A Justiça Federal de São Paulo suspendeu a vigência de dois artigos da Resolução 400/2016 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que entrariam em vigor amanhã (14/3). Um dos artigos suspenso dispõe sobre o transporte de bagagem despachada que configurará um contrato acessório oferecido pelo transportador, sendo cobrado por isso um valor em separado. O outro artigo afirma que será permitido até 10 quilos de bagagem de mão por passageiro, mas que poderá ser restringido pelo transportador por motivo de segurança ou capacidade da aeronave.
“A necessidade de apreciação da tutela de urgência encontra-se presente considerando-se que a resolução questionada passará a produzir efeitos concretos a partir de amanhã, quando os passageiros já estarão sujeitos ao pagamento de taxa de despacho de suas bagagens, cuja restituição, em caso de procedência do pedido, será muito demorada e eventualmente não compensará a execução individual da sentença, não obstante a grande quantidade de passagens aéreas que são vendidas diariamente, para milhares de passageiros das mais diversas localidades”, explica José Henrique Prescendo, juiz federal da 22ª Vara Federal Cível em São Paulo/SP, autor da decisão liminar.
O magistrado acrescenta que é “dever da Anac regulamentar e assegurar aos consumidores de passagens aéreas, um mínimo de direitos em face das companhias aéreas, o que não ocorre no caso dos dispositivos ora questionados […], que deixam o consumidor inteiramente ao arbítrio e ao eventual abuso econômico por parte daquelas empresas, vez que permite a elas cobrarem quanto querem pela passagem aérea e, agora, também pela bagagem despachada”.
“Mesmo o dispositivo que amplia de 5 para 10 quilos a franquia da bagagem de mão, não representa uma garantia para o consumidor, uma vez que esta franquia pode ser restringida pelo transportador, fundamentado na segurança do voo ou da capacidade da aeronave, sem que tenham sido previstos critérios objetivos que impeçam a utilização dessa restrição de forma abusiva”, completa Prescendo.
“Decisão aparentemente acertada da Justiça Federal, pois as alterações anunciadas pela ANAC ferem os direitos do consumidor previstos na Constituição Federal e no Código de Defesa do Consumidor. Não se pode pretender justificar a medida com base nas práticas internacionais, pois a realidade de outros países é totalmente diferente, a começar, para dizer o mínimo, pelos custos e serviços prestados. Não se pode supor, sem nenhum supedâneo, que haverá queda de preços. Acredito que durante o transcorrer da ação judicial, haverá que se provar os benefícios anunciados com a medida suspensa”, defende o advogado Franco Mauro Russo Brugioni, sócio do Raeffray Brugioni Advogados.
Para ele, a melhora no serviço e queda efetiva dos preços passa por um estímulo à livre concorrência, também previsto na Constituição Federal, o que num primeiro momento ocorreria mediante a liberação para que companhias aéreas internacionais adentrem ao mercado doméstico”.
O juiz destacou ainda que não existem evidências de que os preços das passagens aéreas serão reduzidos caso a nova norma entre em vigor: “Há apenas uma suposição da Anac de que isto venha a ocorrer. Todavia, na prática será muito difícil constatar isso, uma vez que o preço das passagens varia muito conforme a companhia aérea, o dia da semana, a proximidade do voo, o fato de ser realizado em feriado prolongado, o trajeto ou o horário”.
Por fim, o juiz entende que qualquer alteração dessa magnitude “deve ser amplamente discutida na sociedade através de novas audiências públicas, com a participação dos interessados (empresas aéreas, Anac, instituições de defesa do consumidor e o MPF), possibilitando, eventualmente, um termo de ajustamento de conduta que seja satisfatório para todos. (FRC)
“A decisão proferida pela Justiça Federal de São Paulo vem a proteger o consumidor de um possível abuso econômico por parte das companhias aéreas, uma vez que a Resolução 400/1016 da ANAC cria ao passageiro um ônus adicional na viagem, pois pagará uma taxa extra pela bagagem despachada, sem direito a qualquer franquia, exceto a bagagem mão. Ademais, entendeu a Justiça que a cobrança de bagagem cria um contrato de transporte acessório, sendo a prática considerada como venda casada, prática expressamente vedada pelo artigo 39, I, do Código de Defesa do Consumidor”, explica Ronald Feitosa, do Imaculada Gordiano Sociedade de Advogados.
Para Feitosa, a decisão privilegia o Código de Defesa do Consumidor, sendo dever do Estado proteger o cidadão do abuso econômico das empresas, levando em consideração que inexiste qualquer segurança de que a cobrança adicional de bagagem trará uma redução no custo das passagem aéreas para quem não transportar a mala, sendo correta a decisão enquanto não existir segurança no efetivo resultado da Resolução em favor do consumidor.
Processo n.º 0002138-55.2017.403.6100 – íntegra da decisão
Fonte: Justiça Federal de São Paulo