TST decide que perícia pode ser feita na fase de execução

Data:

 “Ao Juiz não é dado cercear o direito de a parte produzir prova sobre fato relevante, pertinente e controvertido e, ainda assim, proferir decisão contrária aos seus interesses.”
João Oreste Dalazen – Ministro Decano do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que é direito da parte a realização de perícia na fase de execução de sentença em ação civil pública. A decisão, publicada no dia 2 de dezembro, merece atenção do jurisdicionado, do Ministério Público e da Justiça do Trabalho.

Uma empresa do ramo da indústria foi condenada, em sede de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho, na obrigação de fazer consistente em reduzir o ruído e o calor do chão da fábrica. Foi estabelecido pagamento de multa na hipótese de não cumprimento da obrigação no prazo fixado na sentença transitada.

Após o trânsito em julgado, o Ministério Público, com base em uma fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE), requereu a execução da multa, porque, segundo o fiscal do trabalho, a despeito de não haver mais calor excessivo na fábrica, o agente ruído permanecia em níveis que contrariavam as normas de saúde e segurança do trabalho.

Apresentados os embargos à execução, com extensa documentação acerca das medidas que foram tomadas para reduzir o calor e o ruído, foi formulado pedido para que fosse efetuada uma perícia judicial para aferir o nível de ruído, a existência e eficácia do uso Equipamento de Proteção Individual (EPI), o número de empregados porventura atingidos pelo agente insalubre e outros inúmeros questionamentos pertinentes à solução da controvérsia estabelecida.

Não se tratava de rediscutir a sentença transitada em julgado, que afirmou haver ruído e calor no ambiente de trabalho, mas tão somente, demonstrar, por meio de prova, que os agentes físicos foram eliminados ou reduzidos à níveis tolerados pela legislação. Em outras palavras, não se discutia o passado, mas o presente. Não se discutia a sentença, mas a aplicação de multa por uma obrigação que a empresa entendia ter cumprido.

A realização da perícia foi indeferida em primeiro e segundo graus, porque se entendeu que o laudo de fiscalização da SRTE era suficiente para comprovar o descumprimento da obrigação imposta na sentença.

A empresa, não se conformando com a decisão, recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho, arguindo violação do art. 5º, LV da Constituição Federal, porque, no seu entender, o devido processo legal lhe garantia o direito de fazer uma contraprova para infirmar a verificação da SRTE. Afinal, a fiscalização da SRTE não está sujeita ao contraditório, impedindo a parte de obter do fiscal respostas aos seus questionamentos.

A decisão da 4ª Turma do TST, provendo o recurso de revista, foi esta:

RECURSO DE REVISTA. FASE DE EXECUÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDIÇÕES INSALUBRES. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SAUDÁVEL E SEGURO. CUMPRIMENTO. PROVA PERICIAL. INDEFERIMENTO. APURAÇÃO MEDIANTE OUTROS MEIOS DE PROVA. INSUBSISTÊNCIA.

  1. A fiscalização do cumprimento das normas trabalhistas concernentes à segurança e medicina do trabalho insere-se no rol de atribuições do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho. Ao constatar a exposição de empregados a agentes químicos e/ou físicos acima dos limites de tolerância, em descompasso com as normas protetivas cujo escopo primacial é garantir ao empregado um meio ambiente de trabalho seguro e saudável, compete ao Auditor-Fiscal do Trabalho lavrar auto de infração em desfavor do empregador faltoso/negligente.
  2. Não obstante, o relatório de ação fiscal não é sucedâneo de laudo pericial para apurar o cumprimento de obrigação de fazer imposta em ação civil pública, no que concerne à redução da exposição de empregados a agentes insalubres, uma vez que o art. 195, caput, da CLT, impõe a necessidade da realização de perícia para a caracterização e classificação da insalubridade. Inteligência da Orientação Jurisprudencial nº 278 da SbDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho, primeira parte.
  3. Configura cerceamento de defesa o indeferimento de prova pericial cujo objeto seria apurar se a Executada cumpriu as obrigações impostas no título executivo, no que tange à redução da exposição de seus empregados a agentes insalubres.
  4. Ao Juiz não é dado cercear o direito de a parte produzir prova sobre fato relevante, pertinente e controvertido e, ainda assim, proferir decisão contrária aos seus interesses.
  5. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

(TST – RR – 158200-36.2005.5.17.0001; Relator Ministro João Oreste Dalazen; 4ª Turma; DJE 2/12/2016)

O caso é interessante e gerou uma celeuma que poderia acarretar em uma multa por obrigação de fazer calculada em alguns milhões de reais. Felizmente, o Tribunal Superior do Trabalho anulou o processo até a fase de indeferimento da perícia, deixando a seguinte lição: “Ao juiz não é dado cercear o direito de a parte produzir prova sobre fato relevante, pertinente e controvertido e, ainda assim, proferir decisão contrária aos seus interesses.”

Autores:

Mauricio de Figueiredo Corrêa da Veiga – sócio do Corrêa da Veiga Advogados, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes (TJ) e pós-graduado em Módulo de Direito Empresarial do Trabalho em Fundação Getúlio Vargas (RJ)

Luciano Andrade Pinheiro – advogado do escritório o Corrêa da Veiga Advogados

Mauricio de Figueiredo Corrêa da Veiga
Mauricio de Figueiredo Corrêa da Veiga
Sócio do Corrêa da Veiga Advogados; Secretário da Comissão Especial de Direito Desportivo do CFOAB; Membro da Academia Nacional de Direito Desportivo (ANDD); Presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB-DF

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Direitos do Passageiro: Saiba Seus Direitos em Viagens

Conheça seus direitos do passageiro em viagens aéreas, terrestres e marítimas. Saiba como resolver problemas com bagagens, atrasos e cancelamentos de forma prática

Reembolso de Passagens Aéreas: Prazos e Procedimentos Garantidos pela Lei

O reembolso de passagens aéreas é um direito garantido aos passageiros em diversas situações, como cancelamento de voos, desistência de viagem ou alterações na programação. No Brasil, as normas que regulam esse direito estão previstas na Resolução nº 400 da ANAC e no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Este artigo aborda as principais situações em que o passageiro pode solicitar o reembolso, os prazos estabelecidos pela legislação e os procedimentos necessários para garantir esse direito.

Danos Morais por Cancelamento de Voo em Cima da Hora: Direitos do Passageiro

O cancelamento de um voo em cima da hora é uma das situações mais frustrantes que um passageiro pode enfrentar. Além dos transtornos práticos, como perda de compromissos e gastos inesperados, o passageiro pode sofrer danos emocionais que configuram o chamado dano moral. Este artigo aborda os direitos dos passageiros em casos de cancelamento de voo de última hora, explicando quando é possível exigir indenização por danos morais, o que diz a legislação brasileira e como proceder para garantir seus direitos.

Overbooking: Direitos do Passageiro em Casos de Recusa de Embarque

O overbooking, prática em que as companhias aéreas vendem mais passagens do que o número de assentos disponíveis no avião, é uma estratégia comum no setor de aviação para evitar prejuízos decorrentes de no-show (passageiros que não comparecem ao voo).