A taxa de evolução de obra é devida pelo mutuário somente até o término da construção da unidade habitacional, e não até a concessão do habite-se. Com base nesse entendimento, a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) confirmou a sentença que impediu a Caixa Econômica Federal (CEF) de cobrar a referida taxa de L.F.S., autor da ação.
Ele adquiriu um imóvel no Empreendimento Park Renovare, em Campo Grande (RJ), com financiamento da CEF, dentro do “Programa Minha Casa Minha Vida”, do Governo Federal, e recorreu à Justiça depois de receber boletos com um valor superior ao das prestações previstas em contrato.
O autor descobriu que a taxa cobrada pelo banco seria “devida pelo mutuário até que a construção fosse concluída, não sendo abatida em seu saldo devedor”. Ora, como o empreendimento já estava construído no momento da compra, L.F.S. resolveu questionar a cobrança. Mas, acabou com uma dívida, e seu nome inscrito nos cadastros de restrição ao crédito.
No TRF2, o relator do processo, desembargador federal Guilherme Calmon Nogueira da Gama, considerou correta a conclusão do juízo de 1º grau de que a cobrança era indevida, uma vez que, de acordo com os documentos e depoimentos analisados, a compra foi efetuada em 2014 e “no empreendimento já havia moradores desde 2010”.
O desembargador acrescentou que o Ministério Público Federal (MPF), inclusive, vem atuando no combate à tal prática, por meio de recomendações e ajuizamento de ações civis públicas. Para o MPF, “está ocorrendo violação de direito previsto no artigo 6º, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a medida configuraria prática abusiva vedada pelo artigo 39, V, do Código de Defesa do Consumidor”.
Calmon analisou ainda o pedido de indenização por danos morais e concluiu que “os documentos carreados aos autos dão conta de que ao autor foi exigida cobrança indevida, violando as normas do contrato de financiamento para aquisição de imóvel e ainda teve seu nome inserido nos cadastros de proteção ao crédito, necessitando de providência judicial para alvejar o que lhe era devido se fossem respeitados os termos contratuais, fatos estes que se mostram suficientes para comprovar a existência de dano moral, sendo devida e justa a obrigação de indenizar que se mantém”.
O acórdão somente reformou a sentença com relação à condenação, imposta à CEF, para restituir em dobro o que foi indevidamente pago pelo mutuário. Nesse ponto, o desembargador considerou orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que a devolução em dobro dos valores pagos a maior pelo mutuário é devida apenas quando demonstrada má-fé.
“Embora haja a comprovação do pagamento a maior, o mutuário não faz jus à restituição desses valores em dobro, na esteira do entendimento manifestado pela jurisprudência do STJ, que pressupõe a má-fé do credor, que in casu, não foi demonstrada”, finalizou o relator, reformando o julgado nesse aspecto.
Processo: 0128407-30.2015.4.02.5101 – Acórdão
Fonte: Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2)
Ementa:
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. TAXA DE OBRAS. COBRANÇA INDEVIDA. PRÁTICA ILEGAL E ABUSIVA. ART. 42 DO CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. A questão a ser enfrentada refere-se à possibilidade de cobrança de “taxa de obra” após o prazo previsto para a sua conclusão, em contrato de compra e venda de unidade habitacional firmado dentro do Programa “Minha Casa Minha Vida” (MCMV), com a conseqüente inscrição nos órgãos de proteção ao crédito, em razão do não pagamento da taxa, bem como a apuração de responsabilidade da CEF pelo pagamento por danos morais. 2. A taxa de evolução de obra somente é devida pelo mutuário até a conclusão da construção da unidade habitacional de acordo com termos contratuais e não até a concessão do habite-se. 3.Uma vez acabada a construção, quando da celebração do contrato de financiamento, com a CEF, é indevida a cobrança da taxa de obra. 4. Embora haja a comprovação do pagamento a maior, o mutuário não faz jus à restituição desses valores em dobro, na esteira do entendimento manifestado pela jurisprudência do STJ, que pressupõe a má-fe do credor, que in casu, não foi demonstrada. 5. A reparação civil do dano moral, diversamente do que se verifica em relação ao dano patrimonial, não objetiva a recompor a situação jurídico-patrimonial do lesado, mas compensar alguma das violações às dimensões da dignidade humana, como a liberdade, a integridade físico-psíquica, solidariedade e a isonomia. 6. Diante da responsabilidade civil contratual assumida pela ré, a mutuária faz jus à indenização a título de danos morais, cuja definição por meio da noção de sentimento humano (dor, vexame, humilhação, ou constrangimento) é inadequada, sob pena de se confundir o dano com a sua (eventual) consequência. 7. Apelação conhecida e parcialmente provida. (TRF2 – Classe: Apelação – Recursos – Processo Cível e do Trabalho. Órgão julgador: 6ª TURMA ESPECIALIZADA. Data de decisão 24/10/2016. Data de disponibilização 27/10/2016. Relator GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA)