Duas companhias públicas brasileiras, o Serpro e a Dataprev, estão no radar de privatizações do governo Bolsonaro. A Serpro é uma empresa com 9.100 funcionários concursados que faturou, em 2018, R$ 3,2 bilhões. Já a Dataprev, com 3.400 servidores, no mesmo período, alcançou R$ 1,26 bilhão. Juntas, estão estimadas em R$ 6 bilhões. No entanto, não há um cálculo sobre o preço das informações que armazenam.
Dados das empresas
Na Dataprev, há armazenamento e processamento de dados por meio de seus 720 sistemas. Registros de nascimentos e óbitos no país, detalhes de empresas registradas em todos os Estados, cadastros trabalhistas de nacionais e estrangeiros, processamento de pagamentos de aposentadorias, seguro desemprego e pensões são as informações constantes em seu banco de dados.
Já no Serpro, os mais de 4.000 sistemas de informação armazenam e processam emissão de passaportes e carteiras de motoristas, declaração do imposto de renda, registros sobre veículos roubados ou furtados em todo o país, pagamento do Bolsa Família, dados da Agência Brasileira de Inteligência, do sistema de comércio exterior e de transações que passaram pelos portos e aeroportos nacionais e outros.
Interessados na aquisição
Devido aos dados armazenados por essas duas empresas, o mercado traça estratégias para atingir determinado público. O fato de um ex-servidor receber ligações oferecendo empréstimo consignado após se aposentar ou de um cidadão que recebe a oferta de um novo seguro semanas antes de vencer o contrato atual não é coincidência.
Essas estratégias são planejadas com base nas informações confidenciais mantidas pelo Governo por meio dessas companhias. Elas são valiosíssimas para empresas que buscam informações de potenciais clientes. Não à toa, fundos de investimentos e empresas de tecnologia da informação nacionais e estrangeiras estão de olho na privatização.
Ameaça à proteção de dados pessoais
Especialistas e servidores temem que a privatização ameacem à privacidade dos dados pessoais armazenados e processados por essas empresas. Considerando que os dados são, atualmente, “o novo petróleo”, o temor sobre o comércio sem a devida autorização dessas informações é compreensivo.
É possível direcionar uma venda ou definir o acesso ao crédito junto a instituições financeiras, por exemplo. De acordo com o diretor do Sindicato de Processamento de Dados do Distrito Federal e funcionário do Serpro, Kléber Santos, “são informações sensíveis que não deveriam cair nas mãos de uma empresa privada, sob o risco de ferir até a soberania nacional”.
A representante da Coordenação Nacional de Campanha da Dataprev e servidora Socorro Lago diz: “Se eu resolvo montar um dossiê contra uma pessoa, busco no seu histórico do imposto de renda o quanto arrecada, qual é o seu patrimônio. Hoje, essas informações estão só nas mãos do Estado. Após privatizar, correm o risco de serem comercializadas livremente”.
Para o advogado e especialista em proteção de dados pessoais, Bruno Bioni, a proteção de dados pessoais é a nossa própria identidade: “Na medida em que o cidadão é enxergado, julgado, não com base no rosto deles, mas com o que uma base de dados diz sobre ele, a proteção de dados pessoais passa a ser um eixo e um vetor de sua própria cidadania. […]. Olhar como os dados vão ser bem protegidos talvez seja hoje o principal alicerce na relação entre estado e cidadão”.
Ele acredita que é importante discutir se a privatização é prejudicial à proteção de dados pessoais, mas também entende ser necessário considerar os limites se houver a privatização. É fundamental saber se os dados coletados serão usados somente para o fim pelo qual foram obtidos. Vale lembrar que no segundo semestre de 2020 entrará em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados.
Estudos de privatização
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social está realizando estudos para a venda das duas empresas no ano que vem. A audiência pública na Câmara prevista para 29 de agosto, com a participação dos presidentes do Serpro e da Dataprev não ocorreu, porque ambos cancelaram a participação no encontro após a mobilização de servidores para tentar frear a venda.
Por meio do Ministério da Economia, o governo informou que as empresas devem ser vendidas para obedecer à lógica traçada pelo ministro Paulo Guedes acerca da transferência, para a iniciativa privada, do maior número de companhias públicas. A transação depende de aprovação do Congresso Nacional.
Em nota, a pasta disse: “A orientação é reduzir o tamanho do Estado, privatizando o máximo de empresas e focando naquilo que o Estado deveria cuidar como saúde, educação, segurança e infraestrutura. O Governo entende que a manutenção de dados da população sob guarda dessas empresas não garante sua proteção mais do que sob guarda de empresas privadas.
(Com informações do El País Brasil)
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