Acusado tentou justificar sua inocência alegando também ser negro
Um aposentado da cidade de Coronel Fabriciano (MG) deverá ser indenizado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, decorrentes das injúrias raciais proferidas em local público pelo cunhado dele. A sentença é do juiz de direito Bruno Junqueira Pereira, da 2ª Vara Cível da comarca de Coronel Fabriciano, localizada a 200km de Belo Horizonte.
Segundo a demanda judicial, em maio de 2017, enquanto estava na fila do guichê da rodoviária local para comprar uma passagem, o aposentado foi surpreendido pelo cunhado, que se aproximou e o atacou verbalmente com xingamentos como “crioulo, macaco, safado”. O ofensor acusou-o de manter um relacionamento amoroso com sua esposa e o ameaçou de morte.
A vítima alegou que os fatos se deram na presença de diversas pessoas e que, devido à situação constrangedora, tentou sair do local, porém foi impedida pelo acusado. A Polícia Militar foi acionada. O aposentado acrescentou que, em consequência do episódio, sofreu danos psicológicos graves e irreversíveis, e foi necessário o uso contínuo de medicamentos antidepressivos.
O acusado, em sua defesa, afirmou que os fatos narrados foram apurados em ação criminal já arquivada, ocasião em que pagou uma multa como transação penal no valor de um salário mínimo.
Ele confessou que houve de fato a discussão com seu cunhado, porém sem agressão verbal ou física, e afirmou que não houve prática de injúria racial, já que ele mesmo se autodeclara negro, assim como toda a sua família.
Danos à honra e imagem
Ao analisar a ação judicial, o juiz de direito considerou incontroverso que ocorreu um desentendimento, porém não houve agressões físicas, conforme admitido pelo próprio aposentado em audiência.
Ele lembrou que a honra e imagem das pessoas são direitos fundamentais assegurados pela Constituição da República, assim como o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
O fato foi alvo de apuração na esfera criminal, culminando com a homologação da transação penal ofertada pelo Ministério Público.
A celebração da transação penal, ressaltou o juiz de direito, não implica reconhecimento de culpa, do qual decorreria automático dever de indenizar. Contudo, “não afastada a existência material do fato pelo Juízo criminal e a questão remanesce aberta para discussão no âmbito cível, em virtude da independência das instâncias”.
Por isso, independentemente da classificação penal da conduta do réu, o magistrado considerou evidente que as palavras proferidas tiveram o condão de violar os direitos da personalidade do aposentado, desqualificando sua honra e sua imagem.
O juiz de direito Bruno Junqueira afirmou também que, em audiência de instrução, o aposentado reiterou que recebeu xingamentos referentes à sua cor, o que foi confirmado por uma testemunha.
Não foi acatada a alegação do acusado no sentido de que, por se autodeclarar negro, não seria possível ser ele acusado pelas injúrias raciais. O magistrado avaliou não ser crível que apenas pessoas brancas possam cometer ataques étnico-raciais a pessoas negras.
“Inexiste monopólio ou vinculação necessária de tais práticas a determinado grupo social. Ao contrário, o racismo (lato sensu) pode ser, e infelizmente é, praticado por qualquer pessoa”, frisou o magistrado.
O magistrado considerou comprovada a conduta deliberada e ilícita do acusado, que causou o dano moral e o dever de indenizar.
Processo: 5000883-92.2018.8.13.0194
(Com informações do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG)