Genitores de gêmeos serão indenizados em R$ 150 mil por óbito e sequelas no pós-parto

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Hospital - São Paulo - Erro médico
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O juiz de direito Tiago Loureiro Andrade, da Vara Única da Comarca de Papanduva, em Santa Catarina (SC), julgou procedente ação de indenização por danos morais formulada por um casal em desfavor do município de Papanduva, pela morte de um de seus filhos e registro de sequelas em outro, depois da ocorrência de parto gemelar prematuro.

O juiz de direito fixou o montante em R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais). Ele destacou conduta negligente do ente público na administração de todo o trágico episódio.

Consta na exordial que a mulher, grávida de gêmeos, buscou atendimento na unidade hospitalar para a realização do parto com apenas 24 (vinte e quatro) semanas de gestação. Em razão da prematuridade dos bebês, houve a necessidade de encaminhamento para unidade especializada na vizinha cidade de Mafra, em Santa Catarina (SC).

A genitora afirma falha na transferência e transporte dos recém-nascidos até a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), o que resultou na morte de um dos bebês e em problemas de saúde do outro. Em sua contestação, o município afirma não possuir vínculo com o atendimento e que a situação fática constante dos autos não revela aparente erro do serviço público, muito menos culpa dos seus agentes.

Em análise do laudo pericial, entretanto, o juiz de direito verificou que os recém-nascidos apresentavam prematuridade extrema e baixo peso, o que implicava alta possibilidade de óbito ou de permanecerem com sequelas devido ao quadro clínico.

O perito ainda atestou que o transporte dos pacientes neonatais, nessas circunstâncias, deveria ter sido realizado em ambulância de suporte avançado ou Unidade de Tratamento Intensivo – UTI móvel, para evitar a piora do quadro. Não foi o que aconteceu.

As crianças foram transportadas em carro que não caracterizava ambulância de suporte avançado ou Unidade de Tratamento Intensivo – UTI móvel, além de apoiadas somente com oxigênio inalatório, sem qualquer monitorização. Foram intubadas tão somente ao chegarem ao destino.

“Tal circunstância (…) não impede a responsabilização, pois é certo que o transporte inadequado contribuiu para o resultado danoso, ao retirar das crianças a chance que teriam de sobreviver ou de não terem sequelas se fossem adequadamente transportadas. Portanto, o pedido de reparação por danos morais é procedente, pois a realização de procedimento médico inadequado em situação de alto risco viola direitos da personalidade, mais especificamente os direitos à dignidade, à saúde e à integridade física”, concluiu.

Cabe recurso ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC.

Autos n. 0300107-59.2015.8.24.0047 – Sentença

(Com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC)

erro médico
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SENTENÇA

ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Vara Única da Comarca de Papanduva

Rua Simeão Alves de Almeida, 411 – Bairro: Centro – CEP: 89370-000 – Fone: (47)3130-8450 – Email: [email protected]

Procedimento Comum Cível Nº 0300107-59.2015.8.24.0047/SC

 

REPRESENTANTE LEGAL DO AUTOR: MOZARA CECILIA NEVES (Representante)

REPRESENTANTE LEGAL DO AUTOR: VAGNER MARTINS BRUM (Representante)

AUTOR: MIGUEL AILTON NEVES BRUM (Representado)

RÉU: ESTADO DE SANTA CATARINA

RÉU: MUNICÍPIO DE PAPANDUVA/SC

RÉU: ASSOCIACAO HOSPITALAR E MATERNIDADE SAO SEBASTIAO (Representado)

REPRESENTANTE LEGAL DO RÉU: IZEO PITT (Representante)

SENTENÇA

RELATÓRIO

Trata-se de ação indenizatória proposta por MOZARA CECÍLIA NEVES, VAGNER MARTINS BRUM e MIGUEL AILTON NEVES BRUM em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, MUNICÍPIO DE PAPANDUVA e ASSOCIACAO HOSPITALAR E MATERNIDADE SAO SEBASTIAO.

