O torcedor do Corinthians, Messias de Oliveira (41), venceu duas batalhas judiciais contra a política de personalização de camisas de times de futebol da Nike. Morador de Caraguatatuba-SP, Messias enfrentou a distribuidora oficial da Nike no Brasil, a Fisia Comércio de Produtos Esportivos, pelo desejo de comprar camisas personalizadas da seleção brasileira e do seu time de coração, com seu nome estampado. A informação é da coluna do jornalista Ricardo Perrone, no UOL.
Segundo o colunista ao tentar fazer a compra pelo site “nike.com.br”, Messias encontrou um obstáculo – seu nome estava sendo bloqueado devido à política da empresa que proíbe palavras de cunho religioso ou político. Em sua defesa, Messias alegou questões religiosas.
Em ambas as ocasiões, Messias obteve vitória na Justiça, com sentenças que já transitaram em julgado. Ele já recebeu a camisa da seleção brasileira na versão preta, e a Fisia não fez cobranças adicionais. No caso da camisa do Corinthians, ele está aguardando trâmites burocráticos para efetuar a compra.
Protocolo da empresa
A Fisia, anteriormente conhecida como Nike do Brasil Comércio e Participações, foi adquirida pelo Grupo SBF em 2020, garantindo exclusividade na distribuição de produtos da marca esportiva no Brasil até 2030.
Em 2022, a empresa fechou um acordo com o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ) referente à personalização de produtos. Nesse acordo, a empresa informou que segue a medida da Nike, proibindo a customização de camisas com referências religiosas.
Conforme o jornalista, a saga de Messias para personalizar produtos Nike começou antes do jogo em que o Brasil foi eliminado pela Croácia na Copa do Mundo do Qatar. Ele, empolgado com o torneio, decidiu comprar uma camisa da seleção no site oficial da CBF e do Alvinegro do Parque São Jorge, operado pela Fisia.
“Fiz todo o processo para a compra. Quando coloquei o meu nome, apareceu: ‘personalização indisponível’. Tentei de novo para ver se estava digitando um caractere especial. Nada. Coloquei o nome da minha esposa, que é Larissa. Aí foi normal”, relembrou Messias.
Intrigado, o analista de sistemas pesquisou sobre o assunto na Internet e achou algo sobre gente com problema parecido. Ele chegou a pensar que a motivação fosse política, por causa do nome do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro.
“Eu falei, isso é uma mistura de religião e política. Testei nomes ligados a religiões de matrizes africanas, coloquei ‘padre’, ‘pastor’, não deu certo”, foi aí que ele percebeu o que estava acontecendo “Eu me senti segregado. Por que meu vizinho pode personalizar a camisa dele e eu não posso? Meu irmão pode, quase todos os brasileiros podem. Nome a gente não pode trocar. Eu gosto do meu nome e ele tem um peso emocional. Meu pai era Pedro Messias”.
Processos
Em 15 de dezembro do ano passado, Messias entrou com a primeira ação. O pedido foi para que a Fisia fosse condenada à obrigação de realizar a venda da camisa da seleção para ele e a estampar o nome “Messias”. Conforme o advogado do consumidor, Rogério Monteiro da Silva Teixeira de Carvalho, na petição inicial, “É manifestamente ilegal, preconceituosa, discriminatória, segregacionista a postura da requerida [Fisia]”.
A Fisia alegou possuir regras próprias de personalização. “A proibição de customização das camisas de times e seleções esportivas com palavras ligadas a temas religiosos tem o escopo de proteger símbolos religiosos e estimular o esporte como instrumento da tolerância à diversidade e não de embates ou ofensas”, diz a contestação. A peça foi assinada pelo advogado Nelson Wilians Fratoni Rodrigues.
A Fisia alegou também que a ação tinha como objetivo a obtenção de lucro. No entanto, o analista de sistemas não solicitou qualquer indenização.
Em fevereiro de 2023, o juiz Mario Henrique Gebran Schirmer, do Juizado Especial Cível e Criminal de Caraguatatuba, determinou que a Fisia vendesse a camisa com o nome de Messias sob a ameaça de uma multa de R$ 30 mil em caso de descumprimento. Posteriormente, o valor da penalidade, que não chegou a ser aplicada, foi reduzido para R$ 3 mil após recursos apresentados pela Fisia. Em 11 de maio, Messias comunicou ao tribunal que recebeu da empresa uma camisa da seleção com seu nome.
“Quando saiu a decisão, meu advogado mandou uma mensagem dizendo: ‘agora você pode ostentar seu nome na sociedade'”, contou Messias.
Em 27 de junho deste ano, o torcedor entrou com outra ação contra a Fisia para comprar uma camisa do Corinthians personalizada. Segundo seu advogado, a empresa “permanece com a lamentável conduta de segregar o autor [Messias], como se o mesmo não tivesse o direito de ostentar seu nome perante a sociedade”.
Além de bater na tecla do cunho religioso em torno do nome do consumidor, a Fisia alegou que ele não chegou a efetuar a compra. Assim, estaria discutindo um direito inexistente. “Não existe conduta antijurídica ou ilícita praticada pela ré [Fisia], principalmente porque é direito da ré estabelecer políticas para a utilização de seus serviços”, diz trecho da defesa da empresa.
No entanto, em 27 de julho, o juiz Fábio Bernardes de Oliveira Filho condenou a Fisia a vender a camisa do Corinthians com o nome de Messias. O magistrado fundamentou sua decisão ao afirmar que o autor possui ‘Messias’ como seu nome próprio, não caracterizando uma manifestação política ou religiosa.
Contudo, a empresa recorreu, alegando que a sentença era omissa, pois não mencionava a necessidade de o consumidor concluir a compra.
O juiz, lembrando que a sentença original ordenava à Fisio ‘efetuar a venda’, considerou o recurso como uma manobra protelatória e condenou a empresa a pagar uma multa de R$ 10, equivalente a 1% do valor da causa, a favor de Messias. O pagamento já foi efetuado, e agora o torcedor do Corinthians aguarda os últimos procedimentos para adquirir sua camisa
Fisia e Nike procuradas
Procurada pela coluna do jornalista Ricardo Perrone, a Fisia encaminhou uma nota: “A Fisia, distribuidora oficial da Nike no Brasil, informa que cumprirá as determinações judiciais. A empresa também destaca que está comprometida a revisar seus processos para promover a melhor experiência a seus consumidores”, diz a nota. Também procurada a Nike não encaminhou resposta.
Ministério Público
No ano passado, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro recebeu informações sobre a suposta prática discriminatória na venda oficial de camisas da seleção brasileira. Alegava-se que palavras associadas a religiões de matriz afro-brasileira eram proibidas, enquanto termos relacionados ao cristianismo eram permitidos. Na época, a Fisia explicou ao MPF-RJ que a diferença ocorreu devido a uma desatualização na lista de palavras proibidas.
Em novembro de 2022, a empresa firmou um termo de compromisso com o MPF-RJ. Entre as medidas acordadas, a empresa comprometeu-se a atualizar a lista de palavras vetadas, estabelecer um canal de comunicação para reclamações dos consumidores e, até agosto de 2023, fornecer relatórios mensais que detalhem possíveis reclamações dos consumidores e as soluções implementadas por ela.
O colunista do UOL questionou o MPF-RJ se o órgão foi informado pela Fisia do problema envolvendo Messias. A resposta foi: “sobre o nome Messias, a Fisia encaminha os relatórios a partir de reclamações realizadas pelo site pelos consumidores, não havendo comunicação de processos individuais ajuizados”.
Com informações do UOL.
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