A 3ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, por maioria, deu provimento ao recurso dos réus para absolvê-los da condenação imposta em 1ª Instância, pela suposta prática do crime de extorsão, cometido contra a ex-esposa de uns dos réus, devido à simulação de um sequestro para que a mesma lhes entregasse quantia em dinheiro.
A denúncia oferecida pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios imputou aos réus a prática do crime de extorsão, previsto no artigo 158, § 1º, do Código Penal. Segundo o relato da vítima, esposa de um dos acusados, seu ex-marido, após lhe obrigar a entregar as chaves de seu carro e ter arrebentado a porta do quarto para sair, teria telefonado dizendo que estava preso em uma blitz policial e precisava de dinheiro para ser liberado com o veículo, momento em que o segundo réu assumiu o telefone e disse que na verdade seu marido estaria preso em uma casa por dívida de drogas. A vítima chamou a polícia e seguiram para o local combinado para a entrega do dinheiro, onde constataram que não se tratava de um sequestro.
Os acusados apresentaram defesas nas quais requereram suas absolvições.
O juiz do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Ceilândia condenou o ex-marido, pela prática do crime descrito no artigo 158, § 1º, do Código Penal, qualificado pela violência doméstica contra mulher e fixou a pena definitiva em 6 anos de reclusão e multa. O segundo acusado foi condenado pelo mesmo crime, e teve a pena fixada em 6 anos e 8 meses de reclusão e multa.
Os réus apresentaram recurso e os desembargadores entenderam que não houve intenção específica de obter vantagem ilícita: “O que se tem nos autos não é um caso criminal, mas uma tragédia familiar provocada pelo homem provedor, viciado em drogas e bebidas. Ele recebia o soldo de sargento da Aeronáutica, mas a harmonia conjugal era perturbada pelo vício, enervando a mulher e produzindo atritos. A suposta vítima admitiu que o réu sustentasse a casa, mas uma crise perene rondava o casal e eles novamente discutiram. O marido saiu de casa dirigindo o carro, dizendo que iria se embriagar. Juntou-se com um amigo nessa noite de desventuras em série, mas o carro quebrou e o motorista do guincho não quis prestar-lhe socorro porque a mulher registrara ocorrência de furto. Precisando de dinheiro, seja para pagar o conserto do carro, pagar o fornecedor de droga ou pagar bebidas, engendraram um plano para obtê-lo com a mulher, que organizava as finanças do casal e detinha o cartão bancário do marido, de comum acordo, para que ele não gastasse tudo com o vício e faltasse dinheiro para as despesas domésticas. Mesmo que o amigo possa ter dito ao telefone que precisassem de dinheiro para assegurar a libertação do marido, supostamente sequestrado pelo traficante que lhe fornecia droga, evidentemente tudo não passou de artimanha dos amigos para conseguirem acesso ao cartão ou ao dinheiro para consumirem com drogas e bebidas, não havendo o dolo específico, de obter vantagem indevida mediante violência ou grave ameaça, impõe-se reconhecer a atipicidade da conduta. Não se pode extorquir a si mesmo”.
BEA
Processo: APR 2016 03 1 004883-3
Fonte: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT
Ementa:
PENAL. RÉUS CONDENADOS PELO CRIME DE EXTORSÃO. AUSÊNCIA DAS CIRCUNSTÂNCIAS ELEMENTARES DO TIPO. SIMULAÇÃO DE SEQUESTRO PARA SENSIBILIZAR A MULHER DO SUPOSTO SEQUESTRADO E FAZÊ-LA ENTREGAR DINHEIRO OU O CARTÃO BANCÁRIO DO MARIDO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA REFORMADA.1 Réus condenados por infringirem o artigo 158, § 1º, do Código Penal, porque teriam constrangido a mulher de um deles, mediante a simulação de um sequestro, para o fim de obter vantagem econômica.2 O que se tem nos autos não é um caso criminal, mas uma tragédia familiar provocada pelo homem provedor, viciado em drogas e bebidas. Ele recebia o soldo de sargento da Aeronáutica, mas a harmonia conjugal era perturbada pelo vício, enervando a mulher e produzindo atritos. A suposta vítima admitiu que o réu sustentasse a casa, mas uma crise perene rondava o casal e eles novamente discutiram. O marido saiu de casa dirigindo o carro, dizendo que iria se embriagar. Juntou-se com um amigo nessa noite de desventuras em série, mas o carro quebrou e o motorista do guincho não quis prestar-lhe socorro porque a mulher registrara ocorrência de furto. Precisando de dinheiro, seja para pagar o conserto do carro, pagar ao fornecedor de droga ou pagar bebidas, engendraram um pleno para obtê-lo com a mulher, que organizava as finanças do casal e detinha o cartão bancário do marido, de comum acordo, para que ele não gastasse tudo com o vício e faltasse dinheiro para as despesas domésticas. Mesmo que o amigo possa ter dito ao telefone que precisassem de dinheiro para assegurar a libertação do marido, supostamente sequestrado pelo traficante que lhe fornecia droga, evidentemente tudo não passou de artimanha dos amigos para conseguirem acesso ao cartão ou ao dinheiro para consumirem com drogas e bebidas.3 Não havendo o dolo específico, de obter vantagem indevida mediante violência ou grave ameaça, impõe-se reconhecer a atipicidade da conduta. Não se pode extorquir a si mesmo.4 Apelações providas para absolver os réus. (TJDFT. Acórdão n.1000106, 20160310048833APR, Relator: GEORGE LOPES, Revisor: SANDRA DE SANTIS, 1ª TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 23/02/2017, Publicado no DJE: 10/03/2017. Pág.: 68/82)