Na inicial, alegam os autores que Mozara estava grávida de gêmeos, sendo que a bolsa rompeu na 24ª semana gestacional, ocasião em que se dirigiu ao Hospital São Sebastião, localizado no município de Papanduva-SC, para a realização do parto. Afirmam que o parto foi realizado por enfermeiras sem a presença de médico e que, em razão de os bebês serem prematuros, houve a necessidade de serem encaminhados ao Hospital Maternidade Dona Catarina Kuss na Cidade de Mafra – SC. Alegam a ocorrência de falha na prestação de serviço do nosocômio, negligência no atendimento e imperícia ao realizar o parto, além de negligência na transferência e transporte das crianças até a UTI, resultando na morte de Vagner Getúlio Neves Brum e nos problemas de saúde apresentados pelo requerente Miguel Ailton Neves Brum. Ao final, pugnam pela indenização por danos materiais/lucros cessantes, morais e à imagem por erro médico.

Recebida a inicial, foi indeferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela pretendida (e. 4).

Foi apresentada contestação pelo Município de Papanduva (e. 16). Preliminarmente, pediu o chamamento ao processo do Hospital São Sebastião, alegando que o atendimento da maternidade não possuí vínculo com o município, sendo que a situação fática constante dos autos não revela aparente erro do serviço público e muito menos culpa dos seus agentes. Ainda, negou a ocorrência de prejuízo material que ensejasse o pagamento de pensão aos requerentes Mozara e Vagner.

O Estado de Santa Catarina contestou no evento 17. Alegou, preliminarmente, sua a ilegitimidade passiva. Ainda, afirmou que não foi o responsável pelo parto da autora ou pelo transporte dos recém-nascidos à UTI neonatal, pugnando pela improcedência dos pedidos.

Houve réplica no evento 42.

Foi acolhido o chamamento ao processo e determinada a citação da Associação Hospitalar e Maternidade São Sebastião para ingressar no polo passivo da demanda (e.45)

A Associação Hospitalar e Maternidade São Sebastião apresentou contestação (e. 50), aduzindo que a autora deu entrada no hospital em data de 09/01/2013, às 10:40min, em caráter de urgência, sendo-lhe informado que o Hospital não possuía UTI neonatal, mas em face da urgência, foi colocada em cadeira de rodas e encaminhada pela Técnica em Enfermagem Angela Maria Morvam com mais duas pessoas para a sala de parto. Afirmou que imediatamente foi acionado o Dr. Humberto Jair Damaso Ribas, que se encontrava em outra sala realizando outro parto, bem como que o hospital não possui ambulância e todo o suporte de ambulâncias é realizado pelo Município de Papanduva. Relatou que foi feita a transferência dos gêmeos com uma ambulância do Município de Papanduva,  junto do acompanhamento da Técnica de Enfermagem Angela. Por fim, pugnou a ré que não poderia ser responsabilizada, pois buscou dar suporte e urgência no atendimento da autora, requerendo a sua exclusão do polo passivo da demanda, ou então o prosseguimento do feito com a improcedência total dos pedidos.

A decisão do evento 56 afastou a preliminar de ilegitimidade passiva, saneou o processo e deferiu a produção da prova oral.

A decisão do evento 66 deferiu, ainda, a produção da prova pericial.

O laudo pericial foi juntado aos autos no evento 111, com manifestação das partes nos eventos 121, 122 e 123.

Foi produzida a prova oral (eventos 163, 170, 276 e 303).

As partes apresentaram alegações finais (eventos 305, 308 e 309), com exceção do Município de Papanduva, que deixou transcorrer o prazo.

Abriu-se vista ao Ministério Público (ev. 315), que se manifestou pela procedência parcial do pedido.

Este o relato.

FUNDAMENTAÇÃO

Do nexo de causalidade

Em se tratando de alegação de erro médico, a prova pericial afigura-se essencial para o julgamento da causa, pois evidentemente a resolução da controvérsia demanda conhecimento técnico especializado.

Analisando o laudo pericial do evento 11, verifica-se que o perito atestou que os recém-nascidos apresentavam prematuridade extrema e baixo peso, o que implicava “alta possibilidade de óbito ou de permanecerem com diversas sequelas devido o quadro clínico“, como infelizmente acabou por acontecer.

Tal circunstância, por si só, impede que se atribua integralmente aos réus a responsabilidade pela morte de Wagner e pelas sequelas sofridas por Miguel.

Porém, além disso, o perito também atestou que “o transporte dos pacientes neonatais deveria ter sido realizado em ambulância de suporte avançado ou UTI móvel, para evitar a piora do quadro clínico“.

