Direito Previdenciário

INSS deve arcar com afastamento de mulher ameaçada de violência doméstica, diz STJ

Acompanhando o voto do relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) é responsável por arcar com a subsistência da mulher que se afasta do trabalho para se proteger de violência doméstica. 

No entendimento do colegiado, a ofensa à integridade física ou psicológica da vítima nessas situações se equiparam à enfermidade da segurada, justificando o direito ao auxílio-doença. A turma destacou que a Constituição prevê que a prestação de assistência social a quem dela precisar, independentemente de contribuição.

O relator iniciou seu voto diferenciando os casos de suspensão do contrato (faltas injustificadas e suspensão disciplinar, quando o empregado não recebe salários), que não permite o cômputo do período de afastamento como tempo de serviço, dos casos de interrupção (férias, licença-maternidade, 15 dias de afastamento por doença), em que o período é contado como tempo de serviço e o salário é pago normalmente.

E declarou: "A natureza jurídica de interrupção do contrato de trabalho é a mais adequada para os casos de afastamento por até seis meses em razão de violência doméstica e familiar, ante a interpretação teleológica da Lei Maria da Penha, que veio concretizar o dever assumido pelo Estado brasileiro de proteção à mulher contra toda forma de violência (artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal)".

Lacuna da lei

Ao abordar o ônus da medida protetiva, Schietti ressaltou que o afastamento previsto pela Lei Maria da Penha não está incluído nas hipóteses de benefícios previdenciários (artigo 18 da Lei 8.213/1991). Porém, ele entende que a lacuna legal, que deixa no desamparo as vítimas de violência, deve ser suprida, e justificou a adoção do auxílio-doença.

Para o ministro, "A vítima de violência doméstica não pode arcar com danos resultantes da imposição de medida protetiva em seu favor. Ante a omissão legislativa, devemos nos socorrer da aplicação analógica, que é um processo de integração do direito em face da existência de lacuna normativa".

Créditos: iweta0077 | iStock

Assim, o colegiado entendeu que os primeiros 15 dias de afastamento devem ser pagos diretamente pelo empregador, e os demais, pelo INSS.

Diante da impossibilidade de comparecer ao local de trabalho, o colegiado também afirmou que a vítima deve apresentar o documento de homologação ou a determinação judicial de afastamento em decorrência de violência doméstica, em vez do atestado de saúde. A empregada ainda tem direito ao período aquisitivo de férias, desde o afastamento.

Competência para julgamento

A mulher solicitou o afastamento em virtude de violência doméstica, alegando que sofria ameaças de morte de seu ex-companheiro e que conseguiu o deferimento de algumas medidas protetivas, mas ainda se sentia insegura. Sem casa de abrigo em sua cidade, mudou-se e deixou de comparecer ao emprego. 

O juiz de primeira instância negou o pedido por entender que o caso é de competência da Justiça do Trabalho. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) também não acolheu seu pedido, e ela interpôs recurso contra decisão, pedindo o reconhecimento da competência da Justiça comum, a manutenção do vínculo empregatício durante o afastamento e a consequente retificação das faltas anotadas em seu cartão de ponto.

A turma reconheceu a competência do juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar – e, na falta deste, o juízo criminal – para julgar o pedido de manutenção do vínculo trabalhista, por até seis meses, diante do afastamento do trabalho da vítima (artigo 9º, parágrafo 2º, inciso II, da Lei Maria da Penha - Lei 11.340/2006).

Isso porque a manutenção do vínculo empregatício é uma das medidas protetivas que o juiz pode tomar em favor da mulher vítima de violência. 

O ministro Schietti ainda ressaltou que o afastamento ocorrido na situação não decorre de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. Por isso, o julgamento cabe à Justiça comum, não à trabalhista.

E concluiu: "No que concerne à competência para apreciação do pedido de imposição da medida de afastamento do local de trabalho, não há dúvidas de que cabe ao juiz que anteriormente reconheceu a necessidade de imposição de medidas protetivas apreciar o pleito".

Com o provimento do recurso, o pedido retroativo de afastamento será apreciado pelo juízo da vara criminal que fixou as medidas protetivas. Se reconhecer o direito da mulher ao afastamento previsto na Lei Maria da Penha, “deverá determinar a retificação do ponto e expedir ofício à empresa e ao INSS para que providenciem o pagamento dos dias”.

(Com informações do Superior Tribunal de Justiça - STJ)

Leia também:          

Adquira seu certificado digital E-CPF ou E-CNPJ com a Juristas Certificação Digital. Acesse a plataforma de assinatura de documentos com certificado digital de maneira fácil e segura.

Siga o Portal Juristas no Facebook, Instagram, Google News, Pinterest, Linkedin e Twitter.

Créditos: artisteer / iStock

Postagens recentes

Modelo - Proposta de Serviços de Advocacia para Obtenção da Cidadania Portuguesa

Modelo - Proposta de Serviços de Advocacia para Obtenção da Cidadania Portuguesa [Data] [Seu Nome ou Nome do Escritório de… Veja Mais

21 horas atrás

Modelo de Proposta de Serviços de Advocacia Migratória

Nosso escritório de advocacia se especializa em direito migratório, oferecendo uma gama completa de serviços legais para auxiliar nossos clientes… Veja Mais

1 dia atrás

Modelo de Recurso para JARI por dirigir veículo sem CNH

ILUSTRÍSSIMO(A) SENHOR(A) PRESIDENTE DA JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS DE INFRAÇÕES (JARI)   [Nome do Órgão de Trânsito que aplicou a… Veja Mais

3 dias atrás

Modelo Recurso - JARI - Uso Indevido de Película Refletiva (Insulfilm)

De acordo com a Resolução nº 254 do CONTRAN, que regulamenta o uso de películas refletivas em veículos automotores, a… Veja Mais

3 dias atrás

Modelo de Recurso - JARI - Estacionamento Proibido

ILUSTRÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS DE INFRAÇÕES - JARI     [Nome do Órgão de Trânsito que… Veja Mais

3 dias atrás

Modelo de Inicial – Procedimento Comum - Modelo Genérico - NCPC

PETIÇÃO INICIAL – PROCEDIMENTO COMUM – MODELO BÁSICO – NOVO CPC EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DA …ª VARA ________ DA… Veja Mais

3 dias atrás

Newsletter

Assine e fique por dentro das novidades.
- Advertisement -

APLICATIONS

China se tornou a grande incubadora de ideias sobre Inteligência Artificial

0
Toda tecnologia passa pela era da descoberta, em que os cientistas fazem um trabalho crítico nos laboratórios de pesquisa para conseguir avanços, e pela era da implementação, em que a tecnologia atinge um ponto de utilidade prática e sai do laboratório para o mundo. Se até os anos 90 a inteligência artificial (IA) estava na fase da descoberta, hoje não mais. E essa mudança foi global: o “centro de gravidade” da IA está saindo dos Estados Unidos em direção à China.