O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Nefi Cordeiro restabeleceu liminar que fixou o prazo de 10 dias para a reavaliação das prisões provisórias impostas a idosos no Rio de Janeiro. O ministro considerou ilegal a decisão da presidência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que, em pedido de suspensão de segurança, tornou sem efeito a liminar concedida em habeas corpus por um desembargador da própria corte.
O pedido em favor dos presos foi feito pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro, em razão do grave quadro de emergência sanitária decorrente da disseminação do novo coronavírus no Brasil. A Defensoria Pública destacou que, por causa da pandemia, aliada às taxas de superlotação, às precárias condições de higiene das unidades prisionais e à provável situação de pânico capaz de desencadear rebeliões, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Recomendação 62/2020, orientou os magistrados a reavaliarem a necessidade da detenção provisória.
Na última sexta-feira (20/03/2020), ao analisar habeas corpus coletivo impetrado pela Defensoria Pública, o desembargador plantonista do TJRJ deferiu medida liminar para determinar que todos os juízes criminais de primeira instância procedessem, em 10 dias, à reavaliação das prisões impostas em caráter preventivo e temporário a pessoas com 60 anos ou mais. Na mesma decisão, estabeleceu que, caso o juiz responsável não cumprisse a ordem no prazo, o preso submetido à sua jurisdição deveria ser solto imediatamente.
No entanto, na segunda-feira (23/03/2020), a presidência do TJRJ, atendendo a pedido de suspensão de segurança apresentado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), tornou sem efeito a liminar do desembargador plantonista, até o trânsito em julgado da decisão de mérito no habeas corpus.
Risco de morte
No pedido dirigido ao Superior Tribunal de Justiça, a Defensoria Pública argumentou, em preliminar, a incompetência do presidente do TJRJ para determinar a suspensão da liminar.
Afirmou ainda que a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) exige especial celeridade e efetividade na garantia do acesso à Justiça, principalmente no caso dos idosos presos provisoriamente, sob pena de perecimento do direito à vida que se pretende tutelar com o habeas corpus. Para a Defensoria Pública, é alta a probabilidade de morte de tais pessoas no sistema prisional fluminense.
Liminarmente e no mérito, a Defensoria Pública pleiteou que fossem revogadas de imediato as prisões preventivas e temporárias decretadas contra pessoas com idade igual ou superior a 60 anos; se isso não fosse possível, que as prisões provisórias pudessem ser cumpridas em regime domiciliar; em último caso, que fosse restabelecida a liminar suspensa pela presidência do TJRJ, com a redução do prazo de avaliação das prisões para 5 dias.
Usurpação de competência
O ministro Nefi Cordeiro ressaltou que não se aplica a suspensão de segurança em matéria criminal, notadamente no habeas corpus. De acordo com ele, a liberdade assegurada por decisão judicial que reconhece como ilegal a prisão não pode ser sustada por esse instrumento – como fez o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).
O ministro destacou que o critério político-econômico da análise dos pedidos de suspensão de decisões tomadas em mandado de segurança é incompatível com a proteção ao direito de ir e vir que se pretende assegurar com o habeas corpus. Para ele, a presidência do TJRJ usurpou a competência do órgão judicial colegiado competente para o exame de eventual recurso contra a liminar.
Nefi Cordeiro explicou que o habeas corpus coletivo – que passou a ser admitido recentemente pelo Supremo Tribunal Federal – aproxima-se do mandado de segurança ao tratar de situações repetidas e que geram necessárias providências administrativas genéricas. Ele ressaltou, no entanto, que não se trata de mandado de segurança, tendo em vista que não perde o caráter de proteção das liberdades individuais, reunidas em único instrumento de defesa.
E ainda que fosse um mandado de segurança – observou o ministro –, a competência para examinar o pedido de suspensão não seria do presidente da própria corte que concedeu a liminar, mas do presidente do Superior Tribunal de Justiça, como prevê a lei.
“Dessa forma, verifica-se flagrante incompetência e ilegalidade no uso da suspensão de segurança para cassação de liminar em habeas corpus da mesma corte, a pedido do Ministério Público local, o que exige a imediata intervenção deste Superior Tribunal de Justiça para restaurar a via procedimental adequada da proteção à liberdade”, concluiu Nefi Cordeiro.
Com o restabelecimento da liminar, fica valendo o prazo de 10 dias, fixado pelo desembargador plantonista.