O perito chegou a tal conclusão a partir do que dispõe a Resolução CFM nº 1.672/03:

 Art. 1º – Que o sistema de transporte inter-hospitalar de pacientes deverá ser efetuado conforme o abaixo estabelecido:

I-O hospital previamente estabelecido como referência não pode negar atendimento aos casos que se enquadrem em sua capacidade de resolução.

II- Pacientes com risco de vida não podem ser removidos sem a prévia realização de diagnóstico médico, com obrigatória avaliação e atendimento básico respiratório e hemodinâmico, além da realização de outras medidas urgentes e específicas para cada caso.

III- Pacientes graves ou de risco devem ser removidos acompanhados de equipe composta por tripulação mínima de um médico, um profissional de enfermagem e motorista, em ambulância de suporte avançado. Nas situações em que seja tecnicamente impossível o cumprimento desta norma, deve ser avaliado o risco potencial do transporte em relação à permanência do paciente no local de origem.

IV- Antes de decidir a remoção do paciente, faz-se necessário realizar contato com o médico receptor ou diretor técnico no hospital de destino, e ter a concordância do(s) mesmo(s).

V- Todas as ocorrências inerentes à transferência devem ser registradas no prontuário de origem.

VI- Todo paciente removido deve ser acompanhado por relatório completo, legível e assinado (com número do CRM), que passará a integrar o prontuário no destino. Quando do recebimento, o relatório deve ser também assinado pelo médico receptor.

VII- Para o transporte, faz-se necessária a obtenção de consentimento após esclarecimento, por escrito, assinado pelo paciente ou seu responsável legal. Isto pode ser dispensado quando houver risco de morte e impossibilidade de localização do(s) responsável(is). Nesta circunstância, o médico solicitante pode autorizar o transporte, documentando devidamente tal fato no prontuário.

VIII- A responsabilidade inicial da remoção é do médico transferente, assistente ou substituto, até que o paciente seja efetivamente recebido pelo médico receptor. a) a responsabilidade para o transporte, quando realizado por Ambulância tipo D, E ou F é do médico da ambulância, até sua chegada ao local de destino e efetiva recepção por outro médico. b) as providências administrativas e operacionais para o transporte não são de responsabilidade médica.

Quanto aos quesitos respondidos no laudo pericial, extrai-se o seguinte:

(…) 19.O autor Miguel possui alguma má formação? Quais? Sim. Atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. 20.Quais as circunstâncias podem desencadear tal má formação? No caso do periciado a prematuridade extrema e a falta de oxigenação adequada durante o transporte. (…)

Apesar do que dispõe a norma, apontou o perito que as crianças foram transportadas em veículo que não caracterizava ambulância de suporte avançado ou UTI móvel, além de terem sido transportados apenas com oxigênio inalatório e sem monitorização, tendo sido intubados apenas quando chegaram no hospital em Mafra.

Além disso, como bem apontado no parecer do Ministério Público, a prova oral produzida confirmou que as crianças foram transportadas sem a supervisão de um médico, em que pese a redação do artigo 1º, III, acima.

Portanto, houve uma concorrência de causas para o dano: tanto o parto prematuro (que se tratou de uma fatalidade) quanto o transporte inadequado.

A respeito da intensidade com que o transporte inadequado contribui para o dano, deve-se observar o laudo pericial apontou que a possibilidade de tal resultado ocorrer apenas por força das condições em que estavam as crianças era alta.

Ou seja: o mais provável é que o resultado fosse o mesmo, ainda que o transporte houvesse sido realizado corretamente.

Tal circunstância, todavia, não impede a responsabilização, pois é certo que o transporte inadequado contribuiu para o resultado danoso, ao retirar das crianças a chance (ainda que limitada) que teriam de sobreviver ou de não terem sequelas caso houvessem sido adequadamente transportadas.

A jurisprudência admite a análise da questão à luz da teoria da perda da chance, nos casos em que o procedimento médico inadequado retira do paciente a chance de cura que teria caso o tratamento houvesse sido adequado.

Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. HOSPITAL. ATUAÇÃO NEGLIGENTE. ÓBITO. INDENIZAÇÃO PELA CHANCE PERDIDA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RAZOABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A teoria da perda de uma chance comporta duplo viés, ora justificando o dever de indenizar em decorrência da frustração da expectativa de se obter uma vantagem ou um ganho futuro, desde que séria e real a possibilidade de êxito (perda da chance clássica), ora amparando a pretensão ressarcitória pela conduta omissiva que, se praticada a contento, poderia evitar o prejuízo suportado pela vítima (perda da chance atípica).
3. Hipótese em que a morte da paciente não resultou do posterior agravamento da enfermidade diagnosticada a destempo, mas de um traumatismo crânio-encefálico resultante da queda de uma escada em sua própria residência um dia depois da última consulta médica realizada, não se podendo afirmar com absoluta certeza que o acidente doméstico ocorreu em razão das tonturas que ela vinha sentindo e que a motivou a procurar auxílio médico.
4. À luz da teoria da perda de uma chance, o liame causal a ser demonstrado é aquele existente entre a conduta ilícita e a chance perdida, sendo desnecessário que esse nexo se estabeleça diretamente com o dano final.
5. Existência de laudo pericial conclusivo quanto à efetiva concorrência da enfermidade extemporaneamente diagnosticada para o resultado morte, tendo em vista que a baixa contagem de plaquetas foi determinante para que não fosse possível estancar a hemorragia intracraniana da paciente.
6. Atuação negligente dos profissionais médicos que retirou da paciente uma chance concreta e real de ter um diagnóstico correto e de alçar as consequências normais que dele se poderia esperar.
7. Na responsabilidade civil pela perda de uma chance, o valor da indenização não equivale ao prejuízo final, devendo ser obtido mediante valoração da chance perdida, como bem jurídico autônomo.
8. Ainda que estabelecidos os danos morais em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) com base no sofrimento e na angústia do autor pela morte de sua esposa, não se mostra desarrazoada a quantia fixada a esse título, mesmo considerando que a indenização deve reparar apenas a chance perdida.
9. Recurso especial não provido.
(REsp n. 1.677.083/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 14/11/2017, DJe de 20/11/2017.)

Em outras palavras: o que deve ser indenizado não é a morte de uma das crianças e as sequelas que recaíram sobre a outra criança, mas sim a perda da chance de o resultado ter sido diferente.

Do dano material e dos lucros cessantes

A partir do exposto acima, verifica-se que os pedidos de reparação por danos materiais e lucros cessantes são improcedentes, pois não restou suficientemente demonstrada a ocorrência de conduta atribuível aos réus que tenha causado os resultados – e, por consequência, que tenha gerado prejuízos consistentes na impossibilidade de Miguel prover o próprio sustento e de Vagner auxiliar no sustento dos pais.

Do dano moral

Por outro lado, o pedido de reparação por danos morais é procedente, pois a realização de procedimento médico inadequado em situação de alto risco viola direitos da personalidade, mais especificamente os direitos à dignidade, à saúde e à integridade física.

A respeito da quantificação do dano, inicio pela morte do filho Vagner.

Em recente julgado dizendo respeito à morte de filho recém nascido, o STJ fixou o valor da reparação em R$ 100.000,00 para o pai e mais R$ 100.000,00 para a mãe da criança:

PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MORTE DE RECÉM-NASCIDO OCORRIDA EM HOSPITAL PÚBLICO. SUPERAQUECIMENTO DO BERÇO E NEGLIGÊNCIA DO SERVIÇO DE ENFERMAGEM. MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO. CARÁTER IRRISÓRIO. POSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Em regra, não se admite, no âmbito do recurso especial, a revisão dos valores fixados a título de indenização por danos morais, tendo em vista a incidência da Súmula 7/STJ. No entanto, a jurisprudência do STJ flexibiliza a aplicação do referido óbice sumular, autorizando a revisão do acórdão proferido na origem, nas situações em que a quantia fixada a título de indenização mostrar-se irrisória ou manifestamente desproporcional.
2. No caso, a conduta ilícita, a extensão e a responsabilidade pelos danos foram pormenorizadamente descritas no acórdão recorrido, estando evidenciada a irrisoriedade da indenização estipulada pelo Tribunal de origem, no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), considerando-se a condição repugnante da morte de criança recém-nascida, que sofreu crises convulsivas decorrentes do superaquecimento do berço do hospital público e da inaceitável falha do serviço de enfermagem no acompanhamento da temperatura do bebê e do respectivo leito.
3. A partir das premissas fáticas estipuladas na instância ordinária, observou-se uma evidente desconexão entre o que foi decidido pelo Tribunal de origem e os precedentes do STJ exarados em casos análogos, os quais têm majorado o valor da indenização para R$ 100.000,00 (cem mil reais) para cada parte, a fim de assegurar aos pais da criança o direito à razoável indenização. Precedentes:
AgRg no AgRg no AREsp 725.306/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 10/6/2019, DJe 13/6/2019; AgInt no AgInt no REsp 1.712.285/TO, de minha relatoria, Segunda Turma, julgado em 13/12/2018, DJe 18/12/2018.
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt nos EDcl no AgInt no AREsp n. 1.708.564/MS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 25/5/2021, DJe de 14/6/2021.)

