessa após cinco anos da data do respectivo registro.
Enunciado nº 273. Tanto na adoção bilateral quanto na unilateral, quando não se preserva o vínculo com qualquer dos genitores originários, deverá ser averbado o cancelamento do registro originário de nascimento do adotado, lavrando-se novo registro. Sendo unilateral a adoção, e sempre que se preserve o vínculo originário com um dos genitores, deverá ser averbada a substituição do nome do pai ou mãe naturais pelo nome do pai ou mãe adotivos.
Enunciado nº 276. O art. 13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por exigência médica, autoriza as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a consequente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil.
Enunciado nº 311. Caso não seja pago o preço fixado para a desapropriação judicial, e ultrapassado o prazo prescricional para se exigir o crédito correspondente, estará autorizada a expedição de mandado para registro da propriedade em favor dos possuidores.
Enunciado nº 315. O art. 1.241 do Código Civil permite ao possuidor que figurar como réu em ação reivindicatória ou possessória formular pedido contraposto e postular ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, a propriedade imóvel, valendo a sentença como instrumento para registro imobiliário, ressalvados eventuais interesses de confinantes e terceiros.
Enunciado nº 324. É possível a averbação do termo de afetação de incorporação imobiliária (Lei n. 4.591/64, art. 31b) a qualquer tempo, na matrícula do terreno, mesmo antes do registro do respectivo Memorial de Incorporação no Registro de Imóveis.
Enunciado nº 382. Nas sociedades, o registro observa a natureza da atividade (empresarial ou não – art. 966); as demais questões seguem as normas pertinentes ao tipo societário adotado (art. 983). São exceções as sociedades por ações e as cooperativas (art. 982, parágrafo único).
Enunciado nº 383. A falta de registro do contrato social (irregularidade originária – art. 998) ou de alteração contratual versando sobre matéria referida no art. 997 (irregularidade superveniente – art. 999, parágrafo único) conduz à aplicação das regras da sociedade em comum (art. 986).
[1] Art. 5º da Lei nº 8.935/94.
[2] Art. 6º da Lei nº 8.935/94.
[3] Art. 6º da Lei nº 8.935/94.
[4]https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ITA?seq=1813841&tipo=0&nreg=201702385731&SeqCgrmaSessao=&CodOrgaoJgdr=&dt=20190412&formato=PDF&salvar=false
[5] Art. 18. O contrato de cessão fiduciária em garantia opera a transferência ao credor da titularidade dos créditos cedidos, até a liquidação da dívida garantida, e conterá, além de outros elementos, os seguintes: (…) IV – a identificação dos direitos creditórios objeto da cessão fiduciária. Art. 19. Ao credor fiduciário compete o direito de: I – conservar e recuperar a posse dos títulos representativos dos créditos cedidos, contra qualquer detentor, inclusive o próprio cedente.
Coautor: Guilherme Vidal Vieira – Bacharel em Direito – Pós Graduando pela Escola da Magistratura do Estado do Paraná – Atualmente é estagiário de Pós-Graduação em Gabinete de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Civil – Investidor anjo na rede Curitiba Angels