Com o documento, réu poderá exercer atividade laborativa, um dos requisitos da liberdade condicional
“Não é razoável que se exija a permanência do estrangeiro em território nacional durante todo o cumprimento de pena privativa de liberdade, objeto de liberdade condicional, sem que possa exercer legalmente atividade laborativa que lhe garanta as condições mínimas de subsistência e de vida digna”. Com esse entendimento, a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou o direito de um estrangeiro preso no Brasil ter expedida Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), com validade até o cumprimento da pena ou da efetivação de seu ato de expulsão do país.
O estrangeiro foi preso em razão da prática do crime de tráfico internacional de drogas e recebeu o benefício de livramento condicional no cumprimento da pena. Por isso, requereu a emissão de sua CTPS para que possa, durante sua permanência no país, atender os requisitos legais necessários para desfrutar do referido benefício.
Em primeira instância, o juiz federal já havia confirmado o pedido de liminar e determinado à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São Paulo que procedesse a emissão da CTPS ao estrangeiro, independentemente de sua situação migratória, em caráter temporário, enquanto o mesmo estiver cumprindo pena em território nacional.
Após esta decisão, a União apelou, aduzindo a vinculação dos atos administrativos ao princípio da legalidade: “Permitir a emissão de documentos ao estrangeiro em situação irregular importa no desrespeito aos estrangeiros que adotam o procedimento administrativo correto”.
Ao analisar a questão, a Sexta Turma do TRF3 negou provimento a apelação e acatou pedido do estrangeiro. Na decisão, a relatora do processo, desembargadora federal Consuelo Yoshida, destacou que a Resolução Normativa nº 110, de 10/04/2014, do Conselho Nacional de Imigração, autoriza a concessão de permanência em caráter provisório, a título especial, com fins a estabelecimento de igualdade de condições para cumprimento de penas por estrangeiros no Território Nacional.
Além disso, segundo a magistrada, de acordo com o artigo 95 da Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980 (Estatuto do estrangeiro), o estrangeiro residente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros, nos termos da Constituição e das leis.
Em sua decisão, a desembargadora federal também citou o artigo 17, itens 1 e 7, da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias (Resolução n.º 45/158 da Assembleia-Geral das Nações Unidas), segundo o qual os trabalhadores migrantes e os membros das suas famílias privados da sua liberdade deverão ser tratados com humanidade e com respeito da dignidade inerente à pessoa humana e à sua identidade cultural; Segundo o item 7, os trabalhadores migrantes e os membros das suas famílias sujeitos a qualquer forma de detenção ou prisão, em virtude da legislação do Estado de emprego ou do Estado de trânsito, deverão gozar dos mesmos direitos que os cidadãos nacionais desse Estado que se encontrarem na mesma situação.
A decisão também apresenta jurisprudência da própria Sexta Turma do TRF3 no sentido de que “a ausência de regra específica não pode impedir o indivíduo de se ativar no mercado de trabalho, especialmente na situação vertente, em que o impetrante está impossibilitado de ausentar-se do país em razão de sua condenação e existe imposição legal de que tenha ocupação lícita durante o cumprimento de sua pena em regime aberto”.
Apelação/Remessa Necessária 0009457-79.2014.4.03.6100/SP
Autoria: Assessoria de Comunicação Social do TRF3
Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3)
Ementa:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ESTRANGEIRO. CUMPRIMENTO DE PENA. PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL. PERMANÊNCIA NO BRASIL. EMISSÃO CTPS. CABIMENTO.
1. Deve prosperar o pleito de expedição da Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) do impetrante, com validade até o cumprimento da pena ou efetivação de seu ato de expulsão do país.
2. A Resolução Normativa n.º 110 de 10/04/2014, do Conselho Nacional de Imigração, autoriza a concessão de permanência de caráter provisório, a título especial, com fins a estabelecimento de igualdade de condições para cumprimento de penas por estrangeiros no Território Nacional, dispondo em seu art. 1º.
2. Já acerca da emissão de Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), dispõe a Portaria n.º 4 de 26/01/2015, da Secretária de Políticas Públicas de Emprego: Art. 1º A emissão de Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) para estrangeiro s com estada legal no País será feita exclusivamente pelas Superintendências, Gerências e Agências Regionais do Trabalho e Emprego, após serem devidamente habilitadas pela Coordenação de Identificação e Registro Profissional.
3. Nota-se, assim, que o aluído dispositivo garante a expedição de CTPS tão somente aos estrangeiros com estada legal no País.
4. Não obstante, de acordo com o art. 95 da Lei n.º 6.815, de 19 de agosto de 1980 (Estatuto do estrangeiro), o estrangeiro residente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros, nos termos da Constituição e das leis e não se deve olvidar que o direito fundamental do homem ao trabalho está expressamente previsto no art. 6º do Texto Maior.
5. Igualmente, mostra-se oportuna a análise do art. 17, itens 1 e 7, da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias (Resolução n.º 45/158 da Assembleia-Geral das Nações Unidas).
6. Por todo o exposto, não é razoável que se exija a permanência do estrangeiro em território nacional durante todo o cumprimento de pena privativa de liberdade, objeto de liberdade condicional, sem que possa exercer legalmente atividade laborativa que lhe garanta as condições mínimas de subsistência e de vida digna, aumentando, inclusive, de modo considerável, a possibilidade de voltar a delinquir.
7. Nesse mesmo sentido, manifestou-se o Excelentíssimo Desembargador Federal Johonsom di Salvo, em decisão monocrática proferida no Reexame Necessário n.º 0022135-97.2012.4.03.6100/SP.
8. Apelação e remessa oficial improvidas.
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AMS – APELAÇÃO CÍVEL – 358965 – 0009457-79.2014.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 10/11/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/11/2016).