Tal valor, em princípio, se afigura adequado para reparar o dano, considerando a gravidade da situação, ao mesmo tempo sem ensejar o enriquecimento sem causa dos requerentes.

Porém, deve-se observar que, como já apontado acima, não se está indenizando neste processo a morte do filho, mas sim a perda da chance de sobrevivência que haveria caso o transporte houvesse sido realizado adequadamente.

Embora seja impossível fixar qual seria a chance de um resultado diferente caso o transporte houvesse sido prestado adequadamente, verifico que o perito afirmou que a chance de o resultado ser o mesmo era alta – do que decorre a conclusão de que, mesmo que o transporte fosse prestado adequadamente, o mais provável era que o resultado fosse o mesmo.

Portanto, reputa-se adequado fixar a reparação em apenas 1/3 do que seria fixado caso houvesse sido demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado, resultando em R$ 33.333,33 para o pai e mais R$ 33.333,33 para a mãe.

Já em relação ao autor Miguel, são incontroversas nos autos as graves e irreversíveis sequelas que lhe resultaram do ocorrido, bem descritas pelo laudo pericial:

Periciando Miguel mantém-se no colo da mãe durante toda a anamnese.

Possui bom estado geral, mucosas normocoradas, acianótico e anictérico.

Possui nistagmo bilateral constante.

Responsivo a dor.

Não responsivo adequadamente aos comandos verbais.

Não deambula.

Não articula palavras.

Possui atrofia muscular em membros superiores e inferiores.

Possui atrofia da musculatura paravertebral.

Possui importante atraso no desenvolvimento neuropsicomotor.

Em recente julgado dizendo respeito a recém nascido que ficou com sequelas graves e irreversíveis, o STJ reputou adequada a fixação da reparação em R$ 250.000,00, a serem repartidos entre os autores da ação:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ERRO MÉDICO. PARTO QUE CAUSOU SEQUELAS GRAVES E PERMANENTES AO RECÉM-NASCIDO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA CIÊNCIA DO EVENTO DANOSO. COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A CONDUTA DO HOSPITAL E OS DANOS CAUSADOS À SAÚDE DO RECÉM-NASCIDO. REVISÃO DAS CONCLUSÕES DO ACÓRDÃO ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. REDUÇÃO DO VALOR DA REPARAÇÃO POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. DESCABIMENTO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A jurisprudência do STJ entende que o início do prazo prescricional, com base na teoria da actio nata, não se dá necessariamente quando da ocorrência da lesão, mas sim no momento em que o titular do direito subjetivo violado detém plena ciência da ofensa e de sua extensão.
2. No caso estudo, o Tribunal de origem concluiu que a efetiva ciência do dano ocorreu apenas com o diagnóstico médico da patologia suportada pelo autor, consignando que a respectiva ação de indenização foi ajuizada antes do transcurso do prazo prescricional aplicável à hipótese. Diante desse cenário, modificar a conclusão da Corte de origem (acerca da data da ciência pelo autor dos danos alegados na exordial e o respectivo termo inicial da contagem do prazo prescricional) demandaria nova análise do conteúdo fático-probatório dos autos, procedimento vedado nesta instância, consoante o que dispõe a Súmula n. 7/STJ.
3. O exame da pretensão recursal, concernente à existência do nexo de causalidade entre as sequelas que comprometeram a saúde do recém-nascido e o procedimento realizado no hospital, exige, inevitavelmente, o reexame do conjunto fático-probatório dos autos.
Nesse ponto, de igual modo, incide a Súmula n. 7/STJ.
4. A revisão do quantum indenizatório estipulado pelo Tribunal de origem só é admitida quando irrisório ou exorbitante, o que não ocorre no caso em questão, em que o valor arbitrado respeitou os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Outrossim, a análise da questão esbarraria, também, na Súmula 7/STJ.
5. Não se conhece do recurso pela alínea c, tendo em vista que, aplicada a Súmula 7/STJ quanto à alínea a, fica prejudicada a divergência jurisprudencial, pois as conclusões divergentes decorreriam das circunstâncias específicas de cada processo, e não do entendimento diverso sobre uma mesma questão legal.
6. Conforme entendimento desta Corte, a interposição de recursos cabíveis não implica “litigância de má-fé nem ato atentatório à dignidade da justiça, ainda que com argumentos reiteradamente refutados pelo Tribunal de origem ou sem alegação de fundamento novo” (AgRg nos EDcl no REsp n.1.333.425/SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, DJe 4/12/2012).
7. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 1.621.242/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 28/9/2020, DJe de 7/10/2020.)

