Seguindo entendimento do STJ, Terceira Turma do TRF3 permitiu cumulação da indenização com a reparação concedida pela comissão de anistia
A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) reformou sentença de primeiro grau e determinou à União o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 50 mil, à viúva de anistiado político em razão de prisão, perseguição e tortura sofrida na época do regime militar nas décadas de 1960, 1970 e 1980.
Os magistrados consideram que é possível a indenização de cumulação com reparação econômica concedida pela Comissão de Anistia, ao contrário da sentença da 17ª Vara Federal de São Paulo. Além disso, o acórdão está de acordo com novo posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que ainda entendeu ser imprescritível a pretensão contra violação de direitos fundamentais decorrentes do regime de exceção anterior à Constituição de 1988.
A autora havia postulado indenização por danos morais sofridos por seu falecido marido, vítima da ditadura militar a partir de 1964, tendo sido preso e torturado nas dependências de órgãos de repressão, sujeitando-o a inquérito policial e a demissão de cargo público no Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência, do Ministério da Saúde. Alegava ainda que a situação havia provocado diversos problemas e sequelas psicológicas ao cônjuge, conforme provas documentais juntadas à ação judicial.
“É inequívoco que os procedimentos então adotados tinham caráter excepcional, usando métodos e técnicas que infligiam grave violência física e psicológica, que na normalidade democrática não poderiam ser admitidos, assim gerando danos morais passíveis de indenização, na forma do artigo 37, § 6º, c/c artigo 5º, V e X, ambos da Constituição Federal. Os atos estatais narrados produziram mais do que inequívoca causalidade jurídica do dano, em termos de séria ofensa à honra, imagem, dignidade e integridade, tanto moral como psicológica, nos diversos planos possíveis, incluindo o pessoal, familiar, profissional e social”, destacou o relator do processo, desembargador federal Carlos Muta.
A condição de anistiado político post mortem foi reconhecida pela Comissão de Anistia, após requerimento formulado pela autora, na qualidade de sucessora. Segundo o relator, deve ser aplicado o atual entendimento do STJ quanto ao cabimento da ação de reparação por danos morais, que não se confunde com a reparação feita na via administrativa (Comissão de Anistia). Inclusive, inexiste comprovação de que tenha havido, efetivamente, indenização da mesma natureza.
“É evidente que o cônjuge da autora foi vítima do regime político instituído no país com o Golpe de 1964, sendo submetido à prisão e às suas consequências, por isso sua condição de anistiado político foi, inclusive, reconhecida pela Comissão de Anistia, o que justifica a condenação da requerida ao pagamento de indenização, arbitrada em R$ 50 mil, de modo a permitir justa e adequada reparação do prejuízo sem acarretar enriquecimento sem causa, avaliando-se diversos aspectos relevantes – como a condição social, viabilidade econômica e grau de culpa do ofensor, gravidade do dano ao patrimônio moral e psíquico do autor”, conclui o magistrado.
Por fim, ao julgar apelação parcialmente provida, a Terceira Turma do TRF3 acrescentou que ao valor da indenização devem ser aplicados juros de mora e correção monetária, conforme as normas previstas pelo STJ e Conselho da Justiça Federal (CJF). A União também deve arcar com honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ANISTIADO POLÍTICO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM REPARAÇÃO ECONÔMICA CONCEDIDA PELA COMISSÃO DE ANISTIA. NOVO POSICIONAMENTO DA CORTE SUPERIOR. IMPRESCRITIBILIDADE. REPARAÇÃO DEVIDA.
1. Versando a espécie sobre violação de direitos fundamentais decorrentes do regime de exceção anterior à Constituição de 1988, pertinente destacar a consolidada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto à imprescritibilidade da pretensão.
2. A autora discute no feito direito à indenização por danos morais ocorridos em razão de perseguição, prisão e tortura, sofrida por seu falecido marido, no período de vigência do regime militar, sendo que a sentença considerou a “impossibilidade de cumulação das indenizações, eis que é de natureza dúplice a reparação econômica prevista na Lei nº 10.559/2002”, para julgar improcedente a pretensão.
3. A Corte Superior, perfilhando posicionamento divergente ao até então adotado, no julgamento do Recurso Especial 1.485.260, de relatoria do Ministro SÉRGIO KUKINA, recém publicado no DJE de 19/04/2016, considerou que a “reparação econômica de que trata a Lei nº 10.559/02 não exclui, só por si, o direito de o anistiado buscar na via judicial, em ação autônoma e distinta, a reparação dos danos morais que tenha sofrido em decorrência da mesma perseguição política geradora da prefalada reparação administrativa (art. 5º, V e X, da CF), pois distintos se revelam os fundamentos que ampararam a cada uma dessas situações”.
4. A partir deste julgamento, restou inviável exigir prévio requerimento administrativo para ajuizamento da presente ação.
5. Os documentos acostados provam que o marido da autora, por sua militância política e ações contra o regime militar, sofreu persecução, investigação, e prisão, conforme o sistema legal de então, caracterizado por atos de exceção, nos termos do artigo 8º do ADCT, tendo sido, em razão de tais fatos, demitido de seu cargo público, o que enquadra a situação fática na hipótese do artigo 2º, XI, da Lei 10.559/2002, restando, portanto, prejudicada a alegação de cerceamento de defesa.
6. É inequívoco que os procedimentos então adotados tinham caráter excepcional, usando métodos e técnicas que infligiam grave violência física e psicológica, que na normalidade democrática não poderiam ser admitidos, assim gerando danos morais passíveis de indenização, na forma do artigo 37, § 6º, c/c artigo 5º, V e X, ambos da Constituição Federal. Os atos estatais narrados produziram mais do que inequívoca causalidade jurídica do dano, em termos de séria ofensa à honra, imagem, dignidade e integridade, tanto moral como psicológica, nos diversos planos possíveis, incluindo o pessoal, familiar, profissional e social.
7. Note-se que a condição de anistiado político “post mortem” foi reconhecida pela Comissão de Anistia (Requerimento de Anistia 2003.01.22038), formulado pela autora, na qualidade de sucessora, cujo voto da Conselheira Relatora destacou que “é incontestável a existência dos fatos pela Requerente”, conquanto tenha concluído não ser possível a concessão de reparação econômica em prestação única, tendo em vista a requerente já ser beneficiária de prestação mensal.
8. Não cabe, pois, negar o fato gerador da situação lesiva. Neste sentido, deve ser aplicado o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto ao cabimento da ação de reparação por danos morais, que não se confunde com a reparação feita na via administrativa, e que, por outro lado, inexistente comprovação de que tenha havido, efetivamente, indenização da mesma natureza.
9. É evidente que o cônjuge da autora foi vítima do regime político instituído no país com o Golpe de 1964, sendo submetido à prisão e às suas consequências, por isso sua condição de anistiado político foi, inclusive, reconhecida pela Comissão de Anistia, o que justifica a condenação da requerida ao pagamento de indenização, arbitrada em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), de modo a permitir justa e adequada reparação do prejuízo sem acarretar enriquecimento sem causa, avaliando-se diversos aspectos relevantes – como a condição social, viabilidade econômica e grau de culpa do ofensor, gravidade do dano ao patrimônio moral e psíquico do autor.
10. O valor da indenização deve ser objeto de correção monetária desde o arbitramento, conforme a Súmula 362/STJ; já os juros de mora são devidos desde o evento danoso (Súmula 54/STJ), considerando-se, para tal fim, a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, nos termos da jurisprudência da Turma (p. ex.: AC 2006.61.26.005917-4, Rel. Juiz Conv. CLAUDIO SANTOS, D.E. de 08/08/2011); os índices a serem aplicados, a título de correção e mora, devem ser os previstos na Resolução 267/2013 do Conselho da Justiça Federal para as ações condenatórias em geral, que aprovou o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
11. A verba honorária deve ser fixada em 10% do valor da condenação, atendendo os critérios do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, atinentes ao grau de zelo do profissional, lugar de prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço.
12. Apelação parcialmente provida.
(TRF3 – APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006000-39.2014.4.03.6100/SP (2014.61.00.006000-8/SP). RELATOR: Desembargador Federal CARLOS MUTA. APELANTE: DRAQUIMA VIRDA TOGNOLI TESTA (= ou > de 60 anos). ADVOGADO: SP207534 DIOGO TELLES AKASHI e outro(a). APELADO(A): União Federal. ADVOGADO: SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS. No. ORIG.: 00060003920144036100 17 Vr SAO PAULO/SP)
Advogado militante, bacharel em Administração de Empresas pela Universidade Federal da Paraíba, MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, professor, palestrante, empresário, Bacharel em Direito pelo Unipê, especialista e mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Atualmente é doutorando em Direito Empresarial pela mesma Universidade. Autor de livros e artigos.
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