NOTAS

Indenização por dano moral: R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta milreais ) para ambos os genitores

Tal valor, em princípio, se afigura adequado para reparar o dano, considerando a gravidade da situação, ao mesmo tempo sem ensejar o enriquecimento sem causa dos requerentes.

Não há impedimento a que a reparação pelo ocorrido com Miguel seja mais alta que a reparação pelo ocorrido com Vagner, pois, embora não tenha ocorrido a morte, no caso as sequelas sofridas impactarão a vida dos três autores significativamente por décadas, diferentemente da perda do filho, que se trata de dano que se exaure no momento de sua ocorrência.

Adotando os mesmos parâmetros fixados acima – mais especificamente, o fato de o laudo pericial ter demonstrado que o resultado mais provável seria o mesmo, ainda que o transporte houvesse sido correto -, reputa-se adequado fixar a reparação em apenas 1/3 do que seria fixado caso houvesse sido demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado, resultando em R$ 83.333,33.

A respeito da destinação da reparação, a petição inicial não deixa claro a quais dos requerentes o valor se destinaria.

De todo modo, considerando que o ocorrido impacta tanto o autor Miguel quanto seus pais, é adequado a repartição do valor entre os três, pois os autores Mozara e Vagner (pai), além do sofrimento diário que terão pelo resto de suas vidas vendo o filho em tal situação, também terão suas vidas impactadas pelos transtornos decorrentes da necessidade de cuidar de filho em tal situação.

Assim, o valor fica em R$ 27.777,77 para cada requerente.

Da responsabilidade do Estado de Santa Catarina

Quanto ao Estado de Santa Catarina, a prova produzida não demonstrou o nexo de causalidade entre eventual ação sua e o resultado causado.

Como se vê ela petição inicial e pelas alegações finais da parte autora, a pretensão condenatória em face do Estado se baseia na afirmação de que “o mesmo, transferiu mediante declaração de utilidade pública, pela Lei nº 9.931/95, a entidade filantrópica a execução do serviço público de saúde que é de sua responsabilidade“.

Todavia, lendo a referida lei, verifica-se que ela apenas declarou de utilidade pública a Associação Hospitalar e Maternidade São Sebastião, sem nada mencionar a respeito da transferência da titularidade ou da execução de serviços públicos.

Observo que, em regra, o ente público responsável por erros médicos praticados em hospital particular credenciado ao SUS é o município (apenas exemplificativamente: AgInt no AREsp n. 1.540.873/SP, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do Trf5), Primeira Turma, julgado em 16/8/2021, DJe de 19/8/2021).

Assim, a procedência do pedido formulado em face do Estado de Santa Catarina demandaria que ao longo da instrução houvesse sido demonstrada alguma conduta praticada especificamente por agentes públicos estaduais, o que não ocorreu, tanto que as alegações finais da parte autora não indicam a conduta do Estado de Santa Catarina que teria causado o dano.

Portanto, o pedido deduzido em face do Estado de Santa Catarina é improcedente.

Da responsabilidade da ré Associação Hospitalar e Maternidade São Sebastião

Quanto à Associação Hospitalar, igualmente não verifico nexo de causalidade entre alguma ação atribuível a agentes seus e o dano.

Isso porque, a partir do que consta dos autos, não é possível verificar conduta praticado durante o atendimento prestado no hospital que tenha contribuído para o resultado.

Como se vê inclusive das alegações finais da parte autora, a única conduta apontada que concorreu para o dano consistiu na já mencionada irregularidade do transporte providenciado, o qual não era de responsabilidade da associação.

Embora a petição inicial tenha narrado equívocos no atendimento ofertado no hospital, a prova pericial não atestou a existência de nexo de causalidade entre o atendimento prestado e o resultado danoso.

Como já apontado pela associação desde sua contestação no evento 50 – e em nenhum momento negado nos autos -, o serviço de transporte não era de responsabilidade da associação, mas sim do réu Município de Papanduva.

Portanto, o pedido formulado em face da Associação Hospitalar e Maternidade São Sebastião é improcedente.

Da responsabilidade do Município de Papanduva

Por sua vez, como já adiantado, a conclusão é distinta em relação ao Município de Papanduva.

Isso porque, como mencionado, foi o Município de Papanduva o responsável pelo transporte, e foi justamente em relação ao modo como foi realizado o transporte que foi constatada a ocorrência de procedimento irregular que contribuiu para o resultado danoso.

Observo que foi oportunizado ao Município de Papanduva se manifestar sobre a prova produzida – oportunidade em que poderia ter demonstrado que as coisas se deram de modo diferente -, mas, ao ser intimado acerca da prova pericial, o município disse que se manifestaria a respeito em alegações finais (e. 122), e, ao ser intimado para alegações finais, o município deixou o prazo transcorrer em branco.

Logo, o pedido formulado em face do Município de Papanduva deve ser acolhido.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo procedente em parte o pedido formulado em face do Município de Papanduva, a fim de condenar a parte ré ao pagamento de:

a) R$ 61.111,11 (sessenta e um mil cento e onze reais e onze centavos) em favor da autora MOZARA CECILIA NEVES;

b) R$ 61.111,11 (sessenta e um mil cento e onze reais e onze centavos) em favor do autor VAGNER MARTINS BRUM; e

c) R$ 27.777,77 (vinte e sete mil setecentos e setenta e sete reais e setenta e sete centavos) em favor do autor MIGUEL AILTON NEVES BRUM.

Os valores deverão ser atualizados pelo IPCA-E (Tema STF 810) a partir da data de hoje e acrescidos de juros da poupança a partir do evento danoso (09/01/2013), nos termos do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97.

Por outro lado, julgo improcedentes os pedidos formulados em face dos réus ESTADO DE SANTA CATARINA e ASSOCIACAO HOSPITALAR E MATERNIDADE SAO SEBASTIAO.

Para fins de distribuição dos ônus da sucumbência, considero que houve sucumbência recíproca entre os autores e o MUNICÍPIO DE PAPANDUVA e sucumbência integral dos autores frente ao ESTADO DE SANTA CATARINA e à  ASSOCIACAO HOSPITALAR E MATERNIDADE SAO SEBASTIAO.

Assim, condeno a parte autora ao pagamento de 83,33% das custas e despesas processuais. 

Observe-se a isenção da fazenda pública quanto ao restante das custas.

Quanto aos honorários advocatícios, a longa tramitação do processo recomenda a fixação em percentual superior ao mínimo de 10%, razão pela qual fixo os honorários em 15% do valor da condenação.

Observada a já indicada distribuição da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor dos procuradores do ESTADO DE SANTA CATARINA e da ASSOCIACAO HOSPITALAR E MATERNIDADE SAO SEBASTIAO, os quais fixo em 5% do valor da condenação para cada um.

Do mesmo modo, condeno a parte autora e o MUNICÍPIO DE PAPANDUVA ao pagamento de honorários advocatícios aos procuradores um do outro, os quais fixo em 2,5% do valor da condenação.

Fica ressavalda a suspensão da exigibilidade das verbas sucumbenciais a cujo pagamento foram condenados os requerentes, dada a gratuidade da justiça.

Publique-se, registre-se e intimem-se.

Sentença sujeita a reexame necessário.


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